sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Ramesh S. Balsekar - A Consciência é tudo o que existe


Ramesh: No que diz respeito ao “Eu Sou”, não faz diferença se há a manifestação ou não. A manifestação veio do Eu Sou. O funcionamento da manifestação está no Eu Sou. É como o reflexo num espelho. Então o que você aceita, é que o que quer que aconteça é meramente um reflexo no Eu Sou. Toda a manifestação é um reflexo na Fonte – de outro modo, haveriam dois.

Peter: Portanto, não pode ser um reflexo da fonte, é um reflexo na Fonte?

Ramesh: Apenas pode ser na Fonte. Tudo isto é um reflexo na Fonte porque a Fonte é tudo que existe. Portanto, para qualquer coisa que aconteça, você escolhe um conceito. Você não pode ficar sem conceitos, senão você teria de ficar em silêncio. E se a questão “Quem sou eu?” surge, de todos esse é o primeiro pensamento que precisa de uma resposta. A resposta é um conceito, um conceito sendo algo que aponta para a Verdade. O valor ou a utilidade de um conceito está apenas no quanto ele aponta para a Verdade. Você vê? E esse conceito – que a totalidade da manifestação e o funcionamento desta manifestação é um reflexo na Fonte – é um apontador para a Verdade, a qual é a Fonte.


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“Assim como a superfície de um espelho existe dentro e fora da imagem refletida no espelho, também o Ser supremo existe tanto dentro quanto fora do corpo físico.” (Ashtavakra)


Ramesh: Nesse verso importante, Ashtavakra aponta que o que nós somos como sujeitos definidamente não é uma coisa ou um objeto, que o pronome pessoal inevitavelmente sugere, mas mais um processo ou um pano de fundo, como a tela na qual um filme é visto. Na ausência de um pano de fundo não poderia haver nenhuma aparência de modo algum, embora no caso da manifestação fenomenal, o próprio “pano de fundo” - a Consciência – constitui a aparência e é responsável por ela. O ponto é que a menos que haja um total “afastamento” para a impessoalidade, a consideração “quem ou o que sou eu?” pode significar de fato uma transferência simples demais - do objeto para o sujeito (da fenomenalidade para a não-fenomelalidade / do manifesto para o não-manifesto). Isso não teria força suficiente para quebrar o condicionamento trazido pela noção de identidade que conduz à suposta limitação. É apenas um afastamento direto para a impessoalidade que é mais provável de trazer a alarmante transformação conhecida como metanoesis, onde há uma convicção repentina e imediata de que a identificação com uma entidade individual separada, na verdade, nunca existiu realmente e era essencialmente nada além de uma ilusão.


Talvez seja por essa razão que Ashtavakra sugere a analogia do espelho para a Consciência, a qual reflete tudo, não retém nada e em Si mesma não tem existência perceptível. Isto é, a Consciência é o pano de fundo do que parecemos ser como objetos (fenômenos), e ainda assim ela não é algo objetivo (um objeto). Da mesma forma que um reflexo no espelho é uma mera aparência sem nenhuma existência e o espelho é o que tem existência mas não é afetado de maneira nenhuma pelo que está refletido, assim também o aparato psicossomático (o organismo corpo-mente), sendo apenas uma aparência na Consciência, não tem existência independente. A Consciência na qual ele aparece não é afetada de forma alguma pela aparência dos objetos nela.



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Ramesh: A Fonte, que criou esta manifestação dentro de Si como um reflexo, está fazendo esta manifestação funcionar. Portanto, a manifestação e seu funcionamento, aos quais chamamos vida – são tudo um reflexo na Fonte.

Primeiro há a Fonte. A Fonte cria um reflexo. O reflexo é o Eu Sou. Agora, Ramana Maharshi diz que a Fonte é o “Eu-Eu”. Ele A nomeia de “Eu-Eu” meramente para distingui-la do Eu Sou. O “Eu-Eu” é a Energia latente (potencial). A Energia Potencial torna-se ativa na forma de manifestação como o Eu Sou, e torna-se ciente da manifestação. O Eu Sou é a Consciência (awareness) impessoal da manifestação e do seu funcionamento. Então, para o funcionamento da manifestação acontecer, a Fonte – ou Deus, ou o Eu Sou – cria estes organismos corpo-mente e por conseguinte “eu's” individuais, ao identificar a Si mesma com esses organismos corpo-mente. Portanto, a Energia Universal, a Energia Potencial, torna-se ativa nesta manifestação. O “Eu-Eu” ao sair do estado latente, torna-se o Eu Sou, e o Eu Sou torna-se o eu sou Markus. Por que o Eu Sou torna-se Markus? Porque sem o Markus e os outros bilhões de nomes, a vida como conhecemos não aconteceria.


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Então, a manifestação é real? Ela é real e irreal. A questão – a manifestação é real ou não? Está errada. A manifestação é tanto real quanto irreal: real na medida em que ela pode ser observada, irreal com base em que ela não tem existência independente própria dela mesma sem a Consciência. Desse modo, a única coisa que tem existência independente dela própria é a Realidade e essa Realidade é a Consciência. A Consciência é a única Realidade. Todo o resto é um reflexo dessa Realidade dentro de Si mesma.



Lance: Estou tendo problemas em entender o “Eu-Eu” e o Eu Sou.

