terça-feira, 12 de outubro de 2010

Rodney Collin - A Teoria da Influência Celestial - Capítulo XIV - Personalidade, Essência e Alma

Todo o esquema rítmico e padrão de tempo sobre o homem, discutido nos capítulos anteriores, refere-se ao homem normal, ou melhor dizendo, a um arquétipo do homem. Pressupõe que os diferentes órgãos estejam igualmente dispostos em relação à sensitividade, de modo que as várias influências planetárias sejam recebidas e tenham efeito em sua justa harmonia e proporção. Na verdade, não há homem que individualmente reflita com perfeição tal harmonia, pois, nos homens que conhecemos, algumas glândulas são de uma sensibilidade supra-normal e outras de sensibilidade sub-normal. As descrições dadas dos tipos endócrinos ou planetários foram uma tentativa de descrever o efeito da sensibilidade supra-normal de uma glândula ou do aparato receptor. Um homem perfeitamente harmonizado, em quem todas as influências planetárias estivessem equilibradas e nenhuma delas ausente ou exagerada, é uma idéia que dificilmente pode ser concebida, exceto como resultante de um intenso trabalho de auto-aperfeiçoamento.
Admitindo o princípio de sensibilidade variante nas diferentes glândulas ou aparatos receptores, vemos como podem originar-se todas as anormalidades da forma e idade humanas. Suponhamos que Marte emane certas influências que estimulem as funções supra-renais e sexuais, enquanto Vênus, influindo nas paratireóides e no timo, tenda a promover o desenvolvimento físico, detendo a diferenciação sexual. Se os dois órgãos receptores são igualmente sensíveis, os próprios movimentos planetários assegurarão que a influência marcial eclipsará a outra aos 15 anos, produzindo a puberdade. Mas suponhamos que o órgão receptor para a influência marcial seja excepcionalmente sensível e que aquele sincronizado com a radiação venusiana seja insensível. Nesse caso, o primeiro eclipsará naturalmente o segundo com muita antecipação e a puberdade não ocorrerá aos 15 anos, mas aos 13 ou 12.
Decerto, raças inteiras estão mais sincronizadas estruturalmente com um planeta que com outro, tendo assim sua própria ‘normalidade’ de tempo, desviando-se mais e menos da normalidade prescrita para a humanidade. Além disso, tais povos ou raças estarão mais aguçadamente cientes do ritmo de ‘seu’ planeta e encontrarão dificuldade em compreender manifestações de outros povos derivadas de percepções de ritmos completamente distintos.
Mais luz é lançada nessa questão quando analisamos certos casos patológicos, como, por exemplo,naqueles em que um tumor na glândula pineal produz senilidade prematura e um garoto de oito anos adquire a aparência encarquilhada de um velho de oitenta.
Nos casos acima mencionados, consideramos o efeito das várias glândulas ‘colocadas’ em diferentes graus de sensibilidade. Por outro lado, parece-nos que a própria glândula, devido ao estímulo patológico, aumenta fantasticamente sua receptividade. Imaginemos uma antena de rádio de sensibilidade fixa sincronizada com apenas uma longitude de onda; seu volume variará com a produção e a distância da estação transmissora. Este é um caso normal. Mas suponhamos que a antena de rádio aumente subitamente sua sensibilidade. Começará a haver ruído e interferência nas antenas vizinhas, ainda que o poder da estação transmissora permaneça constante ou mesmo diminua. Se a glândula pineal é sensível à influência de certo planeta que, ao atuar com seu ciclo prolongado e lento, controla o envelhecimento gradual do organismo, um estímulo anormal nessa glândula pode fazê-la responder de forma antinatural a essa influência envelhecedora, até que essa última, por alteração de volume, apague todas as influências moderadas que provêm de qualquer outra parte.
Em suas formas extremas, essas duas classes de aberração – uma sensibilidade ou deficiência patológica de alguma glândula e uma variação patológica em sua função – respondem por todas as anormalidades congênitas e orgânicas que podemos encontrar. Nesses casos, o próprio mecanismo do homem é seriamente danificado, talvez sem possibilidades de reparo. E não se pode evitar que toda a vida psíquica oriunda de tal mecanismo seja desviada e desequilibrada.
Contudo, há um tipo diferente de anormalidade muito mais comum encontrada em mecanismos mais ou menos saudáveis. Essa anormalidade que origina toda gama da psiquiatria humana e, numa grande proporção, pensamentos e sentimentos das pessoas comuns, será tratada agora. Tínhamos chegado à conclusão de que a proporção das diferentes secreções endócrinas mantidas em suspensão no sangue num dado momento fazem de um homem o que ele é. Seu estado é o resultado de todos os impulsos que essas energias ditam separadamente. Impulsos para estudar, buscar companhia, mover-se inquietamente, fazer amor mesclam-se nele em intensidades diferentes, produzindo a coloração e o estado do momento. Isso é o que é chamado sua psicologia.
