terça-feira, 27 de dezembro de 2011

G. I. Gurdjieff - Visões de um Mundo Real

Para um estudo exato, uma linguagem exata é necessária. Mas a linguagem comum na qual falamos, que estabelece o que conhecemos e compreendemos, na qual escrevemos livros na vida ordinária, não corresponde nem mesmo numa pequena medida a uma expressão exata.
Um discurso inexato não pode servir a um conhecimento exato. As palavras que compõem a nossa língua são demasiadamente abrangentes, muito nebulosas e indefinidas, enquanto que o sentido colocado nelas é muito arbitrário e variável.
Todo homem que pronuncia qualquer palavra sempre atribui este ou aquele nuance de significado a ela através de sua imaginação, exagera ou coloca à frente este ou aquele lado dela, às vezes, concentrando todo o significado da palavra numa única característica do objeto, ou seja, designando por esta palavra não todos os atributos, mas aqueles atributos acidentais
externos que vierem primeiro à sua atenção. Outro homem falando com o primeiro atribui à mesma palavra outra nuance de significado, toma aquela palavra em um outro sentido, o qual muitas vezes é exatamente o oposto. Se um terceiro homem se junta à conversa, novamente ele coloca na mesma palavra seu próprio significado. E, se dez pessoas falarem, cada uma delas, mais uma vez dará o seu próprio significado e a mesma palavra terá dez significados. E os homens falando dessa forma pensam que podem compreender uns aos outros, que podem transferir seus pensamentos uns aos outros. Pode-se dizer com plena confiança que a linguagem na qual os homens contemporâneos falam é tão imperfeita que no que quer que eles falem, especialmente em questões científicas, nunca poderão ter certeza que chamam as mesmas ideias pelas mesmas palavras.
Pelo contrário, pode-se dizer quase com certeza que eles entendem cada palavra de forma diferente e, que enquanto parecem falar sobre o mesmo assunto, de fato, falam de coisas completamente diferentes. Além disso, para cada homem o sentido de suas próprias palavras e o significado que ele coloca dentro delas muda de acordo com seus próprios pensamentos e humores, com as imagens que ele associa no momento com as palavras, bem como com o que e como seu interlocutor fala, pois por uma imitação involuntária ou ao ser contradito ele pode involuntariamente alterar o significado de suas palavras. Além disso, ninguém é capaz de definir exatamente o que ele quer dizer com esta ou aquela palavra, ou se esse significado é constante ou se está sujeito a alterações, como, porquê e por que razão.
Se vários homens falam, todos falam de sua própria maneira e nenhum deles entende o outro. Um professor uma palestra, um estudioso escreve um livro e sua audiência e seus leitores ouvem lêem não a eles, mas a combinações de palavras dos autores com seus próprios pensamentos, idéias, humores e emoções do dado momento.
As pessoas de hoje estão, até certo ponto, conscientes da instabilidade de sua linguagem. Dentre os diversos ramos da ciência, cada um desenvolve sua própria terminologia, sua própria nomenclatura e linguagem. Na filosofia tentativas são feitas, antes de usar qualquer palavra, de deixar claro em que sentido ela é considerada, mas por mais que as pessoas hoje em dia tenham tentado estabelecer um significado constante para as palavras, elas não tiveram êxito até omomento. Cada escritor fixa a sua própria terminologia, muda a terminologia de seus antecessores, contradiz sua própria terminologia, em suma, todo mundo contribui com sua parte para a confusão geral.
Este ensinamento aponta a causa disso. Nossas palavras não têm e não podem ter qualquer significado constante e em primeiro lugar, não temos meios de indicar a cada palavra o significado e o tom particular que damos a essa palavra, isto é, as relações em que ela é tomada por nós, e em segundo lugar não visamos isso, pelo contrário, invariavelmente desejamos estabelecer nosso significado constante para uma palavra e tomá-la sempre nesse sentido, o que é obviamente impossível, sendo que a mesma palavra usada em momentos diferentes e em várias relações tem significados diferentes.
Nosso uso errado das palavras e as qualidades das próprias palavras tornaram-nas instrumentos não confiáveis ​para um discurso
exato e um conhecimento exato, sem mencionar o fato que para muitas noções acessíveis a nossa razão não temos nem palavras nem expressões.

Apenas a linguagem dos números
pode servir para uma expressão exata de pensamento e conhecimento, mas a linguagem dos números é aplicada apenas para designar e comparar quantidades. Mas as coisas não diferem apenas no tamanho e sua definição do ponto de vista das quantidades não é suficiente para um conhecimento e análise exatos.
Nós não sabemos como aplicar a linguagem dos números aos atributos das coisas. Se soubéssemos como fazê-lo e
pudéssemos
designar
todas as qualidades das coisas por números em relação a um número imutável, essa seria uma linguagem exata.
O ensinamento cujos princípios vamos expor aqui tem como uma de suas tarefas trazer o nosso pensamento mais próximo de uma designação matemática exata das coisas e dos eventos e dar aos homens a possibilidade de compreenderem a si mesmos e uns aos outros.

