quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Nisargadatta Maharaj - 25 de janeiro de 1980 / 28 de janeiro de 1980

Se obtivermos e saborearmos o néctar dos pés do Senhor, o charan-amrita, a mente poderá ser conquistada. Isso significa que a mente não vai mais ter domínio sobre nós. Seu domínio imposto sobre nós desde a infância não irá mais nos oprimir. Isso é chamado de manojaya – vitória sobre a mente. Mas isso torna-se possível apenas através da Graça Dele. Sem a Graça, não podemos saborear o néctar. Entretanto, apenas um devoto verdadeiro, um bhakta, um deus, pode obter o charan-amrita. Mas quem e o que é esse devoto? Ele não é nada além da consciência, o sentido de ser, o conhecimento de que “nós somos”, que apareceu inconsciente e espontaneamente em nós. A consciência é o charan-amrita, o néctar dos pés do Senhor.

O cosmos inteiro em seu vibrante movimento ativo é representado pela consciência, os pés do Senhor, e o universo é o corpo da consciência. Mas qual é sua relação com todos os seres? Ela reside no âmago de todos os seres como o conhecimento “eu sou”, o amor de “ser”, o charan-amrita.

Aquele que bebe o néctar dos pés do Senhor é um verdadeiro devoto. Ele habita no conhecimento “eu sou”. Ele é divino. Então, quando a pessoa saboreia continuamente esse néctar ao testemunhar a consciência ou o sentido de ser, a sua mente - que diferencia e avalia as pessoas observadas como masculinas e femininas, ela gradualmente remove a si mesma do foco de atenção, deixando a consciência em sua glória inata.
Mas como tal estado pode ser alcançado? Apenas se aceitarmos totalmente o conhecimento “eu sou” como sendo nós mesmos com total convicção e fé, e se firmemente acreditarmos no dito: "eu sou aquilo pelo qual eu sei que 'eu sou'”. Esse conhecimento “eu sou” é o charan-amrita. Por que é chamado de Amrita – o néctar? Porque é dito que, ao beber néctar a pessoa torna-se imortal. Portanto, um devoto real, ao habitar neste conhecimento “eu sou” transcende a experiência da morte e atinge a imortalidade. Mas enquanto a mente permanecer não conquistada, a experiência da morte será inevitável.
Embora meus discursos continuem sem parar com os muitos visitantes, meu ponto de vista permanece inalterado. Por que? Porque meu ponto de vista está estabilizado no charan-amrita. Ele permanece fixo na consciência - a fonte dos conceitos e linguagens. Dela emana a linguagem desde sua formação mais sutil até a sua expressão mais grosseira, vocal, como para, pashyanti, madhyama, e vaikhari*.
Se você pudesse apenas abandonar todos os outros esforços espirituais e disciplinas e absorver-se em saborear o charan-amrita, através da permanência na consciência, a mente libertaria você de suas garras. Atualmente, você aceita gentilmente o que quer que a mente dita como sendo de você mesmo. Se a mente for silenciada, onde fica você e o que você é?
Uma vez que você afundar dentro da consciência, o fatual estado da Realidade será revelado a você com o conhecimento que irá emanar intuitivamente de você, como uma fonte de água. Isso irá capacitá-lo a discernir não apenas o que é real e o que é irreal, mas, mais importante, a realizar o que “eu sou”.
O que sou eu para mim apenas? O que é a vida? Uma vez que essas questões são resolvidas intuitivamente e a realidade emerge, a mente não pode mais predominar. Entretanto, o funcionamento da mente continuará, mas a qualidade do funcionamento será totalmente diferente. Alguém que atingiu tal estado, permanece não afetado por qualquer acontecimento, visto que as balbúrdias da mente não podem ter efeito. E quem poderia ser essa pessoa? Certamente não um indivíduo que esteja aprisionado na concha da mente. Mas essa pessoa é o conhecimento “eu sou” - a consciência.
É dito que devemos quebrar as algemas que nos prendem ao corpo e ao mundo. O que isso significa? O que quer que seja visto e percebido está no nível do corpo e do mundo. Um apego é desenvolvido com os objetos percebidos, e então nós nos identificamos com um corpo como sendo nós mesmos e clamamos os objetos como sendo de nossa propriedade. O apego é a natureza da mente, e ela obstinadamente persiste nesses apegos. Mas se você beber o charan-amrita ao se estabilizar na consciência, tudo será resolvido e você será iluminado. Você não precisa ir a ninguém para esclarecer suas dúvidas.
Enquanto faço minhas tarefas e canto bhajans em louvor a Deus e assim por diante, para vocês eu pareço estar profundamente envolvido nessas atividades. Mas na verdade eu permaneço aparte de mim mesmo, desprovido do sentido do corpo e da mente, e assim testemunhando as atividades acontecerem a Mim. Pergunto-me se vocês notaram isso! Muitas pessoas estão relacionadas a mim de uma maneira ou de outra. Embora aparentemente eu tenha intimidade com elas, estou aparte delas. Quanto a mim, eu realizei completamente o que “eu sou”, e agora está absolutamente claro para mim o que e como “eu sou”. Mas o que essas pessoas pensam que “elas são”, apenas elas sabem. Elas presumem terem adquirido conhecimento, terem alcançado algum status espiritual superior ao das outras pessoas … e assim por diante. Isso está fadado a acontecer, pois eles ainda são escravos de suas mentes. No meu caso, isso não pode acontecer. Eu me embebi totalmente do néctar dos pés do Senhor – a consciência.