Mas prossigamos além e tentemos imaginar a corrente sanguínea de um homem ao longo de toda sua vida, todo o sangue que passa por ele desde sua concepção até sua morte como uma simples entidade. O sangue começa a fluir por ele desde o momento em que o óvulo fecundado adere ao útero materno e não cessa de fazê-lo até que seu coração pare de bater. Essa ‘extensa’ corrente sanguínea é uma teia de aranha unindo cada parte do círculo de sua vida e que já esboçamos no Capítulo 11. Em cada momento, a composição de sua corrente sanguínea dita seu humor. A totalidade de sangue vital, sustentando a soma final de influências que contribuíram para seu ser, é o homem. Representa sua verdadeira natureza, o que ele objetivamente é, sua essência.
A questão é que ninguém sabe o que é essa soma. Ninguém se conhece objetivamente. Ninguém pode analisar a elevada química de seu sangue e honestamente avaliar a si mesmo de acordo com ela. Isso já seria uma tremenda conquista e o homem que conhecesse sua essência teria uma enorme vantagem no mundo.
De fato, o que um homem pensa de si mesmo e de suas possibilidades tem muito pouco a ver com sua química física real. O homem que por sua estrutura natural e por suas capacidades pode ser um trabalhador competente e próspero julga que é um poeta ignorado, ainda que nunca tenha escrito uma linha de poesia sequer. Por outro lado, o poeta nato sente que realmente seria feliz numa fazenda, ainda que não tenha passado mais que finais de semana fora da cidade. O estudioso rato de biblioteca vê-se como um Casanova em potencial e por aí adiante. Esses são seus sonhos e eles vêem tudo o que lhes acontece e àqueles que parcialmente conhecem à luz de sua própria natureza essencial e por meio de seus sonhos.
Para dar suporte a esses sonhos, eles têm que adotar uma certa atitude inventada diante de tudo, diferente daquela ditada por seu sangue, sua essência, pelo que realmente são. Essa atitude inventada é tomada por outras pessoas como sua personalidade e pode até mesmo ser muito admirada e solicitada. Isso, contudo, traz-nos a idéia da personalidade num sentido correto e útil. Do latim, ‘persona’, uma máscara de teatro através da qual o ator fala. A personalidade legítima está entre a essência do homem e o mundo exterior. É sua ‘pele psicológica’, sua proteção da vida e meio de ajustar-se a ela. Inclui tudo o que ele aprendeu sobre como orientar seu organismo em seu ambiente, o modo que aprendeu para falar, pensar, caminhar, comportar-se e assim por diante: todos os seus hábitos adquiridos e idiossincrasias. Somente no homem comum esse adaptar-se à vida, esse savoir faire que lhe possibilita proteger a vida interna de choques desnecessários e distrações está tão inextricavelmente misturado com as atitudes pretensiosas e inventadas, que ambos acabam ficando inseparáveis. Temos que os considerar como um fenômeno, como a personalidade que, mesmo em seu melhor aspecto, é algo irreal, sem substância material.
Se considerarmos o círculo da vida do homem como uma esfera, sua essência será como que a natureza física do interior da esfera, sua consistência, densidade e composição química. Logo, sua personalidade será algo imaginário, que absolutamente não existe na esfera. Não tem espessura nem dimensão. Provém unicamente do exterior. É como a luz do mundo que a cerca refletida na superfície da esfera. Podemos mesmo dizer que é refletida apenas numa metade de sua vida, num hemisfério, pois, antes dos dois ou três anos, uma criança não tem imaginação sobre ela mesma, não tem pretensões e , na verdade, não é senão essência.
Podemos alcançar uma maior compreensão da natureza da personalidade quando nos damos conta de que essa luz que o homem reflete é exatamente o que ele não absorve. O que é mais óbvio sobre um homem é o que ele rejeita e o modo particular com que o faz. Ele é reconhecido pelo que ainda não compreende, pelo que o separa do resto. Isso é sua personalidade. Quando ele realmente compreende e absorve algo, isso penetra nele e torna-se parte de sua essência. Então já não é aparente para os outros como sua personalidade – ela é ele e ele é ela. A separabilidade característica da personalidade desapareceu.