Se tomarmos
qualquer uma das palavras mais usadas e tentarmos ver que variedade de significado essa palavra tem de acordo com quem a utiliza e em que contexto, veremos por que os homens não têm poder de expressar os seus pensamentos exatamente e por que cada coisa que o homem diz e pensa é tão instável e contraditória. Além da variedade de significados que cada palavra
pode ter, essa confusão e contradição é causada pelo fato de que os homens nunca dão-se conta para si do sentido em que eles tomam esta ou aquela palavra e apenas se perguntam por que os outros não a entendem, sendo que é tão claro para eles mesmos. Por exemplo, se dissermos a palavra "mundo" na frente de dez ouvintes, cada um deles entenderia a palavra de sua própria maneira. Se os homens soubessem como captar e anotar os seus pensamentos, veriam que não tinham idéias
relacionadas
com
a palavra "mundo", mas que apenas uma palavra bem conhecida e um som familiar foi proferido, o significado da qual é suposto ser conhecido. É como se todos que escutássem essa palavra disséssem para si mesmos: "Ah, o" mundo ", eu sei
o que
ele é.
" Na verdade, ele não sabe realmente de maneira nenhuma. Mas a palavra é familiar, e, portanto, tal pergunta e resposta não ocorre a ele. Ela é apenas aceita. A pergunta vem apenas em relação a novas palavras desconhecidas e, em seguida, o homem tende a substituir a palavra desconhecida por uma conhecida.
Ele chama isso de "entendimento."
Se agora perguntarmos ao homem o que ele entende pela palavra "mundo", ele fica perplexo com tal pergunta. Normalmente, quando ouve ou usa a palavra "mundo" numa conversa ele não pensa de forma alguma sobre o que ela significa, tendo decidido de uma vez por todas que ele sabe e que todo mundo sabe. Agora
, se alguém chamasse sua atenção sobre essa palavra e pela
primeira vez ele visse que não sabe e que nunca pensou nisso, e disso ele não seria capaz, ele não conseguiria descansar
com o pensamento de sua ignorância. Os homens não são capazes de suficiente observação e não são suficientemente sinceros consigo mesmos para poder fazê-lo. Ele iria recuperar-se em breve, isto é, ele muito rapidamente iria enganar a si mesmo e lembrando-se ou compondo apressadamente uma definição da palavra "mundo" de uma fonte familiar de conhecimento ou pensamento, ou da primeira definição de alguma outra pessoa que entra sua cabeça, ele iria expressá-la como se fosse sua própria compreensão do significado da palavra, embora na verdade ele nunca tenha pensado sobre a palavra "mundo" desta forma e não sabe como pensava que sabia.
O homem interessado em astronomia vai dizer que o "mundo" consiste em um número enorme de sóis rodeados por planetas, colocados a distâncias incomensuráveis ​​uns dos outros e que compõem o que chamamos de Via Láctea, além da qual existem distâncias ainda maiores e que estão além dos limites da investigação, onde outras estrelas e outros mundos podem ser supostos residir. Aquele que é interessado em física vai falar sobre o mundo de vibrações e descargas elétricas, sobre a teoria da energia ou talvez sobre a semelhança do mundo dos átomos e dos elétrons com o mundo de sóis e dos planetas. O homem inclinado à filosofia começará a falar sobre a irrealidade e o caráter ilusório de todo o mundo visível criado no tempo e no espaço pelos nossos sentimentos e sentidos. Ele vai dizer que o mundo dos átomos e elétrons, a terra com suas montanhas e mares, sua vida
vegetal e
animal, os homens e as cidades, o sol, as estrelas e a Via Láctea, todos esses são o mundo dos fenômenos, um mundo enganoso, falso e ilusório, criado por nossa própria concepção. Além deste mundo, para além dos limites de nosso conhecimento, existe um mundo incompreensível para nós, de noumenos - do qual o mundo fenomênico é uma sombra, um reflexo. O homem familiarizado com a teoria moderna do espaço multi-dimensional vai dizer que o mundo é geralmente considerado como uma esfera tridimensional infinita, mas que na realidade o mundo tridimensional como tal, não pode existir e representa apenas a seção imaginária de outro, um mundo de quatro dimensões, a partir do qual todos os nossos eventos vêm e para onde todos vão. Um homem cujo conceito de mundo é construído sobre o dogma da religião vai dizer que o mundo é a criação de Deus e depende da vontade de Deus, que para além do mundo visível, onde a nossa vida é curta e depende de circunstâncias ou acidentes, um mundo invisível existe onde a vida é eterna e onde o homem vai receber uma recompensa ou punição porudo o que ele fez nesta vida. Um teosofista vai dizer que o mundo astral não abraça o mundo visível como um todo, mas que sete mundos existem penetrando uns aos outros mutuamente e compostos de uma matérial mais ou menos sutil.
Um camponês russo ou um camponês de alguns países do oriente vai dizer que o mundo é a comunidade da aldeia da qual ele é membro. Este mundo está mais próximo a ele. Ele até mesmo dirige-se aos seus concidadãos nas assembleias gerais, chamando-nos de "mundo".
Todas essas definições da palavra "mundo" têm os seus méritos e defeitos: o seu principal defeito consiste em que cada uma delas exclui o seu oposto, enquanto que todas retratam um lado do mundo e examinam apenas de um ponto de vista dele. A definição correta seria formada da combinação de todas as compreensões separadas, mostrando o lugar de cada uma e, ao mesmo tempo dando em cada caso a possibilidade de declarar de que lado do mundo o homem fala, de que ponto de vista e em que relação.
Este ensinamento diz que se a questão sobre o que o mundo é fosse abordada da meneira certa, seria possível estabelecer com bastante precisão o que entendemos por esta palavra. E esta definição de um entendimento correto incluiria em si todas as visões sobre o mundo e todas as abordagens para a questão. Tendo, assim, concordado com essa definição, os homens seriam capazes de entender uns aos outros quando falassem sobre o mundo. Somente a partir de tal definição podemos falar sobre o mundo.