Atualmente, todas as comunicações e funções acontecem por meio deste néctar – a consciência. E o que é esse meio? É o conhecimento “eu sou”. Ele é representado pelo Senhor Vishnu, o Deus mais elevado que recosta-se cheio de bem-aventurança no corpo da serpente, sheshashayi, e por isso é chamado de Sheshashayi-Bhagavan.
Bem, é bom ter conversas desse tipo, mas embeber e realizar a essência é muito difícil, de fato. Por que? Porque você acredita firmemente que você é o corpo e vive de acordo, enquanto alimenta desejos apaixonados de que você vai conquistar algo bom no mundo, e mais tarde algo ainda melhor. Essas expectativas estão baseadas primeiramente numa noção errônea de que você é o corpo. Essa identificação errada, entretanto, dissolve-se no néctar dos pés do Senhor, quando você se afunda na consciência e perde sua individualidade.
A dissolução da individualidade não é possível sem devoção ao mestre – guru-bhakti – que em outras palavras novamente é a consciência, o guru-charan-amrita. A permanência na consciência remove todos os problemas passados e futuros e estabiliza a pessoa no presente – Aqui e Agora.
A consciência é o sentido de se estar ciente, “eu sou” sem palavras, e ela apareceu inconscientemente e sem ser solicitada. Ela é a força vital universal manifesta e, portanto, não pode ser individualista. Ela se estende dentro e fora, como o brilho de um diamante. Você vê um mundo de sonhos dentro de você e um mundo perceptível fora de você, previsto que a consciência prevalece. Do nível do corpo, você pode dizer dentro e fora do corpo, mas do ponto de vista da consciência, onde e o que é dentro e fora? Apenas no reino do sentido de estar ciente “eu sou” - a consciência – pode o mundo existir, e também uma experiência pode existir.
Segure-se neste sentido de estar ciente “eu sou”, e a fonte do conhecimento irá nascer dentro de você, revelando o mistério do Universo, do seu corpo e psiquê, da interação dos cinco elementos, dos três gunas e prakriti-purusha; e de tudo o mais. No processo dessa revelação, sua personalidade individualista confinada ao corpo se expandirá no universo manifestado e será realizado que você permeia e abarca o cosmos todo como seu “corpo” apenas. Isso é conhecido como o “Puro Super-Conhecimento” - shuddhavijnana.
Não obstante, mesmo no estado sublime shuddhavijnana, a mente se recusa a acreditar que ela é uma não-entidade. Mas conforme afundarmos na consciência, desenvolveremos uma firme convicção de que o conhecimento “eu sou” - o sentido do seu ser – é a própria fonte do mundo. Apenas esse conhecimento faz você sentir que “você é” e que o mundo é. Na verdade, esse conhecimento manifesto, tendo ocupado e permeado o cosmos, reside em você como o conhecimento “você é”. Segure-se a esse conhecimento. Não tente dar-lhe um nome ou um título.
Agora chegando numa situação muito sutil: o que é isso em você que entende esse conhecimento “eu sou” - ou do seu ponto de vista “eu sou”, sem nome, título ou palavra? Afunde-se no centro mais íntimo e testemunhe o conhecimento “eu sou” e apenas Seja. Essa é a “bênção do ser” - o swarupananda.
Você deriva prazer e felicidade através da ajuda de vários auxílios e processos externos. Alguns gostam de apreciar uma boa comida, alguns gostam de ver um filme, alguns ficam absorvidos na música … e assim por diante. Para todas essas apreciações alguns fatores externos são essenciais. Mas para residir na “bênção do ser”, absolutamente nenhuma ajuda externa é requerida. Para entender isso, tome o exemplo do sono profundo. Uma vez que você esteja em sono profundo, nenhuma ajuda ou tratamento serão requeridos e você aprecia uma felicidade silenciosa. Por que? Porque nesse estado a identidade com um corpo masculino ou feminino é esquecida totalmente.
Alguns visitantes me perguntam, “Por favor mostre-nos o caminho que nos levará à Realidade”. Como eu poderia? Todos os caminhos levam à irrealidade. Caminhos são criações dentro do escopo do conhecimento. Portanto, caminhos e movimentos não podem transportá-lo para a Realidade, pois a função deles é enredar você dentro da dimensão do conhecimento, enquanto que a Realidade prevalece antes dessa dimensão. Para compreender isso, você deve fixar-se na fonte da sua criação, no início do conhecimento “eu sou”. Enquanto não atingir isso, você estará enrolado nas correntes forjadas por sua mente e ficará enredado nas correntes das outras pessoas. Portanto, eu repito, você se estabiliza na fonte do seu ser e então todas as correntes irão se romper e você será liberado. Você irá transcender o tempo, estará além dos tentáculos dele e prevalecerá na Eternidade. E esse estado sublime pode ser atingido apenas ao beber incessantemente o néctar dos pés sagrados do guru – o guru-charan-amrita. Esse estado de beatitude extática – o ser afundando-se abençoadamente no Ser. Esse êxtase está além das palavras, ele é também o estado de estar ciente em total quietude.
A quintessência do discurso está clara. Sua posse mais importante é o “conhecimento” que “você é” anterior à emanação da mente. Segure-se a esse “conhecimento” e medite. Nada é superior a isso, nem mesmo a devoção ao guru – guru bakti – ou a devoção a Deus – Iswara bhakti.