A mesma idéia pode ser colocada de modo diferente. Um homem se alimenta. Mas dá-seum longo processo digestivo antes que essa comida seja suficientemente refinada para entrarem sua corrente sangüínea e tornar-se assim inseparavelmente absorvida dentro de seu organismo. Até que isso aconteça, a comida não é parte dele, ele pode até ficar doente e perdê-la completamente.
Algo semelhante ocorre com a experiência, mas dá-se um longo processo digestivo antes que essa experiência seja compreendida e dominada a ponto de poder modificar realmente sua essência física. Essa digestão da experiência acontece na personalidade e por intermédio dela. E, como a comida no processo de digestão, somente experiência e compreensão que estejam na personalidade podem ser perdidas a qualquer momento. Apenas quando, por insistência e repetição, ela penetrar a essência, se tornará intransferivelmente sua. A personalidade é o órgão de digestão para a experiência.
A anormalidade ou loucura fundamental do homem reside na divergência entre essência e personalidade. Quanto mais intimamente um homem se conhecer pelo que ele é, mais próximo ele estará da sabedoria. Quanto mais sua imaginação a seu próprio respeito divergir do que ele realmente é, mais louco ele se tornará.
No começo deste capítulo, estudamos as anormalidades orgânicas. Naquele momento, falávamos como que de asnos ou cavalos doentes. Agora estamos considerando o problema de asnos perfeitamente saudáveis que se consideram cavalos e de cavalos perfeitamente saudáveis que se consideram asnos. Este é o conteúdo da psicologia moderna.
Há, no entanto, uma possibilidade de curar essa desilusão. Trata-se da potencialidade que existe nohomem de tornar-se consciente de sua própria existência e de sua relação com o universo que o cerca, pois, no momento em que é consciente de sua existência, conhece o que ele é e o que ele não é, ou seja, conhece a diferença entre sua essência e sua personalidade. No mesmo momento, também sabe o que está nele e o que está fora dele, isto é, conhece a si mesmo e sua relação com o mundo.
Lembrança de si, e somente lembrança de si capacita o homem a trocar a pele exterior da personalidade e sentir e atuar livremente a partir de sua essência, isto é, a ser ele mesmo. Desse modo, ele pode separar-se das pretensões e imitações que o escravizaram desde a infância e retornar ao que ele realmente é, retornar à sua própria natureza essencial. Tal retorno à essência é acompanhado de um sentido de liberdade e liberação, distinto de qualquer outro e que pode suprir exatamente a força motivadora requerida para empreender as tarefas inteiramente novas que o homem libertado vê serem necessárias.
Este famoso tema do Peer Gynt de Ibsen – “Homem, a ti mesmo sê fiel” – é certamente o primeiro e obrigatório mandamento no caminho da consciência e do autodesenvolvimento, pois, a menos que um homem encontre a si mesmo, encontre sua própria natureza essencial e destino e comece a partir deles, todos os seus esforços e conquistas serão construídos sobre a areia da personalidade e, ao primeiro choque grave, toda a estrutura sucumbirá, destruindo-o talvez em sua queda.
Num homem que está se desenvolvendo, a personalidade é o servidor da essência. E, desde que a essência torne-se o servidor da personalidade, isto é, tão logo a força natural e capacidades de um homem sejam postas a servir a falsa imagem que ele tem de si mesmo, o crescimento interno cessa e, no curso devido, a essência definha e torna-se incapaz de novo crescimento. O único modo pelo qual esse definhamento pode ser detido e a vida restaurada à essência é pela lembrança de si, isto é, pelo cultivo deliberado de autoconhecimento e autoconsciência.
O que isso implica? No capítulo das funções das diferentes glândulas, vimos que elas estavam conectadas e unificadas não apenas pela corrente sanguínea, mas potencialmente de um modo diferente. Elas estavam conectadas numa ordem diferente por uma parte não utilizada do sistema nervoso. O funcionamento dessa nova conexão traria com ela a possibilidade de um homem estar ciente de si mesmo. Assim como sua sensação subjetiva da corrente sanguínea é um sentimento de calor corporal, também a sensação subjetiva de seu sistema nervoso, se este trabalhasse, seria autoconsciência. Esta é a nova função que, arriscamo-nos a dizer, deverá entrar em operação na plenitude da vida.