Mas como encontrar essa definição? O ensinamento ressalta que a primeira coisa é aproximar-se da questão da maneira mais simples possível, isto é, tomar as expressões mais usadas com que falamos sobre o mundo e considerar sobre que mundo estamos falando. Em outras palavras, olhar para a nossa própria relação com o mundo e tomar o mundo em sua relação com nós mesmos. Veremos que, ao falarmos do mundo, com frequência falamos da Terra, do globo terrestre, ou melhor, da superfície do globo terrestre, isto é, apenas o mundo em que vivemos. Se olharmos agora para a relação da Terra com o universo, veremos que, por um lado o satélite da Terra está incluído na esfera de sua influência, enquanto que por outro lado a Terra entra como uma parte componente do mundo planetário de nosso sistema solar. A Terra é um dos pequenos planetas girando em volta do sol. A massa da Terra forma uma fração quase desprezível em comparação com toda a massa dos planetas do sistema solar e os planetas exercem uma influência muito grande sobre a vida da Terra e em todas as organismos vivos existentes, uma influência muito maior do que o nossa ciência imagina. A vida dos homens individuais, de grupos coletivos, da humanidade, depende de influências planetárias em muitas coisas. Os planetas também vivem, como nós vivemos sobre a terra. Mas o mundo planetário, por sua vez, entra no sistema solar e entra como uma parte muito pouco importante porque a massa de todos os planetas juntos é muitas vezes menor que a massa do sol.
O mundo do sol é também um mundo em que vivemos. O sol por sua vez, entra no mundo das estrelas, na enorme acumulação de sóis que formam a Via Láctea.
O mundo estelar é também um mundo em que vivemos. Tomado como um todo, mesmo de acordo com a definição de astrônomos modernos, o mundo estelar parece representar uma entidade separada, tendo uma forma definida, cercado por espaço além dos limites que a investigação científica pode penetrar. Mas a astronomia supõe que a distâncias imensuráveis ​​de nosso mundo estelar, outras acumulações podem existir. Se aceitarmos essa suposição, diremos que o nosso mundo estelar entra como uma parte componente da quantidade total desses mundos. Esta acumulação de mundos de "Todos os Mundos" é também um mundo em que vivemos.
A ciência não pode olhar mais longe, mas o pensamento filosófico vai ver o último princípio que se encontra além de todos os mundos, isto é, o Absoluto, conhecido na terminologia hindu como Brahman.

Tudo o que foi dito sobre o mundo pode ser representado por um simples diagrama. Vamos designar a terra por um equeno círculo e marcá-lo com a letra A. Dentro do círculo vamos colocar um círculo menor que representa a lua e amos marcá-lo com a letra B. Em volta do círculo da terra vamos desenhar um círculo aior mostrando o mundo em que Terra entra e vamos arcá-lo com a letra . Em volta desse vamos desenhar o círculo representando o sol e marcá-lo com a letra D. Em seguida, em volta desse círculo desenhamos novamente um círculo representando o mundo estelar que vamos marcar com a letra E, e, então, o círculo de todos os mundos que marcaremos com a letra F. Em volta do círculo F vamos colocar o círculo G para designar o princípio filosófico de todas as coisas, o Absoluto.
O diagrama aparecerá como sete círculos concêntricos. Mantendo esse diagrama em vista, um homem ao pronunciar a palavra "mundo" sempre será capaz de definir exatamente de qual mundo ele está falando a respeito e em que relação a este mundo ele se encontra.
Como iremos explicar mais tarde, o mesmo diagrama nos ajudará a entender e combinar a definição astronômica do mundo, as definições filosóficas, físicas e físico-químicas, bem como a matemática (o mundo das muitas dimensões), e a definição teosófica (os mundos interpenetrantes uns aos outros) e outras.
Isso também deixa claro por que os homens falando sobre o mundo jamais poderão entender uns aos outros. Vivemos ao mesmo tempo em seis mundos, assim como vivemos em um andar de tal e tal casa, na rua tal e tal, em tal e tal cidade e tal estado, e em
tal parte do mundo.
Se um homem fala sobre o lugar onde ele vive sem indicar se ele refere-se ao andar ou à cidade ou à parte do mundo, ele certamente não vai ser compreendido por seus interlocutores. Mas os homens sempre falam desta maneira sobre qualquer coisa não tendo importância prática, e, como vimos no exemplo do "mundo", eles designam muito rapidamente
por uma única palavra
uma série de
noções que estão relacionadas umas as outras como uma parte insignificante está relacionada com um enorme conjunto, e assim por diante. Mas um discurso exato deveria salientar sempre e muito exatamente em que relação cada noção é tomada e o que ela inclui nela mesma. Isto é, de que partes ela consiste e em que ela entra como um componente.
Logicamente, é compreensível e inevitável, mas, infelizmente, nunca passa pela cabeça que os homens muitas vezes não sabem, e não sabem como encontrar as diferentes partes e as relações da noção dada.
É uma parte importante dos princípios deste ensinamento deixar claro a relatividade de cada noção, tomando-a não no sentido da idéia geral abstrata que tudo no mundo é relativo, mas indicando exatamente o em que e como se relaciona com o resto.


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Pergunta: Qual é o método do Instituto para o desenvolvimento harmonioso do homem?
Gurdjieff: O método é subjetivo, isto é, depende das peculiaridades individuais de cada pessoa. Existe
apenas
uma regra
geral que pode ser aplicada a todos – a observação. Isso é indispensável para todos. No entanto, essa observação não é para mudar, mas para ver a si mesmo. Todos têm suas peculiaridades próprias, seus hábitos próprios que um homem não costuma ver. É preciso ver essas peculiaridades. Dessa forma pode-se "descobrir muitas Américas." Cada pequeno fato tem a sua própria causa básica. Quando você tiver coletado material sobre si,
será possível falar; no momento, a conversa é apenas teórica. Se colocarmos peso de um lado, temos de equilibrar de alguma forma. Ao tentar observar a nós mesmos, adquirimos prática na concentração, o que será útil até mesmo na vida cotidiana.

