quarta-feira, 18 de maio de 2011

Philokalia - São Simeão o Novo Teólogo - Preceitos Práticos e Teológicos (parte 2)

Aquele que não assumiu a imagem de nosso Senhor Jesus Cristo (homem Divino e Deus) em seu homem interior ou espiritual, com percepção e consciência, não é nada além de sangue e carne e não pode apreender a glória de maneira direta, apenas através das palavras, da mesma forma que os cegos de nascença não podem conceber como é a luz do sol meramente ao ouvirem falar a seu respeito.

Portanto, aquele que vê, ouve e apreende conhece a força do que está sendo dito, uma vez que ele já assumiu a imagem do céu e tornou-se um “Homem Perfeito, a medida da estatura da plenitude de Cristo” (Efé. iv. 13). Sendo assim, ele também está apto a guiar o rebanho de Cristo no caminho dos mandamentos de Deus. Mas se um homem não conhece isso e nem é assim, isso mostra que os sentidos de sua alma não estão iluminados e nem são saudáveis; e é muito melhor para ele ser guiado do que guiar os outros, para a segurança deles e dele próprio.
Um homem que vê com seus olhos físicos sabe quando é dia e quando é noite, mas um homem cego não sabe distingui-los. Da mesma forma é com o homem cujos olhos espirituais são abertos e que tem com eles a visão interna; se, depois de já ter visto a luz verdadeira e infinda ele retornar novamente à sua cegueira anterior e ficar privado da luz devido à negligência e à falta de zelo, ele sentirá profundamente, quando estiver no estado correto, a perda dessa luz e não será ignorante do motivo que o fez sofrer essa privação. Mas um homem cego (espiritualmente) de nascença não pode saber nada a esse respeito nem por experiência nem por sua ação. É apenas através de rumores que ele pode aprender sobre aquilo que nunca viu, podendo começar a falar para os outros sobre isso, embora ele e os que os escutam não tenham nenhum conhecimento real sobre as coisas das quais estão falando.
A graça do Espírito Santo é dada às almas que são as noivas de Cristo, como um sinal do noivado. Do mesmo modo que sem o noivado uma donzela não pode assegurar-se de que irá um dia unir-se ao seu marido por meio do matrimônio, também a alma nunca terá uma garantia definida de que tornar-se-á para sempre unida com seu Senhor e Deus, ou que de maneira misteriosa e inefável casar-se-á com Ele e desfrutará de Sua beleza inacessível, sem que antes lhe seja garantido o noivado, ou um sinal de Sua graça e sem conscientemente possuí-Lo dentro de si mesma.
Assim como um noivado não pode ser firmado até que o contrato de casamento seja assinado por testemunhas confiáveis, também a luz da graça não é assegurada antes da prática dos mandamentos e da aquisição das virtudes. Pois essa prática dos mandamentos e das virtudes é para o noivado espiritual como a testemunha que assina o contrato de casamento. Através dessas práticas todo homem que está para ser salvo adquire segurança total no noivado, isto é, a graça do Espírito Santo.
Primeiramente é como se as condições do contrato de casamento fossem escritas através da prática dos mandamentos e então ele é selado e assinado pelas virtudes; e, então, Cristo, o noivo, dá à noiva (a alma), um anel, ou seja, o noivado no Espírito.

Assim como antes do casamento a noiva recebe do noivo apenas um sinal do noivado, esperando obter a residência acordada e os outros presentes apenas após o casamento, também a noiva de Cristo recebe primeiramente Dele apenas o noivado do Espírito e espera por receber as bênçãos eternas e o reino dos céus após abandonar este mundo; e a alma é assegurada disso pelo sinal do noivado, o qual revela isso a ela como num espelho, confirmando com certeza a aquisição futura de tudo pactuado entre ela e o seu Senhor e Deus.
O noivado do Espírito Santo é inexplicável mesmo para aqueles a quem ele foi concedido, pois ele é compreendido incompreensivelmente, é visto invisivelmente; ele anima, fala e move aqueles que o conquistaram, ele voa de sua morada secreta e inexplicavelmente ainda é encontrado lá novamente. Isso prova que quando ele vem não é permanentemente ou para sempre e que quando parte não é para não retornar mais. Portanto, se um homem que alcançou-o não o tem (palpavelmente presente) é como se ele o tivesse e quando o tem é como se não tivesse.

