quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Bhagavan Sri Ramana Maharshi - Nan Yar? (Quem sou eu?)

1. Quem sou eu?
O corpo grosseiro, que é composto dos sete humores (dhatus), não sou eu; os cinco órgãos de cognição sensitiva, ou seja: os sentidos de ouvir, tocar, ver, saborear, e cheirar, que apreendem seus respectivos objetos, ou seja: som, toque, cor, sabor, e odor, não sou eu; os cinco órgãos sensoriais cognitivos, ou seja: os órgãos da fala, locomoção, compreensão, excreção e procriação, que têm como suas respectivas funções aquelas de falar, movimentar, compreender, excretar, e desfrutar, não sou eu; as cinco respirações vitais, prana, aprana, vyana, udana e samana; que atuam respectivamente nas cinco funções do inspirar, expirar, etc... não sou eu; mesmo a mente que pensa, não sou eu; e também a ignorância, que é provida apenas com as impressões residuais dos objetos e nas quais não há objetos e nenhuma função, não sou eu.
2. Se não sou eu nenhum desses, então quem sou eu?
Depois de negar tudo mencionado acima por meio do ‘não sou isto’, ‘não sou aquilo’, aquela Consciência que permanece sozinha – isso sou Eu.
3. Qual é a natureza da Consciência?
A natureza da Consciência é Satchiananda (existência/consciência/graça).
4. Quando a realização do Ser será obtida?
Quando o mundo, que é aquilo que é visto for removido, haverá realização do Ser, o qual é o observador.
5. Não haverá realização do Ser enquanto o mundo estiver lá (sendo tomado como real)?
Não
6. Por quê?
O observador e o objeto visto são como a corda e a cobra. Assim como o conhecimento da corda, que é o substrato, não surgirá a menos que o falso conhecimento da ilusória serpente saia; assim a realização do Ser, que é o substrato, não será obtida a menos que a crença de que o mundo é real seja removida.
7. Quando o mundo, que é o objeto visto, será removido?
Quando a mente, que é a causa de todas as cognições e de todas as ações tornar-se quieta, o mundo desaparecerá.
8. Qual é a natureza da mente?
Aquilo que é chamado de ‘mente’ é um notável poder que reside no Ser. Ele causa o surgimento de todos os pensamentos. Sem os pensamentos não existe tal coisa como a mente. Portanto, o pensamento é a natureza da mente. Sem os pensamentos não há uma entidade independente chamada mundo. No sono profundo não existem pensamentos e também não há mundo. Assim como uma aranha emite o fio (da teia) para fora e de novo o recolhe para dentro de si, da mesma forma a mente projeta o mundo fora dela e de novo o analisa dentro de si mesma. Quando alguém persistentemente investiga a natureza da mente, a mente termina por deixar o Ser (como o resíduo).
O que é referido como o Ser é o Atman. A mente existe apenas em dependência de algo denso; ela não pode permanecer sozinha. É a mente que é chamada de corpo sutil ou de alma individual (jiva).
9. Qual é o caminho de investigação para compreender a natureza da mente?
Aquilo que surge como ‘eu’ neste corpo é a mente. Se alguém perguntasse qual é o primeiro lugar no corpo em que o pensamento ‘eu’ surge, ele descobriria que ele surge no coração. Esse é o lugar da origem da mente.
Mesmo se alguém pensasse constantemente em ‘eu’ ‘eu’, ele seria conduzido àquele lugar. De todos os pensamentos que surgem na mente, o pensamento ‘eu’ é o primeiro. É somente depois de seu surgimento que outros pensamentos surgem. É depois do aparecimento do pronome de primeira pessoa que os de segunda e terceira pessoa aparecem; sem o pronome de primeira pessoa não haveria os de segunda e terceira.
10.Como a mente se tornará quieta?
Pela investigação ‘Quem sou eu?’. O pensamento ‘quem sou eu?’ irá destruir todos os outros pensamentos, e como a vareta usada para avivar uma fogueira, será ele próprio destruído no final. Então, surgirá a realização do Ser (Auto-realização).
11. Quais são os meios para manter-se constantemente no pensamento ‘Quem sou eu?’?
Quando outros pensamentos surgem, não devemos segui-los, mas sim perguntar: “Para quem eles surgem?” Não importa quantos pensamentos surjam. Para cada pensamento que surgisse, deveria ser questionado com diligência: “Para quem este pensamento surgiu?”. A resposta que emergiria seria “Para mim”. Logo em seguida se perguntássemos “Quem sou eu?”, a mente irá retornaria para sua fonte; e o pensamento surgido ficaria quieto. Com repetida prática, dessa maneira, a mente desenvolverá o conhecimento para permanecer em sua fonte. Quando a mente que é sutil, passa através do cérebro e dos órgãos sensitivos, os nomes densos e as formas aparecem, quando ela fica no coração, os nomes e as formas desaparecem.