P: Qual é o papel do sofrimento no autodesenvolvimento?
G: Existem dois tipos de sofrimento: o consciente e o inconsciente. Somente um tolo sofre inconscientemente. Na vida existem dois rios, duas direções. No primeiro, a lei é para o próprio rio, não para as gotas de água. Somos gotas. Em um deterinado momento uma gota está na superfície, em outro, no fundo. O sofrimento depende de sua posição. No primeiro rio o sofrimento é completamente inútil, porque é acidental e inconsciente. Paralelamente a este rio há outro rio. Neste outro rio existe um tipo diferente de sofrimento. A gota no primeiro rio tem a possibilidade de passar para o segundo rio. Hoje a gota sofre porque ontem ela não sofreu o suficiente. Aqui a lei da retribuição opera. A gota também pode sofrer com antecedência. Cedo ou tarde se paga por tudo. Para o Cosmos não há tempo. O sofrimento pode ser voluntário e só o sofrimento voluntário tem valor. A pessoa pode sofrer simplesmente porque se sente infeliz. Ou pode sofrer pelo ontem e para preparar para o amanhã.
Repito, somente o sofrimento voluntário tem valor.

P: Cristo era um mestre com uma preparação de escola, ou ele era um gênio acidental?
G: Sem conhecimento ele não poderia ter sido o que ele era, nem poderia ter feito o que fez. Sabe-se que onde ele estava havia conhecimento.
P: Se somos apenas mecânicos, que sentido tem a religião?
G: Para alguns a religião é uma lei, uma orientação, uma direção; para outros, um policial.
P: Em que sentido foi dito em uma palestra anterior que a Terra é viva?
G: Não somos apenas nós que estamos vivos. Se a parte está viva, então o todo estará vivo. Todo o universo é como uma corrente e a terra é um elo desta corrente. Onde há movimento, há vida.
P: Em que sentido é dito que aquele que não morreu não pode nascer?
G: Todas as religiões falam sobre a morte durante esta vida na Terra. A morte deve vir antes do renascimento. Mas o que deve morrer? A falsa confiança no seu próprio conhecimento, o amor próprio e o egoismo. Nosso egoísmo deve ser quebrado. Devemos entender que somos máquinas muito complicadas e portanto esse processo de quebra está fadado a ser uma tarefa longa e difícil. Antes que o crescimento real possa tornar-se possível nossa personalidade deve morrer.
P: Será que Cristo ensinou danças?
G: Eu não estava lá para ver. É necessário distinguir entre danças e ginástica, são coisas diferentes. Nós não sabemos se seus discípulos dançavam, mas sabemos que onde Cristo teve sua formação, eles certamente ensinavam "ginásticas sagradas".
P: Existe algum valor nas cerimônias e ritos católicos?
G: Eu não estudei o ritual católico, mas conheço os rituais da Igreja grega muito bem, e neles,
sublinhando
a
forma e a cerimônia, há um significado real. Toda cerimônia, se ela continua a ser praticada sem alteração, tem valor. Os rituais são como as danças antigas que eram guias nos quais a verdade era escrita. Mas, para entender devemos ter uma chave.
As danças folclóricas antigas também tem significado, algumas até contêm coisas como receitas para fazer geléia.
Uma cerimônia é um livro em que há muita coisa escrita. Qualquer um que entenda pode lê-lo. Em uma cerimônia há mais coisas contidas do que em uma centena de livros. Normalmente, tudo muda, mas os costumes e as cerimônias podem permanecer inalterados.

P: A reencarnação das almas existe?
G: A alma é um luxo. Ninguém ainda nasceu com uma alma totalmente desenvolvida. Antes de podermos falar de reencarnação, devemos saber que tipo de homem estamos falando, que tipo de alma e que tipo de reencarnação. A alma pode disintegrar imediatamente após a morte ou pode fazê-lo depois de um certo tempo. Por exemplo, uma alma pode ser cristalizada dentro dos limites da terra e pode permanecer lá, e ainda não ser cristalizada para o sol.
P: As mulheres podem trabalhar assim como os homens?
G: Diferentes partes estão mais altamente desenvolvidas nos homens e nas mulheres. Nos homens, é a parte intelectual, a que chamaremos A; nas mulheres a parte emocional, ou B. O trabalho no Instituto é por vezes mais ao longo da linha A, e nesse caso é muito difícil para B. Em outros momentos, é mais ao longo da linha B, em cujo caso é mais difícil para A. Mas o que é essencial para a compreensão real é a fusão de A e B. Isso produz uma força que chamaremos de C.
Sim, há chances iguais para homens e para mulheres.

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Jalaluddin Rumi - Três Poemas

Penso o dia todo sobre isso, então à noite eu digo.
De onde vim e o que eu deveria estar fazendo?
Não faço a menor ideia.
Minha alma é de algum outro lugar, disso tenho certeza
E pretendo terminar lá.
Essa embriaguez começou em alguma outra taberna.
Quando retornar para aquele lugar estarei totalmente sóbrio.
Enquanto isso sou como um pássaro de outro continente,
sentado neste aviário.
Está chegando o dia em que voarei,
Mas quem é este agora em meus ouvidos que escuta a minha voz?
Que diz palavras com a minha boca?
Que olha através de meus olhos? O que é a alma?
Não consigo parar de perguntar.
Se pudesse degustar um único gole de uma resposta,
Eu poderia sair desta prisão para bêbados.
Não vim para cá por livre e espontânea vontade,
E não posso sair dessa forma.
Quem quer que tenha me trazido aqui
terá que me levar para casa.
Nesta poesia nunca sei o que vou dizer.
Eu não a planejo.
Quando estou fora de seu cantar,
Fico muito quieto e raramente digo coisa alguma.
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Há uma comunidade do espírito.

