domingo, 7 de fevereiro de 2010

Bhagavan Ramana Maharshi - A Natureza de Deus

Pergunta: Deus é descrito como manifesto e não-manifesto. No primeiro caso Ele é dito incluir o mundo como parte de Seu Ser. Se for assim, nós como parte deste mundo, deveríamos facilmente tê-Lo conhecido na forma manifesta.

Bhagavan: Conheça a si mesmo antes de procurar decidir sobre a natureza de Deus e do mundo.

Pergunta: Conhecer a mim mesmo implica em conhecer a Deus?

Bhagavan: Sim, Deus está dentro de você.

Pergunta: Então, o que se coloca no meu caminho de conhecer a mim mesmo ou conhecer Deus?

Bhagavan: Sua mente errante e seus modos pervertidos.

Pergunta: Deus é pessoal?

Bhagavan: Sim, ele é sempre a primeira pessoa, o Eu, permanecendo sempre diante de você. Por você dar precedência às coisas mundanas, Deus parece ter recedido para o pano de fundo. Se você abandonar tudo e buscar apenas Ele, e somente Ele, Ele irá permanecer como o 'Eu', o Ser.

Pergunta: Deus está separado do Ser?

Bhagavan: O Ser é Deus, o “eu sou” é Deus. Essas perguntas surgem porque você está se segurando ao ser-ego. Elas não surgirão se você se segurar no verdadeiro Ser. Pois o Ser real não irá perguntar e nem pode perguntar o que é absurdo. Somente Deus, que parece ser não-existente, verdadeiramente existe, enquanto que o indivíduo, que parece estar existindo, é sempre não-existente. Os sábios dizem que apenas o estado no qual a pessoa conhece sua própria não-existência (sunya) é o glorioso conhecimento supremo.

Agora você pensa que você é um indivíduo, que existe o universo e que Deus está além do cosmos. Portanto, há a idéia do sentido de separação. Essa idéia deve ir. Pois Deus não está separado de você ou do cosmos. O Gita também diz:

"O Ser sou Eu, ó Deus do sono,

Alojado no coração de cada criatura.

Sou o alvorecer e o meio-dia de toda forma,

Também sou seu destino final."

(Bhagavad Gita, X – 20)

Portanto, Deus não apenas está no coração de todos, ele é o suporte de todos, a fonte de todos, a morada e o fim de todos. Tudo procedeu Dele, tem sua estada Nele, e finalmente se resolve Nele. Portanto, Ele não está separado.

Pergunta: Como devemos entender esta passagem do Gita: 'Todo este Cosmos forma uma partícula de mim”?

Bhagavan: Isso não significa que uma pequena partícula de Deus se separa Dele e forma o universo. Seu poder (Shakti) está agindo. Como resultado de uma fase dessa atividade o cosmos tornou-se manifesto. Similarmente, a afirmação no Purusha Sukta, 'Todos os seres formam um pé Dele', não significa que Brahman está dividido em várias partes.

Pergunta: Entendo, Brahman certamente não é divisível.

Bhagavan: Portanto, o fato é que Brahman é tudo e permanece indivisível. Está sempre realizado mas o homem não está ciente disso. Ele deve chegar a saber disso. Conhecimento significa vencer os obstáculos que obstruem a revelação da eterna verdade que - o Ser é o mesmo que Brahman. Os obstáculos tomados juntos formam a sua idéia de separatividade como um indivíduo.

Pergunta: Deus é o mesmo que o Ser?

Bhagavan: O Ser é conhecido por todo mundo, mas não claramente. Você sempre existe. A existência é o Ser. O “eu sou” é o nome de Deus. De todas as definições de Deus , nenhuma, de fato, é tão bem colocada quanto a afirmação Bíblica “Eu sou aquele Eu sou” no Êxodo 3. Existem outras afirmações, como no Brahmaivaham (Brahman sou Eu), Aham Brahmasmi (Eu sou Brahman) e Soham (Eu sou Ele). Mas nenhuma é tão direta como o nome de Jeová que significa “eu sou”. O Ser absoluto é o que é. Ele é o Ser. É Deus. Ao conhecer o Ser, Deus é conhecido. De fato, Deus não é nada além do que o Ser.

Pergunta: Deus é conhecido por muitos nomes diferentes. Algum deles é justificado?