Ramesh: Não existe problemas pois eles não são dois. Eles não são dois. A Consciência-em-repouso é o Eu-Eu. Quando ela está em movimento ela é o Eu Sou. Portanto, o Eu-Eu é um conceito que realmente não lhe interessa. É apenas um conceito. O que realmente lhe interessa é o Eu Sou.

Lance:O Eu sou é a totalidade da manifestação.

Ramesh: Correto.

Lance: Então quando estamos no estado de sono o que ele vira?

Ramesh: Eu Sou, pois há um corpo ali e ele está na fenomenalidade.

Lance: Portanto, quando não existe a manifestação há somente o Eu-Eu.

Ramesh: Sim.

Lance: Num livro sobre Ramana Maharshi é dito que quando investigamos a fundo 'Quem sou eu?”, encontramos o nada.

Ramesh: Está vendo, Ramana Maharshi, portanto, não distingue realmente entre o “Eu-Eu” e o “Eu sou” porque é inútil. O Eu-Eu é meramente um conceito a respeito do qual ele falou, por que se preocupar? O que interessa a você é o Eu Sou e o eu sou Lance. E quando o Lance não está aí, o Eu Sou está.

Lance: O que é o estado de sonhos então?

Ramesh: O estado de sono com sonhos é a Consciência-em-ação identificada. O que é o sonho da vida, então? O sonho da vida é o sonho do Eu Sou. O Lance tem um sonho pessoal e o Eu Sou tem o sonho vivo. Desse modo, o que acontece na verdade é que você acorda do seu sonho pessoal para o sonho vivo.

Lance: No sono profundo existe o Eu-Eu?

Ramesh: O Eu Sou! O Eu-Eu realmente não lhe interessa.

Lance: Mas agora sinto necessidade de saber.
Ramesh: Então de onde vem o Eu Sou? Essa é uma questão conceitual. E para essa pergunta conceitual a resposta conceitual é que o Eu Sou é a Energia impessoal tornada ativa na forma de manifestação e o Eu-Eu é a Energia Potencial (latente). O “eu” pessoal que o Lance pensa que é ele, é a Energia impessoal identificando-se como um ego que pensa que ele é o fazedor e que precisa saber. Quando verdadeiramente não há mais questões, então não há fazedor. Onde não há fazedor não há ego. E onde não há ego, aí o Eu Sou brilha a partir de um organismo corpo-mente sem identificação pessoal. Quando o organismo corpo-mente morre, o Eu Sou continua como Eu Sou. E quando a totalidade da manifestação chega a um fim, aí o Eu Sou é Eu-Eu, a Consciência-em-repouso. E tudo isso é um conceito.


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Peter: Você disse que o “eu” no Eu Sou não é o Ego. Mas o que é ele? Eu não entendi quando você disse o Eu-Eu.

Ramesh: Você vê, a Consciência não ciente de Si mesma, a Energia Potencial, é um conceito. Não cometa enganos! Eu-Eu, Eu Sou, eu sou Peter – a coisa toda é um conceito com o intuito de compreender a sua natureza real. Assim o Eu-Eu é a Energia Potencial antes da manifestação.

Peter: A manifestação de mim?

Ramesh: Não. A totalidade da manifestação.

Peter: Portanto, esse Eu é totalmente não individual?

Ramesh: Isso. Bem, na verdade, seja Eu-Eu, Eu Sou – eles não são dois. O Eu-Eu torna-se Eu Sou na manifestação. O Eu-Eu torna-se ciente de Si mesmo na forma de Eu sou. Mas é a mesma Consciência una.

Peter: É um nome para a Consciência? Um rótulo para a Consciência?

Ramesh: Isso mesmo. Um conceito. É por isso que falo sempre que o Eu Sou torna-se um conceito quando você fala sobre ele. Essa pura Ciência (awareness) da Existência é a Verdade, mas a partir do momento que eu falo a respeito dela, Ela se torna um conceito.

Peter: Qual é a relação entre a Consciência e a palavra “Eu”?

Ramesh: Esse é apenas um nome dado para a Consciência.

Peter: Sim, é o que você acabou de chamar de rótulo.

Ramesh: Sim. Você vê, até “Consciência” é um rótulo. “Deus” é um rótulo.

Peter: É confuso usar o “eu” que usamos para nossa individualidade nesse contexto.

Ramesh: Portanto, eu digo Eu-Eu, Eu Sou e eu sou Peter.

Peter: São três “eus” diferentes.

Ramesh: Ou é a mesma Consciência, mas a relevância é para um ponto diferente.

Peter: O último indica o ego.

Ramesh: O último indica o ego.

Peter: O do meio, Eu Sou ...

Ramesh: A Consciência impessoal.

Peter: E o Eu-Eu ...

Ramesh: É a Consciência impessoal antes ...

Peter: Da potencialização, da manifestação.

Ramesh: Sim, correto. De novo, são palavras para explicar a mesma coisa.

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Pergunta: Num certo momento perguntaram para Nisargadatta Maharaj: “Existe algo que seja real nesse jogo?” Ele disse algo parecido com, “A ação do amor.” Foi tudo o que ele disse, eu acho.

Ramesh: A ação do amor? De qualquer forma, o que quer que ele tenha dito, eu lhe digo o que ele estava querendo dizer. (risos)

A questão é: “O que é real?” O que é real é a conexão inseparável entre o real real e o falso real. Tem de haver uma conexão senão seriam dois. Então, o que os mantém juntos, unidos? É o amor. Chame isso de compaixão, de como você quiser, o melhor é não chamá-lo de nada. Isso é o que ele quis dizer.