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28 de janeiro de 1980

Maharaj: Visto da terra, o sol parece nascer e se pôr. Mas do ponto de vista do sol, ele brilha continuamente e não tem conhecimento de nascer e se pôr. Enquanto o sentido de ser e sua manifestação, incluindo-se as atividades dentro dela, são temporárias e limitadas ao tempo, aquilo que é anterior ao sentido de ser é eterno. Você é um estudante do Bhagavad-Gita, o que eu digo está de acordo com o Gita?

Visitante: Após escutar seus discursos pude compreender claramente o décimo quinto capítulo do Gita, onde é feito uma menção ao Purushottama.

M: Purushottama é o Absoluto, o Eterno. Ao mesmo tempo o Absoluto é sem nenhum suporte externo, sendo totalmente auto-suficiente, ele em si é o suporte de todas as coisas manifestas.

V: Krishna disse: “Apenas aqueles que compreendem que Eu, o Absoluto, estou além dos estados de Ser e de não-Ser realizam minha verdadeira natureza, e todos os outros são tolos.”

M: Aqueles que são criados de uma ação estúpida também são estúpidos.

V: O que quer que um Jnani fale, é conhecimento espiritual e mesmo seu comportamento revela conhecimento.

M: Na verdade, todo nosso comportamento é de qualidade sattva-guna, expressado da essência da comida e não é nem seu nem meu. O sattva-guna tem três estados, vigília, sono profundo e sentido de ser (beingness). Quando o conhecimento é entendido corretamente a pessoa é puro Brahman apenas, embora tenha a forma de um corpo. Não tem modificação mental. Isso é o que Krishna disse.