Bhagavan: Dentre os milhares de nomes de Deus, nenhum nome se adequa a Deus - o qual reside no Coração, desprovido de pensamento - tão verdadeira e lindamente quanto o nome “Eu” ou “eu sou”. De todos os nomes conhecidos de Deus, o nome de Deus “eu” - “eu” apenas ressoará triunfante quando o ego for destruído, emergindo como a suprema palavra silenciosa (mouna-para-vak) no espaço do Coração daqueles cuja atenção está direcionada para a tutela do Ser. Mesmo se a pessoa meditar incessantemente no nome “eu-eu” com sua atenção no sentimento “eu”, isso levará a pessoa e a submergirá na fonte da qual o pensamento surge, destruindo o ego, o embrião, que está unido ao corpo.

Pergunta: Qual é a relação entre Deus e o mundo? Ele é o criador ou o sustentador dele?

Bhagavan: Os seres sencientes ou não-sencientes de todos os tipos estão realizando ações apenas pela mera presença do sol, que nasce no céu sem nenhuma volição. Similarmente, todas as ações são feitas pelo Senhor sem nenhuma volição ou desejo da parte Dele. Na mera presença do sol, as magníficas lentes emitem fogo, a flor de lótus desabrocha, a flor-de-lis se fecha e todas as incontáveis criaturas realizam ações e descansam.

A ordem da grande multidão de mundos é mantida pela mera presença de Deus da mesma maneira que a agulha se move diante de um imã, e a selenite emite água, a flor-de-lis desabrocha e o lótus se fecha diante da lua.

Na mera presença de Deus, que não tem a mínima volição, os seres vivos, que estão engajados em inúmeras atividades, após embarcarem em muitos caminhos para os quais são atraídos de acordo com o curso determinado por seus próprios karmas, finalmente realizam a futilidade da ação, voltam-se para o Ser e atingem a liberação.

As ações dos seres vivos não chegam ou afetam a Deus, o qual transcende a mente, da mesma maneira que as atividades do mundo não afetam o sol e as qualidades dos quatro elementos conspícuos (terra, água, fogo e ar) não afetam o espaço sem limites.

Pergunta: Por que samsara (a criação e a manifestação como finitas) é tão cheio de mal e tristeza?

Bhagavan: É a vontade de Deus!

Pergunta: Por que Deus quer que seja assim?

Bhagavan: Isso é incompreensível. Nenhum motivo pode ser atribuído àquele poder - nenhum desejo, nenhum fim a ser atingido pode ser afirmado a respeito daquele um infinito, todo-poderoso, todo-sábio Ser. Deus é intocado pelas atividades que ocorrem em Sua presença. Compare o sol e as atividades do mundo. Não há nenhum sentido em atribuir responsabilidade e motivo ao um antes que ele se torne muitos.

Pergunta: Tudo acontece através da vontade de Deus?

Bhagavan: Não é possível ninguém fazer alguma coisa oposta ao que Deus determine, Ele que tem a habilidade de fazer todas as coisas. Portanto, ficar em silêncio aos pés de Deus, tendo abandonado todas as ansiedades da mente perversa, imperfeita e enganadora, é o melhor.

Pergunta: Existe um ser separado, Iswara (Deus pessoal), que é o recompensador das virtudes e o punidor dos pecados? Existe um Deus? Como ele é?

Bhagavan: Sim, existe. Iswara tem individualidade num corpo e mente que são perecíveis, mas ao mesmo tempo, internamente ele tem a consciência transcendental e a liberação.

Iswara, o Deus pessoal, o criador supremo do universo, realmente existe. Mas isso é verdade apenas do ponto de vista relativo daqueles que não realizaram a Verdade, aquelas pessoas que acreditam na realidade das almas individuais. De um ponto de vista absoluto, o sábio não pode aceitar nenhuma outra existência além do Ser impessoal, uno e sem forma.

Iswara tem um corpo físico, uma forma e um nome, mas não tão grosseiro quanto esse corpo material. Ele pode ser visto em visões na forma criada pelo devoto. As formas e os nomes de Deus são muitos e variados, e diferem em cada religião. Sua essência é a mesma que a nossa, o Ser real sendo apenas um e sem forma. Portanto, as formas que ele assume são apenas criações e aparências.

Iswara é imanente em cada pessoa e cada objeto do universo. A totalidade de todas as coisas e todos os seres constitui Deus. Há uma força da qual uma pequena fração tornou-se todo este universo e o restante está em reserva. Esse poder reservado e esse poder manifesto na forma do mundo constituem juntos Iswara.