Junte-se a ela e sinta o deleite
de caminhar por uma rua barulhenta
E ser o barulho.
Beba todas as suas paixões e seja uma desgraça.
Feche os dois olhos para ver com o outro olho.

Abra suas mãos se você quer ser pego.

Sente-se neste círculo.
Deixe de agir como um lobo

e sinta o amor do pastor lhe preencher.

À noite, seu amado vagueia.
Não aceite consolações.
Feche sua boca para a comida.
Sinta a boca do amado na sua.

Você lamenta: “Ela me deixou”. “Ele me deixou”.

Vinte mais virão.
Esvazie-se de preocupações.
Pense em quem criou o pensamento!

Por que você fica na prisão

quando a porta está tão escancarada?

Saia do emaranhado de pensamentos temerosos.

Viva no silêncio.
Flua continuamente em anéis de ser sempre em expanção.

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Ouça o poeta Sanai, que viveu em reclusão:

“Não vagueie pela estrada durante seu êxtase.
Durma na taberna.”

Quando um ébrio desvia-se para as ruas

as crianças fazem piada dele.


Ele cai na lama. Ele toma toda e qualquer estrada.
As crianças seguem-no, não conhecendo o gosto do vinho
Ou como é sentir sua embriaguez.
Todas as pessoas no planeta são crianças, salvo muito poucos.
Ninguém é adulto, exceto aqueles que são livres dos desejos.

Deus disse: “O mundo é um jogo, um jogo de criança e vocês
são as crianças.”

Deus fala a verdade.
Se você não abandonou as brincadeiras de criança,
como pode ser um adulto?

Sem pureza de espírito, se você ainda está no meio da
luxúria e da ganância e de outros desejos,

você é como uma criança brincado de sexo.

Eles digladiam e se esfregam, mas isso não é sexo.

O mesmo é com as lutas da humanidade.

É uma disputa com espadas de brinquedo.
Sem propósito, totalmente fútil.

Como garotos em cavalos de passeio,

os soldados dizem estar galopando Boraq,
o cavalo noturno de Maomé, ou Duldul, sua mula.

Suas ações não significam nada,

o sexo e a guerra que você faz.

Você está segurando parte de suas calças e dançando por aí.

Não espere morrer para ver isso.

Reconheça que sua imaginação e seu pensamento
E seu senso de percepção são pedaços de cana
Que as crianças cortaram e fingem que são seus cavalos.

O saber dos amantes místicos é diferente.

As ciências empíricas, sensoriais, são como um asno
carregado de livros,
Ou como a maquiagem de uma mulher,
Ela desbota.

Mas se você levantar a bagagem da maneira certa,

ela dará alegria.

Não carregue sua carga de conhecimento
por alguma razão egoísta.

Negue seus desejos e sua teimosia,

E um monte real pode aparecer sob você.

Não se satisfaça com o nome de HU,

Com apenas palavras sobre ele.

Experimente essa respiração.

De livros e palavras vem fantasia e às vezes, da
fantasia vem a união.

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Bernard de Clairvaux - Dignidade, Conhecimento e Virtude

Você deve procurar por bens superiores na parte superior de você mesmo, isto é, na alma. Esses bens superiores são a dignidade, o conhecimento e a virtude. A dignidade de um homem é seu livre arbítrio, que é o dom através do qual ele é superior aos animais e que o faz até mesmo dominá-los. O conhecimento do homem é aquilo através do qual ele reconhece que possui essa dignidade, mas que ela não se origina nele mesmo. Sua virtude é aquilo através do qual ele busca avidamente por seu criador e, quando O encontra, mantém-se com ele com toda a sua força.

Cada um desses bens têm dois aspectos. A dignidade não é apenas um privilégio natural, é também o poder de dominação, pois todas as coisas vivas na Terra podem ser vistas como temendo os homens. O conhecimento também é duplo, pois tanto sabemos que possuímos essa dignidade e o que quer que tenhamos que é bom e sabemos que isso não se origina em nós mesmos. A virtude também pode ser vista como tendo dois aspectos. Através dela buscamos nosso Criador e quando o encontramos nos agarramos a Ele para que não possamos ser separados.
A dignidade não é nada sem o conhecimento e o conhecimento pode até mesmo ser uma pedra no caminho sem a virtude. Essa é a razão para ambas as coisas. Que glória é ter aquilo que você não sabe que tem? E saber o que você tem, mas não saber que isso não se origina com você é ter glória, mas não perante a Deus. Para aquele que glorifica a si mesmo o Apóstolo diz: “O que você tem que não tenha sido recebido? E se foi recebido, por que se vangloriar como se não houvesse sido recebido? (1 Cor. 4:7) Ele não diz simplesmente: “Por que se vangloriar?” Ele adiciona: “como se não houvesse recebido”, de modo a enfatizar que a culpa reside não em vangloriar-se de algo, mas em fazer isso como se aquilo não tivesse sido um dom que foi recebido. Esse tipo de coisa é corretamente chamada de vanglória, pois não repousa numa fundação sólida da verdade. São Paulo aponta a diferença entre a verdade: “Aquele que se vangloria vanglorie-se no Senhor”, isto é, na verdade. Pois o próprio Senhor é a Verdade.
Há duas coisas que você deveria saber: primeiro, o que você é; segundo, que você não é o que é por seu próprio poder. Então você irá vangloriar-se, mas não em vão. É dito que se você não conhece a si mesmo, você deveria ir e seguir os rebanhos de seus companheiros. Isso é o que de fato acontece. Quando um homem tem um alta honra atribuída a si, mas não a aprecia, ele é merecidamente comparado com as bestas, com as quais ele compartilha sua presente mortalidade e seu estado de corrupção.
Isso acontece também: quando um homem não aprecia o dom da razão e passa seu tempo com rebanhos de bestas irracionais; quando ele ignora a glória que está dentro dele e molda-se nas coisas externas que sua essência percebe; e quando ele é carregado de tal maneira pela curiosidade que torna-se igual a qualquer outro animal, pois ele não vê que recebeu nada mais do que os animais receberam.