Não deixar a mente fugir, mas mantê-la no Coração é o que é chamado “intimidade” (antarmukha).
Deixar a mente fugir do Coração é conhecido como “exteriorização” (bahir-mukha). Portanto, quando a mente fica no Coração, o ‘eu’ que é a fonte de todos os pensamentos passará, e o Ser que sempre existiu brilhará. Qualquer coisa que se faça deve ser feita sem o “eu” egoísta. Se alguém age deste modo, tudo se mostrará ser da natureza de Shiva (Deus).
12. Não existem outros meios para fazer a mente aquietar-se?
Além da investigação de si, não existem meios adequados. Se através de outros meios pudéssemos buscar o controle da mente, a mente pareceria estar controlada, mas de novo seguiria adiante. Também, através do controle da respiração, a mente se tornará quieta; mas ela estará quieta somente durante o tempo que a respiração permanecer controlada; e quando a respiração retomar seu fluxo, a mente também começará a mover-se de novo e irá vagar impelida por impressões residuais.
A fonte é a mesma tanto para a mente como para a respiração. Pensamento, de fato, é a natureza da mente. O pensamento ‘eu’ é o primeiro pensamento da mente; e isso é egoísmo. É dali que se origina o egoísmo e também a respiração. Portanto, quando a mente torna-se quieta, a respiração é controlada, e quando a respiração é controlada a mente torna-se quieta. Mas, em sono profundo, embora a mente torne-se quieta, a respiração não pára. Isso ocorre pela vontade de Deus, de modo que o corpo possa ser preservado e outras pessoas possam não estar sob a impressão de que ele está morto. No estado desperto e no samadhi, quando a mente torna-se quieta, a respiração é controlada. Respiração é a forma densa da mente. Até o momento da morte, a mente mantém a respiração no corpo; e quando o corpo morre a mente leva a respiração junto com ela. Portanto, o exercício de controle respiratório é somente um auxílio para deixar a mente quieta (manonigraha); ele não destruirá a mente (manonash).
Assim como a prática do controle respiratório, meditar sobre as formas de Deus, repetir mantras, restringir a alimentação, etc são apenas auxiliares para render a mente quieta.
Através da meditação nas formas de Deus e através da repetição de mantras, a mente torna-se focada. A mente sempre está vagando. Assim como quando uma corrente é dada a um elefante para que ele a segure em sua tromba, ele segue agarrado à corrente e nada mais, do mesmo modo, quando a mente está ocupada com um nome ou uma forma, ela apenas se agarrará àquilo. Quando a mente se expande na forma de incontáveis pensamentos, cada pensamento torna-se fraco; mas assim que os pensamentos conseguem poder de decisão, a mente torna-se focada e forte: para uma mente assim a Auto-investigação torna-se fácil. De todas as regras restritivas, aquela relacionada a comer alimentos ‘sattvicos’ em quantidades moderadas é a melhor; através da observação desta regra, a qualidade ‘sattvica’ da mente crescerá, e isso será útil para a Auto-investigação.
13. As impressões residuais (pensamentos) de objetos parecem ir como as ondas de um oceano. Quando todas elas serão destruídas?
Quando a meditação no Ser elevar-se mais e mais alto, os pensamentos serão destruídos.
14. É possível que as impressões residuais de objetos que vêm de tempos imemoriais, por assim dizer, sejam dissolvidas e que uma pessoa permaneça como o puro Ser?
Sem submeter-se à dúvida “É possível, ou não?”, uma pessoa deve persistentemente manter-se na meditação do Ser. Mesmo que seja uma grande pecadora, ela não deveria nem se preocupar e nem chorar: “Oh! Eu sou um pecador, como posso ser salvo?" Ela deveria renunciar completamente ao pensamento “Eu sou um pecador” e concentrar-se agudamente na meditação do Ser; então, ela certamente será bem sucedida. Não há duas mentes – uma boa e outra má; a mente é apenas uma. São as impressões residuais que são de dois tipos – favoráveis ou desfavoráveis. Quando a mente está sob a influência de impressões favoráveis ela é chamada boa e quando está sob a influência de impressões desfavoráveis é considerada má.
