domingo, 7 de fevereiro de 2010

Philokalia - Philotheu do Sinai - Textos sobre a sobriedade (parte 2)

Uma alma (amante dos pecados), estando cercada e rodeada por espíritos do mal como um muro, está atada pelos grilhões da escuridão e por causa dessa escuridão envolvente não pode orar como deveria, pois está limitada pela escuridão em segredo (nas suas próprias profundezas secretas e inconscientemente) e seus olhos internos estão cegos. Mas quando (voltando para si mesma) ela começa a correr para Deus em oração e enquanto ora, luta para praticar a sobriedade da melhor maneira que pode, então, através do poder da prece ela começa pouco a pouco, a ser libertada dessa escuridão; de outra maneira ela não tem qualquer possibilidade de se tornar livre. Desse modo, ela aprende que existe no coração uma outra batalha interior, uma luta nos pensamentos, instigada pelos espíritos do mal, como atestam as escrituras, dizendo: “Se o espírito do governante levantar-se contra ti, não abandones teu posto” (Ecl. X, 4). O posto da mente é ela manter-se firme na virtude e na sobriedade. Um homem pode tomar um posto na vida virtuosa ou na vida pecaminosa. Pois as escrituras dizem: “Abençoado é o homem que não segue o conselho dos ímpios, nem se põe no caminho dos pecadores” (Sal. I,1). E o Apóstolo ensina: “Portanto, ponde-vos de pé e cingi os rins com a verdade” (Efés.vi,14).


A doce memória de Deus, isto é, de Jesus, acoplada à indignação e à contrição benigna sentidas no coração, pode sempre aniquilar toda a fascinação dos pensamentos, a variedade de sugestões, palavras, sonhos, imaginações sombrias e, resumindo, tudo com que o todo-destrutivo inimigo se arma para atacar, buscando ardentemente devorar nossas almas. Jesus, quando invocado, facilmente queima tudo isso. Pois, em nenhuma outra parte podemos encontrar a salvação exceto em Jesus Cristo. O próprio Salvador confirmou isso dizendo: “Sem mim, nada podeis fazer” (João xv,5)


E, portanto, a cada hora e a cada momento guardemos zelosamente nosso coração de pensamentos que obscureçam o espelho da alma que deveria conter, desenhada e impressa em si, apenas a imagem radiante de Jesus Cristo, o Qual é a sabedoria e o poder de Deus, o Pai. Busquemos constantemente o reino dos céus no coração e certamente encontraremos misteriosamente dentro de nós a semente, a pérola, a bebida e tudo mais, se limparmos o olho de nossa mente. É por isso que nosso Senhor Jesus Cristo disse: “O reino de Deus está dentro do vós” (Lucas xvii, 21), querendo dizer com isso a Divindade que habita no coração.


A sobriedade purifica a consciência até que ela brilhe resplandescente. Estando assim purificada, a consciência afasta toda a escuridão de dentro, como uma luz que repentinamente resplandece quando um véu que a cobria é removido. Se for verdadeira e constante a sobriedade é mantida depois que a escuridão for afastada, a consciência mostra novamente o que foi esquecido ou o que esteve escondido sem ser percebido. Ao mesmo tempo, novamente por meio da sobriedade, ela ensina a luta invisível com os inimigos, empreendida pela mente e a batalha dos pensamentos. Ela ensina como lançar tochas nesse combate solitário, como atirar dardos de bons pensamentos (contra o inimigo) e como prevenir as flechas do inimigo de ferirem a mente, fazendo-a rápida como uma flecha buscar proteção em Cristo, e assim ganhar o refúgio da luz de nossos desejos, em vez da escuridão da destruição. Aquele que provou essa luz entende o que estou falando. Uma vez que foi experimentada, essa luz tortura a alma ao máximo pelo anseio por ela, pois a alma alimenta-se dela mas nunca fica saciada e quanto mais ela prova essa luz, mais ardentemente a deseja. Essa luz que ofusca a mente, da maneira como o sol ofusca os olhos, essa luz inexplicável em si mesma, mas que entretanto torna-se explicável, só que não em palavras, mas através da experiência daquele que recebe sua influência ou que é ferido por ela – essa luz manda que eu fique em silêncio, embora a mente ainda gostaria de falar desse assunto.

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“Procurai a paz com todos e a santificação, sem as quais ninguém verá o Senhor” (Heb. Xii,14) com o intento de adquirir amor e pureza: pois esses são a paz e a santificação. A raiva deveria ser despertada somente contra os demônios com os quais empreendemos gerra mental e que estão enfurecidos contra nós. Mas ouça como essa guerra, empreendida a cada hora em nós, deveria ser conduzida e faça o seguinte: com a sobriedade combine oração e a sobriedade irá fortalecer a oração e esta fortalecerá a sobriedade. Observando tudo internamente de forma constante, a sobriedade nota o inimigo tentando ganhar passagem e barrando o caminho com toda sua força, ao mesmo tempo evoca a ajuda do Nosso Senhor Jesus Cristo para afastar esses combatentes do mal. Assim, a atenção barra o caminho por meio de oposição e Jesus, quando invocado, afasta os demônios e suas fantasias.


Guarde sua mente com extrema intensidade de atenção. Assim que você notar um pensamento (hostil), imediatamente resista a ele e ao mesmo tempo se apresse em chamar Cristo Nosso Senhor para se vingar. Enquanto você ainda está chamando por Ele, o doce Jesus dirá: Estou com você para protegê-lo. Mas quando os inimigos são subjugados pela sua oração, você deve novamente, diligentemente prestar atenção à sua mente. Aqui vêm ondas (de pensamentos), mais numerosas do que nunca, novamente avançando contra você, uma após a outra, de modo que a alma é quase engolida por elas e fica a ponto de perecer. Mas Jesus, sendo Deus, quando o discípulo apela, novamente proíbe os maus ventos (de pensamentos) e eles são subjugados. Mas você, tendo encontrado uma hora ou um momento de folga dos ataques do inimigo, glorifique Aquele que lhe salvou e mergulhe fundo numa meditação sobre a morte.


Um homem que com sucesso redime o tempo de sua vida e está constantemente ocupado com pensamentos e memória da morte e através disso, sabiamente remove sua mente das paixões, geralmente vê as constantes aparências das sugestões do mal com mais precisão do que um homem que passa sua vida sem lembrar da morte e que espera purificar seu coração apenas pela ação da razão, em vez de manter-se sempre com esse pensamento triste e que provoca lágrimas. Contando com a rapidez da sua mente de manter em mãos todas as paixões ruins e não percebendo o quanto ele está atado por uma delas, acontece o pior de tudo: ele cai na presunção (como alguém que espera ter êxito em qualquer coisa) sem Deus. Tal homem deve praticar uma sobriedade muito estrita, para que não perca sua razão por causa de sua arrogância. Pois o Apóstolo Paulo diz (I Cor.Vii,I) que as pessoas que coletam conhecimento aqui e ali se vangloriam diante daqueles que, em sua opinião, sabem menos do que eles. E penso que o motivo disso é que falta neles a fagulha do amor que edifica. Um homem que mantém uma constante lembrança da morte tem olhos mais aguçados do que um homem que carece dela. Ele nota as sugestões dos demônios e facilmente mantendo-os sob seus pés manda-os embora.

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