Pergunta: Iswara existe em algum lugar ou em alguma forma particular?

Bhagavan: Se o indivíduo é uma forma, mesmo o Ser, a Fonte, que é o Senhor, também parecerá ter uma forma. Se a pessoa não é uma forma, uma vez que não pode haver conhecimento das outras coisas, será correta essa afirmação de que Deus tem uma forma? Deus assume qualquer forma imaginada pelo devoto através de pensamento repetido em meditação prolongada. Assim, embora Ele assuma nomes infindáveis, apenas a real consciência sem forma é Deus.

No que diz respeito à sua localização, Deus não reside em nenhum outro lugar além do Coração. É devido à ilusão criada pelo ego, a idéia 'eu sou o corpo', que o reino de Deus é concebido como estando em outra parte. Esteja certo que o Coração é o reino de Deus.

Saiba que você é a resplandescente luz perfeita, que não apenas torna a existência do reino de Deus possível, mas que também permite que Ele seja visto como um maravilhoso céu. Apenas o saber disso já é Jnana. Portanto, o reino de Deus está dentro de você. O espaço ilimitado do turiyatita (além dos quatro estados – o Ser), que brilha repentinamente, em todo seu resplendor, dentro do Coração de um aspirante altamente maduro durante o estado de completa absorção da mente, como se fosse uma experiência nova e anteriormente desconhecida, é o raramente atingido reino de Deus (Siva-Loka), que brilha através da luz do Ser.

Philokalia - Philotheu do Sinai - Textos sobre a sobriedade (parte 2)

Uma alma (amante dos pecados), estando cercada e rodeada por espíritos do mal como um muro, está atada pelos grilhões da escuridão e por causa dessa escuridão envolvente não pode orar como deveria, pois está limitada pela escuridão em segredo (nas suas próprias profundezas secretas e inconscientemente) e seus olhos internos estão cegos. Mas quando (voltando para si mesma) ela começa a correr para Deus em oração e enquanto ora, luta para praticar a sobriedade da melhor maneira que pode, então, através do poder da prece ela começa pouco a pouco, a ser libertada dessa escuridão; de outra maneira ela não tem qualquer possibilidade de se tornar livre. Desse modo, ela aprende que existe no coração uma outra batalha interior, uma luta nos pensamentos, instigada pelos espíritos do mal, como atestam as escrituras, dizendo: “Se o espírito do governante levantar-se contra ti, não abandones teu posto” (Ecl. X, 4). O posto da mente é ela manter-se firme na virtude e na sobriedade. Um homem pode tomar um posto na vida virtuosa ou na vida pecaminosa. Pois as escrituras dizem: “Abençoado é o homem que não segue o conselho dos ímpios, nem se põe no caminho dos pecadores” (Sal. I,1). E o Apóstolo ensina: “Portanto, ponde-vos de pé e cingi os rins com a verdade” (Efés.vi,14).


A doce memória de Deus, isto é, de Jesus, acoplada à indignação e à contrição benigna sentidas no coração, pode sempre aniquilar toda a fascinação dos pensamentos, a variedade de sugestões, palavras, sonhos, imaginações sombrias e, resumindo, tudo com que o todo-destrutivo inimigo se arma para atacar, buscando ardentemente devorar nossas almas. Jesus, quando invocado, facilmente queima tudo isso. Pois, em nenhuma outra parte podemos encontrar a salvação exceto em Jesus Cristo. O próprio Salvador confirmou isso dizendo: “Sem mim, nada podeis fazer” (João xv,5)


E, portanto, a cada hora e a cada momento guardemos zelosamente nosso coração de pensamentos que obscureçam o espelho da alma que deveria conter, desenhada e impressa em si, apenas a imagem radiante de Jesus Cristo, o Qual é a sabedoria e o poder de Deus, o Pai. Busquemos constantemente o reino dos céus no coração e certamente encontraremos misteriosamente dentro de nós a semente, a pérola, a bebida e tudo mais, se limparmos o olho de nossa mente. É por isso que nosso Senhor Jesus Cristo disse: “O reino de Deus está dentro do vós” (Lucas xvii, 21), querendo dizer com isso a Divindade que habita no coração.