O corpo é um produto da essência da comida. Todas as plantas, raízes, árvores, animais, etc., são criados de sementes, e uma semente (bija) significa recriar uma forma prévia. Uma semente também é um produto do sattva-guna. De uma semente brota uma planta e depois uma grande árvore, mas a fonte é a semente apenas. Também de uma semente humana, a qual é o produto dos três gunas (sattva, rajas e tamas) e a essência da comida, brota o corpo, o sentido de ser e a manifestação. Isso pode ser percebido apenas por um ser humano.

Tendo entendido isso, eu realizei Brahman embora tendo a forma de um corpo. Raramente, alguém se embebe desta sabedoria. Muitos adquirem o assim chamado 'conhecimento', mas o que quer que seja adquirido não é conhecimento verdadeiro.

V: O sentido de ser, ou o conhecimento “eu sou”, é então o verdadeiro conhecimento final?

M: Esse verdadeiro conhecimento, o conhecimento "eu sou", também é rendido ao status de não-conhecimento no estado Absoluto final. Quando a pessoa está estabelecida em seu estado final livre, o conhecimento 'eu sou' torna-se “não-conhecimento”.

Quando você vê uma árvore florida você olha apenas para a folhagem, mas não pensa na raiz e na semente da qual ela brotou. A menos que você entenda a semente também, não haverá compreensão total. No presente momento você entende a si como sendo um corpo, mas você não inclui no entendimento a fonte e a semente da qual este corpo manifestou-se. Uma pontinha de uma caneta tinteiro molhada com tinta escreve volume após volume. A pontinha da caneta é a fonte de todos os escritos. Similarmente, o seu sentido de ser é a fonte e o início do seu mundo inteiro. O material escrito é facilmente observado e lido, mas a fonte dele – a ponta da caneta, que é quase sem dimensão – não é percebida facilmente. Assim também é a “semente-sentido de ser”, que é sem forma, muito elusiva.

Você não se identifica com o seu sentido de ser, mas você é rápido ao identificar-se com a forma visível do seu corpo. Você se refere à forma como “eu” em vez do sentido de ser. Entretanto, para a sustentação do sentido de ser, um corpo é essencial. Mesmo se o Senhor Krishna fosse reincarnar novamente, ele poderia fazer isso apenas pelo intermédio da semente-sentido de ser, que por sua vez seria um produto de um corpo proveniente da essência da comida. (food-essence body) Não apenas Krishna, mas também Cristo e Buda manifestaram-se apenas através do sentido de ser da essência-comida. Mas você sabe o significado de Buda, o bodhisattva?

V: Buda significa a natureza inata de todos nós.

M: E quando você foi iniciado, qual foi a forma da iniciação e no que você foi iniciado?

V: Fui levado para a ordem dos Santos Sangh, como um monge, que trabalhava para a felicidade total...

M: Não me diga tudo isso. Disha (iniciação) significa “apenas seja”, de maneira alerta “Seja o que você é”. Qual conselho foi-lhe dado na época da sua iniciação?

V: Para observar meu corpo-mente.

M: De que ponto de vista ou identidade você observou?

V: Não observei meu corpo de nenhum ponto de vista, havia apenas a observação.

M: Quando você não conhece a si mesmo, então quem está observando? E como isso acontece?

V: O objeto da minha observação surge no observador. Através do objeto constituído pelo pensamento – emoção e corpo, há um sentido de ser. Eu podia observar esse sentido de ser. Vi muito claramente que não há nada de substancial dentro deste processo corpo-mente.

M: Como foi-lhe pedido para estar alerta à época da sua iniciação?

V: O tempo todo.

M: Mas com que identidade você deveria estar alerta?

V: Eles não me falaram a respeito de nenhuma identidade. Falaram para eu ficar apenas alerta.

M: Para quem eles disseram? Eles não deveriam indicar o que a testemunha deveria parecer?

V: Não.

M: Esse é um tipo inferior de iniciação. Primeiro reconheça o princípio residente, o conhecimento “eu sou” ou o “auto-amor real”, que está testemunhando. O testemunhar acontece para esse princípio. Quando existe dor, espontaneamente eu testemunho a dor que estou experimentando.

V: Parece haver um sentido de separação entre eu mesmo e o objeto que está sendo testemunhado. Então quando eu testemunho …

M: Mas quando você testemunha?

V: Quando testemunho o corpo-mente, sinto estar separado do corpo-mente.