Como um homem que está num quarto escuro com todas as portas e janelas fechadas, quando abre uma janela e a luz que jorra para dentro envolve-o num brilho tão intenso que, impossibilitado de suportá-lo ele fecha os olhos, cobre sua cabeça e se esconde; também se uma alma, totalmente aprisionada no mundo sensorial, permite que sua mente dê uma espiada no mundo supra-sensorial, como que para fora da janela, ela é banhada pelo esplendor do noivado com o Espirito Santo que está dentro dela e não é capaz de suportar o brilho da luz Divina desnuda, ele imediatamente estremece em sua mente, esconde-se em si mesma e foge como que para dentro de casa buscando cobrir-se com o que é sensório e humano.
A meta de todos aqueles que vivem em Deus é agradar nosso Senhor Jesus Cristo e tornarem-se reconciliados com Deus, o Pai através do recebimento do Espírito Santo, desse modo assegurando sua salvação, pois nisso consiste a salvação de todas as almas. Se essa meta e essa atividade estiverem faltando, todos os outros trabalhos serão inúteis e todos os outros esforços serão vãos. Cada caminho da vida que não conduz a isso não é vantajoso.

Na mesma medida que a alma é superior ao corpo, um homem sábio é superior e melhor do que o resto do mundo. Não olhe para a grandeza das criações existentes no mundo, pensando que elas são maiores do que você, ó homem, mas vendo a graça conferida a você e percebendo a posição de sua inteligência e a glória de sua alma, cante louvores a Deus, o Qual honrou-o acima de toda criação visível.

O homem que é cego em relação a uma coisa ( a Deus) é totalmente cego em relação a todas as coisas; e o homem que vê no um (em Deus), tem a visão de todas as coisas. Ele é removido da visão das coisas e ao mesmo tempo tem a visão de todas as coisas e está de fora de todas as coisas visíveis. Desse modo, estando no Um ele vê tudo e estando em tudo ele vê do todo. Vendo no Um através Dele ele vê a si mesmo, os outros e todas as coisas e estando escondido em si mesmo ele não vê nada do todo.

Se um homem olhar constantemente para o sol físico ele sofrerá involuntariamente uma mudança em sua visão, pois não poderá ver nada mais do visível e não verá nada além do sol em todas as coisas. É o mesmo com um homem que está sempre olhando para o sol da Verdade com sua mente e coração: involuntariamente ele sofrerá uma mudança em sua visão mental, pois não conseguirá imaginar nada mundano e verá apenas Deus em todas as coisas.
O sol físico é visto mas ele mesmo não vê, o sol do intelecto é visto pelos que são dignos e ele mesmo vê a todos, especialmente aqueles que olham em sua direção. O sol físico não fala e não dota ninguém com o dom e o poder da fala, mas o sol do intelecto fala com seus amigos e também dota todos eles com o poder e o dom da fala. O sol físico, iluminando o jardim físico, meramente seca a umidade do solo através do calor de seus raios, ele não fertiliza o solo nem alimenta as sementes e as plantas. O sol do intelecto, quando brilha na alma, faz ambas as coisas: ele seca a unidade das paixões, ao mesmo tempo purificando a alma da imundice e do cheiro fétido que elas produziramm, fertiliza o solo interno da alma (tornando-o rico) com a graça Divina alimentando as plantas das virtudes, de modo que elas possam gradualmente crescer e prosperar.

Ao nascer, o sol físico acende o mundo físico e tudo nele – as pessoas, os animais e todo o resto – despejando sua luz igualmente sobre todos, ele reina ao meio dia e depois esconde-se novamente, deixando na escuridão os lugares sobre os quais ele brilhou. Mas o sol do intelecto, uma vez que começa a brilhar, brilha sempre, de maneira imaterial e totalmente contido em todas a coisas e ao mesmo tempo permanecendo à parte de suas criaturas, inseparavelmente separado delas, uma vez que ele é um todo integral em todas as coisas e ao mesmo tempo não está de maneira exclusiva em nenhuma das criaturas (pois ao mesmo tempo está em outro lugar também). O todo dele está no visível e o todo dele está no invisível; ele está totalmente presente em toda parte e ainda assim exclusivamente presente em parte alguma.

Cristo é o início, o meio e o fim. Ele está naqueles que são os primeiros, nos que estão no meio e nos últimos e da mesma forma que Ele está no primeiro Ele está em todos. Para Ele não há diferença entre eles, do mesmo modo que para Ele “não há nem judeu nem grego, não há nem escravo nem livre, não há nem masculino e nem feminino: pois sois todos um só em Cristo Jesus.” (Gal. Iii. 28)

O amor sagrado, permeando a todos desde o primeiro até o último, da cabeça aos pés, une todas as coisas a si mesmo, conecta-as, ata e unifica-as, deixando-as fortes e inabaláveis. Em experiência, ele revela-se a cada homem como um e o mesmo. É Deus com o Qual os últimos serão os primeiros e os primeiros serão como os últimos.