Desse modo, deveríamos temer grandemente a ignorância que nos faz pensar menos de nós mesmos do que deveríamos. Mas não menos, e de fato muito mais, deveríamos temer a ignorância que nos faz pensar que somos melhores do que somos. Isso é o que ocorre quando somos enganados em pesar que algum bem em nós origina-se com nós mesmos.

Mas você deveria evitar e detestar ainda mais do que esses dois aquela presunção através da qual, totalmente ciente e deliberadamente, você ousa buscar sua própria glória em coisas boas que não são suas e que você sabe perfeitamente bem que não são suas por nenhum poder pertencente a você. Então, sem sentir vergonha, você rouba a glória de outrem. Pois a primeira ignorância não tem glória, a segunda tem uma glória, mas não aos olhos de Deus; mas esse terceiro mal que é cometido conscientemente é um ato de traição contra Deus.

Essa arrogância nascida da última ignorância é pior e mais perigosa porque, embora o segundo tipo de ignorância faça com que ignoremos a Deus, esse nos leva a desprezá-Lo. E é pior e mais repugnante do que o primeiro, porque embora o primeiro nos torne companheiros das bestas, esse nos lança na companhia de demônios. É orgulho, o maior pecado, usar os dons que lhe foram dados como se você tivesse nascido com eles e arrogar para si mesmo a glória que pertence ao generoso Doador.
Junto com estes dois (a dignidade e o conhecimento), deve ir a virtude, a qual é fruto de ambos. Através da virtude buscamos e agarramo-nos ao Doador de todas as coisas boas e damos a Ele a glória que Ele merece por tudo que Ele tem dado. Contudo aquele que sabe como fazer o que é certo e não o faz receberá muitos açoites (Luc. 12:47). Por que? Porque “ele não quis entender como se comportar bem” (Sal. 36:3). Mais do que isso, “planejou a maldade em sua cama” (Sal. 36:4). Ele intenta como um servo mal roubar e levar embora a glória do Senhor para si, a glória responsável pelas boas qualidades que ele sabe certamente que não se originaram nele mesmo, pois Deus lhe deu esse conhecimento.

É perfeitamente óbvio então que sem conhecimento a dignidade é totalmente inútil e que o conhecimento sem virtude deve ser condenado. Verdadeiramente, o homem de virtude no qual o conhecimento não é para ser condenado e cuja dignidade não é infrutífera, clama a Deus e livremente confessa: “Não a nós, Senhor, mas sim ao Seu Nome seja a glória. (Sal. 115:1) Isto é, não creditamos a nós mesmos nenhum conhecimento ou dignidade, atribuímos tudo a Seu nome, pois isso vêm tudo de Você.”

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Meher Baba - O Caminho do Amor