A sobriedade purifica a consciência até que ela brilhe resplandescente. Estando assim purificada, a consciência afasta toda a escuridão de dentro, como uma luz que repentinamente resplandece quando um véu que a cobria é removido. Se for verdadeira e constante a sobriedade é mantida depois que a escuridão for afastada, a consciência mostra novamente o que foi esquecido ou o que esteve escondido sem ser percebido. Ao mesmo tempo, novamente por meio da sobriedade, ela ensina a luta invisível com os inimigos, empreendida pela mente e a batalha dos pensamentos. Ela ensina como lançar tochas nesse combate solitário, como atirar dardos de bons pensamentos (contra o inimigo) e como prevenir as flechas do inimigo de ferirem a mente, fazendo-a rápida como uma flecha buscar proteção em Cristo, e assim ganhar o refúgio da luz de nossos desejos, em vez da escuridão da destruição. Aquele que provou essa luz entende o que estou falando. Uma vez que foi experimentada, essa luz tortura a alma ao máximo pelo anseio por ela, pois a alma alimenta-se dela mas nunca fica saciada e quanto mais ela prova essa luz, mais ardentemente a deseja. Essa luz que ofusca a mente, da maneira como o sol ofusca os olhos, essa luz inexplicável em si mesma, mas que entretanto torna-se explicável, só que não em palavras, mas através da experiência daquele que recebe sua influência ou que é ferido por ela – essa luz manda que eu fique em silêncio, embora a mente ainda gostaria de falar desse assunto.

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“Procurai a paz com todos e a santificação, sem as quais ninguém verá o Senhor” (Heb. Xii,14) com o intento de adquirir amor e pureza: pois esses são a paz e a santificação. A raiva deveria ser despertada somente contra os demônios com os quais empreendemos gerra mental e que estão enfurecidos contra nós. Mas ouça como essa guerra, empreendida a cada hora em nós, deveria ser conduzida e faça o seguinte: com a sobriedade combine oração e a sobriedade irá fortalecer a oração e esta fortalecerá a sobriedade. Observando tudo internamente de forma constante, a sobriedade nota o inimigo tentando ganhar passagem e barrando o caminho com toda sua força, ao mesmo tempo evoca a ajuda do Nosso Senhor Jesus Cristo para afastar esses combatentes do mal. Assim, a atenção barra o caminho por meio de oposição e Jesus, quando invocado, afasta os demônios e suas fantasias.


Guarde sua mente com extrema intensidade de atenção. Assim que você notar um pensamento (hostil), imediatamente resista a ele e ao mesmo tempo se apresse em chamar Cristo Nosso Senhor para se vingar. Enquanto você ainda está chamando por Ele, o doce Jesus dirá: Estou com você para protegê-lo. Mas quando os inimigos são subjugados pela sua oração, você deve novamente, diligentemente prestar atenção à sua mente. Aqui vêm ondas (de pensamentos), mais numerosas do que nunca, novamente avançando contra você, uma após a outra, de modo que a alma é quase engolida por elas e fica a ponto de perecer. Mas Jesus, sendo Deus, quando o discípulo apela, novamente proíbe os maus ventos (de pensamentos) e eles são subjugados. Mas você, tendo encontrado uma hora ou um momento de folga dos ataques do inimigo, glorifique Aquele que lhe salvou e mergulhe fundo numa meditação sobre a morte.


Um homem que com sucesso redime o tempo de sua vida e está constantemente ocupado com pensamentos e memória da morte e através disso, sabiamente remove sua mente das paixões, geralmente vê as constantes aparências das sugestões do mal com mais precisão do que um homem que passa sua vida sem lembrar da morte e que espera purificar seu coração apenas pela ação da razão, em vez de manter-se sempre com esse pensamento triste e que provoca lágrimas. Contando com a rapidez da sua mente de manter em mãos todas as paixões ruins e não percebendo o quanto ele está atado por uma delas, acontece o pior de tudo: ele cai na presunção (como alguém que espera ter êxito em qualquer coisa) sem Deus. Tal homem deve praticar uma sobriedade muito estrita, para que não perca sua razão por causa de sua arrogância. Pois o Apóstolo Paulo diz (I Cor.Vii,I) que as pessoas que coletam conhecimento aqui e ali se vangloriam diante daqueles que, em sua opinião, sabem menos do que eles. E penso que o motivo disso é que falta neles a fagulha do amor que edifica. Um homem que mantém uma constante lembrança da morte tem olhos mais aguçados do que um homem que carece dela. Ele nota as sugestões dos demônios e facilmente mantendo-os sob seus pés manda-os embora.