Não deveríamos permitir que a mente vagasse na direção de objetos mundanos e nem na direção daquilo que concerne às outras pessoas. Não importa quão ruins as outras pessoas possam ser, não deveríamos sustentar nenhuma aversão para com elas. Tanto o desejo quanto a aversão deveriam ser evitados. Tudo aquilo que damos aos outros damos a nós mesmos. Se essa verdade é compreendida, quem não irá dar aos outros? Quando alguém se eleva tudo se eleva; quando alguém torna-se quieto, tudo torna-se quieto. Na medida em que nos comportarmos com humildade, haverá proporcionalmente bom resultado. Se a mente torna-se quieta, a pessoa pode viver em qualquer lugar.
15. Por quanto tempo a investigação deve ser praticada?
Enquanto existirem impressões de objetos na mente, a investigação “Quem sou eu?” é necessária. Assim que surgem os pensamentos, eles devem ser destruídos ali mesmo no exato lugar de sua origem através da investigação. Se alguém faz uso da contemplação do Ser ininterruptamente, até que o Ser seja obtido, isso por si só já é suficiente. Enquanto houverem inimigos dentro da fortaleza, eles continuarão atacando; se forem destruídos assim que emergirem, a fortaleza cairá em nossas mãos.
16. Qual é a natureza do Ser?
O que existe na verdade é somente o Ser. O mundo, a alma individual e Deus são aparências, aspectos dele. Como a prata na madrepérola, esses três aspectos aparecem ao mesmo tempo e desaparecem ao mesmo tempo. O Ser é o lugar onde não há absolutamente nenhum pensamento de ‘eu’. Isso é chamado “silêncio”. O próprio Ser é o mundo; o próprio Ser é o ‘Eu’; o próprio Ser é Deus; tudo é Shiva, o Ser.
17. Não são todas as coisas o trabalho de Deus?
Sem desejo, decisão ou esforço, o sol surge; e em sua mera presença, a pedra-sol emite fogo, o lótus floresce, a água evapora, as pessoas executam suas várias funções e então descansam. Assim como só pela presença do magneto a agulha já se move, é pela virtude da mera presença de Deus que as almas, governadas pelas três funções cósmicas ou pelas cinco atividades divinas, executam suas ações e então descansam, de acordo com seus respectivos karmas. Deus não tem intenção; nenhum karma vincula-se a Ele. São como ações mundanas que não afetam o sol, ou como os méritos e desméritos dos quatro elementos que não afetam o espaço todo-abrangente que eles ocupam.
18. Dos devotos, quem é o maior?
Aquele que entrega a si mesmo ao Ser o qual é Deus, é o mais excelente dos devotos. Entregar-se a Deus significa permanecer constantemente no Ser sem dar espaço para o surgimento de quaisquer pensamentos além daquele do Ser. Quaisquer que sejam os fardos, são descarregados em Deus, Ele os carrega. Já que o supremo poder de Deus faz todas as coisas se moverem, porque deveríamos, sem que nos submetermos a Ele, constantemente nos preocupar com pensamentos sobre aquilo que deveria ser feito e como deveria ser feito, e aquilo que não deveria ser feito e como não deveria? Nós sabemos que o trem carrega todas as cargas, e assim, depois de pegá-lo, por que deveríamos carregar nossa pequena bagagem na cabeça para nosso desconforto ao invés de colocá-la no chão do trem e nos sentirmos aliviados?
19. O que é o não-apego?
Assim que os pensamentos surgem, destruí-los sem deixar qualquer resíduo no exato lugar de sua origem, é o não-apego. Assim como um catador de pérolas amarra uma pedra na sua cintura, submerge para o fundo do mar e lá pega as pérolas, de mesmo modo, cada um de nós deveria ser dotado com o não-apego e mergulhar dentro de si para obter o Ser-Pérola.
20. É possível para Deus e para o Guru efetuar a libertação de uma alma?
Somente Deus e o Guru mostrarão o caminho para a libertação; por si mesmos eles não levarão a alma ao estado de libertação. Na verdade, Deus e o Guru não são diferentes. Assim como a presa que caiu na jaula de um tigre não tem escapatória, aqueles que chegaram dentro do âmbito do gracioso olhar do Guru serão salvos pelo Guru e não ficarão perdidos; ainda assim, cada um deve por seu próprio esforço percorrer o caminho mostrado por Deus ou pelo Guru e obter a libertação. Uma pessoa pode conhecer a si mesma somente com o próprio olho do conhecimento e não com o de outra pessoa. Aquele que é Rama precisa da ajuda de um espelho para saber que ele é Rama?