M: Para quem o testemunho acontece?

V: Isso eu não sei.

M: Então que tipo de espiritualidade você pratica?

V: Embora eu use um roupão, não sigo nenhuma avenida particular de espiritualidade ou nenhuma ordem. Apenas tento estar ciente de que eu sou.

M: Para todos os seres é a mesma experiência. De manhã cedo, imediatamente após acordar, apenas o sentimento “eu sou” é sentido dentro ou o sentido de ser acontece, e depois acontece o testemunho seguinte de todas as coisas. O primeiro testemunho é aquele do “eu sou “. Esse testemunho primário é o pré-requisito para todos os outros testemunhos. Mas para quem o processo de testemunhar está acontecendo? Para aquele que sempre é, mesmo sem acordar, o testemunho do estado desperto acontece para aquele substrato sempre-presente. O mistério da experiência do mundo está neste ponto. O conhecimento esotérico da 'semente-sentido de ser' também está aqui. Agora você acordou e o testemunho do despertar acontece. O testemunho primário é da minha própria presença, da minha existência. Esse estado desperto ou o sentido de existência, é um estado temporário, sendo um dos três estados – de sono profundo, vigília e sentido de estar ciente que juntos constituem o sentido de ser (beingness). Esse sentido de ser é como aquela qualidade da pontinha molhada da caneta. O agregado desses três é a energia sutil representada pelos princípios masculino e feminino, chamado purushaprakriti. Nesse sentido de ser, o sattva-guna, é o visva-sutra, brahma-sutra, atma-sutra*. Nesse sentido de ser reside a manifestação universal. Esse sattva-guna é o cordão pelo qual Brahman e o universo manifesto estão amarrados.

V: Uma pergunta que eu gostaria de ….

M: Que perguntas você poderia ter sobre esse assunto?

O próprio foco dessa pontinha da caneta molhada assumiu múltiplas formas. Esse sentido de ser é conhecido como sattva-shakti e prakriti-purushashakti. O sattva-guna que deu origem a esse sentido de ser é o produto da essência dos pais que pertence à espécie do vachaspati*. Essa própria essência assumiu forma e o universo é revelado em seu interior e exterior. Entenda claramente a fonte. É como uma pequenina semente de uma árvore banyan crescendo numa magnífica árvore e ocupando um grande espaço; mas quem é esse que ocupa o espaço? É o poder da pequena semente. Similarmente, entenda que é essa emissão quintessencial dos pais que leva o toque do “sentido de eu sou”, que se manifesta num universo. Portanto, vá nessa fonte e entenda-a completamente. Assim como a semente carrega a forma latente da planta, também a semente dos pais carrega a forma latente do masculino ou feminino na imagem dos pais.

Pai e mãe são também uma expressão do sattva-guna, o princípio quintessencial apenas. Como um resultado da fricção, a emissão aconteceu. Essa emissão tendo tirado a foto dos pais, cresce numa criança na imagem dos pais. Antes do seu nascimento, onde estava o seu sentido de ser repousando dormente? Ele não era a quintessência dos pais? Esse não é o eterno drama da reprodução de todas as espécies através do princípio sattva e a energia denotada por purushaprakriti?

V: Esse toque de “sentido de eu sou” em si não é nada pessoal, ele é pessoal apenas quando ligado com o corpo e mente.

M: Esse toque de “sentido de eu sou” é o manifesto apenas e não é individualista.

V: Você falou sobre o estado do “Eu-amor”. Se eu digo que amo alguém, significa realmente o “sentido de eu sou” daqui deste ponto reconhecendo o “sentido de eu sou” naquele outro ponto.

M: Não existe 'outro' de maneira nenhuma com quem fazer amor. Apenas o “amor de ser” brotou. Para sustentar o estado de “amor por ser” você passa por uma porção de dificuldades e adversidades. Apenas para manter o estado feliz e satisfeito você se envolve em tantas atividades.

V: O sofrimento é direcionar a atenção para algo além do estado “Eu-amor”, mas se tudo isso pretende perpetuar o “sentido de eu sou”, não é um desejo?

M: Isso não é desejo, é a própria natureza de ser do “sentido de eu sou”. O sentido de ser quer ser e quer perpetuar-se. Essa é sua própria natureza; isso não é a natureza do indivíduo.