Deus como Verdade


Em última análise, cada um e cada coisa é Deus. E esse Deus como a verdade pode ser realizado por meio de um Guru ou de um Mestre. Geralmente, neste país, o Vedantismo está associado a esta realização do Altíssimo. Porém, agora não estou preocupado com o Vedantismo, com o Sufismo ou qualquer outro "ismo", mas somente com Deus como a Verdade, em como Ele entra em nossa experiência após o desaparecimento da mente-ego limitada e limitante. Deus é uma Verdade inabalável e eterna. Ele se comunica e revela a Si memso para aqueles que amam-No, que buscam-No e que se entregam a Ele, tanto em seu aspecto impessoal que está além de forma, nome e tempo, ou em Seu aspecto pessoal. Ele é mais facilmente acessível ao homem comum através dos homens-Deus, que sempre vêm e sempre virão para transmitir luz e verdade para a sofrida humanidade, a qual em sua maioria está tateando no escuro.
Por causa de sua completa união com Deus, o homem-Deus desfruta eternamente do estado "eu-sou-Deus",
que também corresponde ao termo Vedanta Aham Brahmasmi e ao termo Sufi Anal-Haq ou à declaração de Cristo: "Eu e meu Pai somos um." Na experiência dos Sufis, Anal-Haq, ou o estado "eu-sou-Deus", é a culminação de Hama-Oost, que significa que tudo é Deus e nada mais existe. E uma vez que nesta abordagem só “Deus sem um segundo" é contemplado, não há espaço para o amor por Deus ou o anseio por Deus. A alma tem a convicção intelectual de que ela é Deus. Mas para realmente experimentar esse estado, ela passa por uma intensa concentração ou meditação sobre esse pensamento. "Eu não sou o corpo, não sou a mente, não sou isto nem aquilo, eu sou Deus." A alma, em seguida, experimenta através da meditação aquilo que ela assumiu ser ela mesma. Mas essa maneira de experimentar Deus não é apenas difícil, mas é também seca.
O Caminho é mais realista e alegre quando há um amplo jogo de amor e devoção a Deus, quando postula a
separação temporária e aparente de Deus e o desejo de unir-se a Ele. Tal separação aparente e provisória
de Deusé afirmada pela alma nas duas concepções da tradição Sufi: Hamaaz Oost, que significa que tudo é de Deus e Hama Doost, que significa que tudo é para o Amado Deus. Em ambas as concepções a alma percebe que sua separação de Deus é apenas temporária e aparente e ela busca restaurar essa unidade perdida com Deus através de um intenso amor que consome toda a dualidade. A única diferença entre esses dois estados é que enquanto a alma, no estado de HamaDoost, contenta-se com a Vontade de Deus como o Bem-Amado, no estado de Hama az Oost, a alma não anseia por nada além da união com Deus.
Sendo que a alma, que está em aprisionamento, pode ser resgatada somente através do Amor Divino, até
mesmo os Mestres Perfeitos, os quais alcançam a completa unidade com Deus e experimentam-no como a única Realidade, muitas vezes, aparentemente, entram no domínio da dualidade e falam a linguagem do amor, da adoração e do serviço a Deus em Seu Ser não-manifesto bem como em todas as inumeráveis formas ​​através das quais Ele se manifesta.
O Amor Divino, como cantado por santos hindus como Tukaram, como ensinado por místicos Cristãos como São Francisco, como pregado por santos Zoroastristas comoAzer Kaivan e tornado imortal por poetas sufis como Hafiz, nunca abriga nenhum pensamento autocentrado. Ele consome todos os desejos e fraquezas que nutrem a servidão e a ilusão da dualidade. Por fim, ele une a alma a Deus, trazendo assim para a alma o verdadeiro autoconhecimento, a felicidade duradoura, a paz inatacável, a compreensão sem fronteiras e o poder ilimitado. Sejam vocês os herdeiros dessa vida eterna que vem para aqueles que buscam!


Deus como a Bem-aventurança

Em todos os lugares, em todos os estilos de vida, o homem, sem exceção, tem sede de felicidade. Ele tenta saciá-la nas diversas seduções da vida sensual e nas muitas posses e conquistas que alimentam e agradam o ego, bem como também nas inumeráveis experiênciasque estimulam o intelecto, que excitam a mente, acalmam o coração ou energizam o espírito. De tudo isso, o que ele procura é a felicidade de diversos tipos. Mas ele procura-a no mundo da dualidade e nas sombras passageiras da Ilusão de Maya, a qual chamamos de universo. E ele descobre que a felicidade que consegue ali é tão passageira que quase desaparece no próprio momento da experiência. E depois que desaparece, o que resta é um vazio sem fundo que nenhuma multiplicação de experiências similares jamais poderá preencher completamente. Mas a verdadeira bem-aventurança só pode vir para alguém que tenha em suas mãos a coragem de se tornar livre de todo apego às formas, que por sua vez não são nada além de ilusões da dualidade. Só então ele pode ser unido com seu verdadeiro Amado, que é Deus como a Verdade eterna e permanente por trás de todas as formas, incluindo o que ele considera como sendo seu próprio corpo.
O infinito e insondável oceano da Bem-aventurança está dentro de todos. Não há nenhum indivíduo inteiramente desprovido de felicidade de alguma forma, pois não há nenhum indivíduo que esteja totalmente separado de Deus como o Oceano da Bem-aventurança. Cada tipo de prazer que ele já teve é em última instância um reflexo parcial e ilusório de Deus como Ananda (bem-aventurança). Mas o prazer que é procurado e experimentado na ignorância, finalmente aprisiona a alma numa continuação interminável da falsa vida do ego e deixa a alma exposta aos muitos sofrimentos da vida egóica. Os prazeres do mundo ilusório são comparáveis ​​aos muitos rios de miragem que aparentemente derramam-se no oceano. A felicidade divina é semrpe nova, eterna, contínua e é infinitamente experimentada como a alegria autosustentável e infinita de Deus.

Unam-se ao seu verdadeiro Amado, o qual é Deus na forma de Ananda ou Bem-aventurança!

Deus

Na fase sub-humana, a consciência do falso serou do falso "eu", que é muito leve, oferece possibilidades
de evolução. Na forma humana, a evolução da consciência é completada e a consciência torna-se plena. O
amor entra em cena ativamente pela primeira vez. Quando o amor desempenha o papel de forma mais ativa e plena, o falso "eu" passa a ser cada vez e mais consumido. Eventualmente, quando o amor está em seu apogeu, o falso "eu" é totalmente consumido pelo amor, o que resulta na consumação do amante e do amor no altar do Amado. Nem o amante permanece no amor, nem o amor reina soberano sobre o amante: o objetivo é atingido. O Amado é supremo sobre seu ser: não há nada exceto o Amado: todo o resto é consumido.


A respeito de ser o Avatar

Quando digo que sou o Avatar, há alguns que se sentem felizes, alguns que se sentem chocados e muitos que, ao me ouvirem afirmar isso, consideram-me como um hipócrita, uma fraude, um egoísta supremo, ou simplesmente um louco. Se eu dissesse que cada um de vocês é um Avatar, alguns ficariam contentes e muitos considerariam uma blasfêmia ou uma piada. O fato é que sendo Deus Um, indivisível e estando igualmente em todos nós, não podemos ser nada mais além de um, porém é demais para a mente consciente da dualidade aceitar isso. No entanto, cada um de nós é o que o outro é. Sei que eu sou o Avatar em todos os sentidos da palavra e sei que cada um de vocês é um Avatar em um sentido ou outro. É um fato inalterável e universalmente reconhecido desde tempos imemoriais que Deus sabe tudo, Deus faz tudo e que nada acontece senão pela vontade de Deus. Portanto, é Deus que me faz dizer que eu sou o Avatar e que cada um de vocês é um Avatar. Novamente, é Ele que é alegrado através de alguns e que através de outros fica chocado. É Deus que age e é Deus que reage. É Ele quem zomba e aquele que responde. Ele é o Criador, o Produtor, o Ator e a Platéia na Sua própria peça Divina.