21. É necessário para aquele que anseia pela libertação investigar sobre a natureza das categorias (tattvas)?
Assim como alguém que quer jogar o lixo fora não precisa analisá-lo e ver o que ele é, do mesmo modo, aquele que quer conhecer o Ser não tem que contar o número de categorias ou investigar sobre suas características; o que ele tem de fazer é rejeitar todas as categorias que escondem o Ser. O mundo deveria ser considerado como um sonho.
22. Não há diferenças entre a vigília e o sonho?
A vigília é longa e o sonho é curto, além dessa não há outra diferença. Assim como os acontecimentos da vigília parecem ser reais enquanto estamos despertos, do mesmo modo nos parecem os de um sonho enquanto sonhamos.
No sonho a mente toma outro corpo. Tanto no estado de sonho como no de vigília, os pensamentos, nomes e formas ocorrem simultaneamente.
23. Ler livros é de alguma utilidade para aqueles que desejam a libertação?
Todos os textos dizem que para obter a libertação uma pessoa deve tornar a mente quieta; portanto, o ensinamento conclusivo é de que a mente deve se fazer quieta; uma vez que isso tenha sido entendido, não há necessidade de intermináveis leituras. Para aquietar a mente, uma pessoa tem somente que investigar dentro de si aquilo que é o Ser; como essa busca poderia ser feita em livros? A pessoa deve conhecer o seu Ser com o seu próprio olho da sabedoria. O Ser está dentro dos cinco invólucros; enquanto que os livros estão fora deles. Já que o Ser tem de ser investigado através do descarte dos cinco invólucros, é fútil procurar por ele em livros. Chegará um momento em que a pessoa terá de esquecer tudo aquilo que aprendeu.
24. O que é felicidade?
Felicidade é a real natureza do Ser; felicidade e o Ser não são diferentes. Não há felicidade em qualquer objeto do mundo. Nós imaginamos através da nossa ignorância que recebemos felicidade dos objetos. Quando a mente vai para fora, ela experimenta miséria. Na verdade, quando seus desejos são satisfeitos, ela retorna ao seu próprio lugar e desfruta da felicidade que é o Ser. Do mesmo modo, nos estados de sono profundo, samadhi e desfalecimento, e quando o objeto desejado é obtido ou quando o objeto indesejado é removido, a mente torna-se direcionada para o interior e desfruta a pura felicidade do Ser. Assim, a mente move-se alternadamente sem descanso indo para fora do Ser e retornando a ele. Debaixo da árvore a sombra é agradável; fora dela, em área aberta, o calor é escaldante. Uma pessoa que esteve sob o sol, sente-se refrescada quando chega na sombra. Alguém que insiste em ir da sombra ao sol e logo volta à sombra é um tolo. Um homem sábio fica permanentemente na sombra. Similarmente, a mente de alguém que conhece a verdade não abandona Brahma. A mente do ignorante, ao contrário, revolve-se no mundo sentindo-se miserável, retornando por um breve tempo a Brahma para experimentar felicidade. De fato, aquilo que é chamado mundo é somente pensamento. Quando o mundo desaparece, isto é, quando não há pensamento, a mente experimenta felicidade; e quando o mundo aparece, ela experimenta miséria.
25. O que é sabedoria-intuitiva (jnana-drishti)?
Permanecer quieto é chamado de sabedoria-intuitiva. Permanecer quieto é dissolver a mente no Ser. Telepatia, saber dos acontecimentos passados, presentes e futuros, assim como a clarividência, não constituem sabedoria-intuitiva.
26. Qual é a relação entre ausência de desejo e sabedoria?
Ausência de desejo é sabedoria. Os dois não são diferentes; eles são o mesmo. Ausência de desejo é evitar voltar a mente em direção a qualquer objeto. Sabedoria significa a aparição de nenhum objeto. Em outras palavras, não buscar qualquer outra coisa além do Ser é desapego ou ausência de desejo; não deixar o Ser é sabedoria.
27. Qual é a diferença entre investigação e meditação?
Investigação consiste em reter a mente no Ser. Meditação consiste em pensar que o próprio Ser é Brahma, existência-consciência-graça.
28. O que é libertação?
Investigar sobre a natureza do seu Ser que está escravizado e perceber sua verdadeira natureza é libertação.

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