V: Mesmo quando ele está ligado com o corpo-mente?

M: Um número de mentes e corpos são formados desse princípio. Ele é a fonte da criação. Milhões de espécies são criadas desse princípio básico. Ele é moolamaya, a semente-ilusão.

V: O “eu sou” está criando você?

M: Do meu 'sentido de ser' (beinness) são criados os três mundos. No meu mundo de sonho milhões de vermes, seres humanos, etc. são criados. Quando e de onde esse mundo-sonho emergiu? Ele emergiu do aparente despertar no estado de sonho.

V: Se eu fecho meus olhos, isso significa que você não existe?

M: Quem lhe falou que seus olhos estão fechados?

V: Meu “sentido de eu sou”.

M: Quando você fechou seus olhos a consciência também foi fechada?

V: Não.

M: Como um resultado da união do amor dos objetos encarnados chamados pais, você é o lembrete que você é a criação resultante do momento bem-aventurado deles. A memória “eu sou”, lembra do momento bem-aventurado. Esta forma, a pessoa encarnada, é um lembrete da bem-aventurança. Você coletou um monte de conhecimento e se considera pronto para ser um guru e então irá expor o conhecimento – isto é, o conhecimento coletado e não o conhecimento revelado de você mesmo. O conhecimento não foi totalmente revelado a vocês, vocês não realizaram a si mesmos, e portanto, serão pseudo-gurus. Sua existência estava numa condição dormente no seu pai e sua mãe. Agora você quer prosseguir para algum lugar daqui. De onde você surgiu? Vá para a fonte da qual você emergiu. Esteja lá primeiro. Alguém teve a diversão da bem-aventurança e Eu sofro e choro por uma centena de anos.

V: É correto comparar o “sentido de eu sou” (I-am-ness) à uma sala com duas portas? De um lado você vê o mundo, e do outro você percebe Parabrahman.

M: Não existem portas para Parabrahman, filho querido. Olhe para a porta de onde você emergiu. Antes de emergir daquela porta, como e onde estava você? Você pode colocar perguntas relacionadas a esse assunto.

V: Há amor e sofrimento também neste “eu sou”.

M: A causa é a felicidade, e o resultado é o “sentido de eu sou”. A causa é bem-aventurança, mas o resultado tem que sofrer do início até o fim.

V: Naquele momento passageiro há consciência do amor e do sofrimento simultaneamente?

M: Tudo aquilo que prevalece no cosmos no momento do amor é registrado no resultado, e, acidentalmente, o resultado assume uma forma, ele é uma réplica dos pais. Seu nascimento significa um filme do universo naquele período. Não é meramente um nascimento, está carregado com o universo dentro e fora.

V: Uma vez que você nasça, a consciência é contínua, mas na meditação ela vem e vai.

M: O sentido de ser é contínuo e ele conhece a si mesmo apenas com o auxílio de uma forma, do corpo, enquanto que sem isso (ou seja, no estado absoluto), ele não conhece a si mesmo. Quem é a testemunha das idas e vindas da consciência?

V: Apenas a ciência (awareness).

M: O que você diz está correto num sentido, mas na verdade não é assim. É como dizer que eu prometo lhe dar dez mil rúpias, mas … A ciência (estado de estar ciente) é o estado Parabrahman, mas isso é apenas uma palavra; você tem de residir nesse estado. Atualmente, o “eu sou” está no estado do sentido de ser. Mas quando eu não tenho a consciência da ilusão “eu sou”, então o estado Poornabrahman ou Parabrahman prevalece. Na ausênsia do toque do “sentido de eu sou”, sou o total estado completo Poornabrahman, o estado permanente.

A fronteira do sentido de ser e do sentido de não-ser é uma hesitação do intelecto, pois o intelecto afasta-se de vista precisamente naquele ponto. Essa fronteira é o maha-yoga.

Na frase “você e eu”, uma vez que a conjunção 'e' é removida, não existe dualidade – isto é, não há separação de “você” e “eu”. Similarmente, esse sentido de ser é como a conjunção: quando ele é removido, nenhuma dualidade permanece. Você deve ficar naquela fronteira, naquele estado maha-yoga.