A respeito de manter silêncio*

Se você me perguntasse por que eu não falo, eu diria que não estou em silêncio e que eu falo mais eloquentemente através de gestos e da tábua do alfabeto. Se você me perguntasse por que eu não falo, eu diria que talvez por três razões: em primeiro lugar, sinto que através de todos vocês eu estou falando eternamente. Em segundo lugar, para aliviar o tédio de falar incessantemente através de suas formas eu mantenho silêncio em minha forma física pessoal. E em terceiro lugar, porque toda a conversa é em si conversa fiada. Palestras, mensagens, declarações, discursos de qualquer natureza, espirituais ou não, transmitidos através declarações ou escritos, são apenas conversa fiada quando não se age em conformidade ou se vive aquilo. Se você perguntar quando irei quebrar meu silêncio, direi que será quando eu quiser proferir a única Palavra real que foi falada no princípio sem começo, pois essa Palavra apenas é digna de ser proferida. O momento de quebrar o meu silêncio externo para proferir essa Palavra está muito próximo.

* Meher Baba guardou silêncio por 44 anos

quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Hafiz - Seis Poemas


Quanto mais perto chego de você, Amado,
mais consigo ver que somos apenas Você e eu neste Mundo.

Escuto baterem na minha porta,
quem mais poderia ser?

Então corro para abrir sem pentear meus cabelos.

Por noites de mais tenho implorado pelo Seu retorno;

de que serve a vaidade a esta hora da noite,

nesta estação divina

que chegou a mim aqui de joelhos?

Se Suas cartas de amor são verdadeiras, querido Deus,

Irei me render àquele que Você continua dizendo que

Eu Sou.

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Admita algo:

Você diz a todos que vê:

“me ame”

É claro que você não diz isso em voz alta,
Senão alguém chamaria a polícia.

Ainda assim, pense sobre isso:

Esse grande impulso em nós de estabelecer conexões.

Por que não se transformar naquele
que vive com uma lua cheia em cada olho,
que está sempre dizendo com aquela doce
linguagem lunar,
aquilo que todos os outros olhos deste Mundo
estão ansiosos por ouvir.
___________________

Quem pode acreditar na gentileza divina de Deus?

Quem pode compreender o que acontece
quando a separação chega ao fim?

Agora, por causa de minha união com a Realidade,
quando quer que ouço uma história de um de Seus Profetas
que vieram para este Mundo,
sei que eu era uma árvore que ficava ali perto,
que se reclinava e fazia anotações.

Sei que eu era a terra que media o infinito arco de Seus pés.

Sei que eu era a comida e a água que Lhe nutriam.
A comida e a água que entravam na boca do Amado.

Peregrino, se for o seu desejo,
um dia você verá que você estava sentado dentro de Hafiz
E que foi com o alaúde que você me deu que nós cantávamos
sobre a verdade e a intimidade sublime:

Sei que eu era a água que saciou a sede de Cristo.
Sei que Eu Sou a comida e a água que entram em cada boca."

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Há uma ascensão do abraço da luz

que você pode ver num campo do verão

ou na dança de uma criança.

Cada cidade é uma lira

que toca seus acordes contra nossos ouvidos.

A tampa de uma panela começa a pular

quando a água fica em êxtase por causa do fogo.


Se eu jamais completo uma frase quando estamos juntos,
aceite minhas desculpas e tente compreender
esse doce pensamento inebriado.

No início, os pássaros não tinham o desejo de voar.

O que realmente aconteceu foi isto:

Certa vez Deus sentou-se perto deles tocando música.
Quando Ele partiu, eles sentiram tanto a Sua falta
que seu anseio fez asas brotarem neles,
necessitando vasculhar os céus.

Ouça, Hafiz sabe que nada nos evolui mais do que o Amor.

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Alguns poetas tem tanta habilidade para falar sobre Deus
sem jamais usar nenhum de Seus pseudônimos.

Alguns tem tal habilidade
que você nem precisa ir até o rio com o seu balde.

Com o magnetismo das palavras,
eles podem adular Vênus
para fazê-lo sair de sua órbita primal
e roubar de sua boca aquela milagrosa gota de orvalho
que ele coletou em suas veias desde que o tempo disse:
“Eu Sou.”

Usarei todos os trajes comuns da língua
se isso servir para conquistar a sua amizade.

Vou me transformar numa planta da floresta
se você aplicar-me sobre suas feridas.

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Aborrecido?
Então fique comigo, pois eu não estou.

Solitário?
Milhares de seres apaixonados e nus

habitam as cavernas antigas debaixo de minhas pálpebras.

Riquezas?
Tome aqui um punhado,
todo meu corpo é uma esmeralda que implora:

“Leve-me!”

Escreva tudo o que lhe preocupa num pedaço de pergaminho,

Ofereça-o para Deus.

Mesmo de uma distância de um milênio

posso inclinar a chama de meu coração na sua vida

e transformar tudo o que lhe amedronta

na cinza sagrada de um incenso.