Dissemos que a essência do homem é a totalidade de sua corrente sanguínea, todo o sangue que flui por ele da concepção à morte. Podemos dizer agora que a alma do homem é a totalidade dos momentos de autoconsciência durante sua vida ou toda a energia super fina que fluiu através de seu sistema nervoso não utilizado. Mas aqui tropeçamos numa dificuldade, porque já tínhamos admitido que tais momentos são excessivamente raros, poucos num ano ou até mesmo na duração de uma vida. No sentido comum, o homem não tem consciência de sua existência. A energia não flui absolutamente por esse sistema. Os momentos de autoconsciência que um homem pode experimentar em circunstâncias de grande tensão, intensa alegria, dor, sofrimento, resistência ou privação são nada mais que momentos e vão-se, assim como vieram. Mesmo que somados, não resultariam em nada, assim como uma série de pontos não chega a ter dimensão mensurável.
O que então aconteceu à alma do homem? Não temos escolha a não ser admitir que o homem comum não encontrou uma alma. Ela tem que ser criada.
Etimologicamente, psicologia é o conhecimento ou a sabedoria da alma. Mas, se o homem não tem alma, nada do que agora passa por psicologia realmente o é. Tudo o que leva esse nome é na verdade psiquiatria, ou seja, o estudo da enfermidade da alma ou as condições de sua ausência. A verdadeira psicologia é, portanto, o estudo do que não existe ainda, é o estudo da arte de criar uma alma.
Falamos de essência, personalidade e alma. Agora é possível pensar na relação dessas diferentes partes do homem. O ‘mundo’ de um homem individual encontra-se cercado por outros mundos de escala semelhante, permeado pelos mundos menores de células e moléculas e incluído dentro dos grandes mundos da Natureza, da Terra, do Sistema Solar e assim por diante. Desses outros mundos, ele recebe nutrição na forma de alimentos, ar e percepções de todos os tipos. Já vimos como os diferentes períodos de vida, com seus diferentes meios e funções dominantes, utilizam nutrientes que provêm especialmente de um aspecto do homem ou de outro. Isso se refere especialmente aos diferentes aspectos de seu organismo físico. Agora surge a questão do crescimento de outras partes do homem que não sejam seu corpo, isto é, de sua essência e sua alma.
Acabamos de dizer que, quando um homem realmente absorve algo e o compreende, isso penetra nele e torna-se parte dele. Certamente um homem pode adquirir um gosto por impressões brutais ou perversas que, gradualmente penetrando sua essência, podem corrompê-la no devido tempo. Por outro lado, percepções de mundos maiores, forças maiores, ideais elevados, possibilidades elevadas ou, ao contrário, percepções terríveis e dolorosas, tomadas de certo modo, nutrirão e enriquecerão sua essência. Se tais percepções penetrarem constantemente num homem e forem digeridas por ele, a essência começará a crescer.
Ao mesmo tempo, cada tipo de essência deve ser alimentada à sua própria maneira. Os diferentes tipos delineados no Capítulo 10 eram exatamente tipos de essência. O que é alimento verdadeiro para a essência saturnina é inútil para a marcial e vice-versa. Façanhas de resistência que enriquecerão a essência de um homem poderão amedrontar a de outro, enquanto que sutilezas pelas quais a essência deste cresce sensivelmente são meramente enervantes para o primeiro. Assim, cada homem deve começar a perceber por si mesmo o que alimenta sua essência e o que o faz ser mais ele mesmo.
Percepções não absorvidas que não vão alimentar a essência serão refletidas de volta a partir de sua superfície em forma de personalidade, assim como os raios solares que não são absorvidos pela Lua são refletidos de volta para nós como sua ‘luz’ emprestada.
Além disso, assim como as percepções propriamente recebidas por meio de sentidos corporais podem alimentar a essência e alterar sua natureza, também essas matérias finíssimas acumuladas na essência podem alimentar a alma embrionária. Essas mesmas percepções de mundos e de possibilidades superiores ou as percepções de dor, sofrimento e grande perigo, profundamente absorvidas dentro de sua essência, podem despertar no homem um desejo de tornar-se consciente de sua existência e de sua relação com o universo. Se esse tipo de nutrição for recebido durante tempo suficiente e com a devida consistência, poderá conduzi-lo à realização de esforços diretos para tornar-se consciente. E estes, por sua vez, com sorte e condições corretas, podem alcançar com o tempo uma crescente recorrência de momentos de autoconsciência de maior duração. Desse modo, nasce uma alma.
Tal crescimento na essência e o nascimento de uma alma implicarão numa mudança de todo o ser do homem, um acúmulo interno de força e energia. E, assim como para a personalidade dissemos ser o reflexo de percepções análogo à luz refletida pela Lua, também a transformação interna de impressões requerida para criar uma alma será semelhante ao processo pelo qual um corpo resplandece por sua própria luz. Será análogo ao Sol.