terça-feira, 22 de setembro de 2009

Bhagavan Sri Ramana Maharshi - Meditação


Pergunta: O que é meditação (Dhyana)?
Bhagavan: É permanecer como seu próprio Ser sem desviar-se de maneira nenhuma de sua natureza real e sem sentir que você está meditando.
P: Qual é a diferença entre Dhyana e Samadhi?
B: Dhyana é alcançada através de esforço mental deliberado. Em Samadhi não há tal esforço.
P: Quais são os fatores a serem mantidos em vista na meditação?
B: É importante para aquele que está estabilizado no seu Ser (atmanishtha) observar que ele não se desvie nem um pouquinho de sua absorção. Ao desviar-se de sua natureza real, ele pode ver diante de si refulgências brilhantes, ou escutar sons incomuns, ou considerar como reais visões de Deuses aparecendo dentro e fora de si mesmo. Ele não deveria ser enganado por tais coisas e esquecer de Si.


P: Não encontro meios de ir para dentro através da meditação.
B: Onde mais estamos agora? Nosso próprio Ser é isso.
P: Mesmo assim somos ignorantes.
B: Ignorantes do quê e de quem é a ignorância? Se a ignorância é a respeito do Ser existem dois si mesmos (Selves)?
P: Não há dois. Mas o sentimento de limitação não pode ser negado.
B: As limitações são apenas da mente. Você as sentia no sono profundo? Você existe no sono profundo. Você não nega a sua existência então. O mesmo Ser está aqui e agora no estado desperto. Você está dizendo agora que há limitações. O que aconteceu agora é que existem diferenças entre os dois estados. As diferenças devem-se à mente. Não há mente no sono profundo, enquanto que agora ela está ativa. O Ser existe na ausência da mente também.
P: Embora isso seja entendido, não é percebido.
B: Será pouco a pouco, com meditação.
P: Meditação é com a mente. Como ela pode matar a mente para poder revelar o Ser?
B: Meditação é firmar-se a um pensamento. Aquele único pensamento mantém afastados os outros pensamentos. Distração da mente é um sinal de sua fraqueza. Através de constante meditação ela ganha força, ou seja, a fraqueza dos pensamentos fugitivos dá lugar ao duradouro pano de fundo livre de pensamentos. Essa vastidão desprovida de pensamentos é o Ser. A mente em pureza é o Ser.

P: Como a meditação deve ser praticada?
B: Verdadeiramente falando, meditação é fixar-se no Ser. Mas quando os pensamentos cruzam a mente e fazemos um esforço para eliminá-los, o esforço geralmente é chamado de meditação. Atmanishtha (estar fixado no Ser) é a sua natureza real. Permaneça como você é. Esse é o objetivo.
P: Mas os pensamentos aparecem. Nosso esforço serve apenas para eliminar os pensamentos?
B: Sim. A meditação sendo em um único pensamento, os outros pensamentos são mantidos longe. A meditação apenas é negativa de fato, na medida em que os pensamentos são mantidos afastados.
P: Fala-se em 'fixar a mente no Ser' (atma samstham manah krtva). Mas não é possível pensar no Ser.
B: De qualquer modo, por que você deseja meditar? Porque você deseja meditar, lhe é dito para 'fixar a mente no Ser'. Por que você não permanece como você é sem meditar? O que é esta mente? Quando todos os pensamentos são eliminados ela se torna 'fixada no Ser'.
P: Se uma forma for dada, eu posso meditar nela e os outros pensamentos são eliminados. Mas o Ser é sem forma.
B: A meditação em formas ou objetos concretos é dita ser Dhyana, enquanto que investigação do Ser é Vichara ou a ininterrupta consciência de ser (de existir).
P: Há mais prazer na meditação do que nos prazeres sensuais. Ainda assim a mente se apressa para obter os prazeres sensuais e não busca a meditação. Por que é assim?
B: Prazer e dor são aspectos da mente apenas. Nossa natureza essencial é a felicidade. Mas nós esquecemos de nós mesmos (do Ser) e imaginamos que o corpo ou a mente são o Ser. É essa identidade errada que gera miséria. O que deve ser feito? Essa tendência mental é muito antiga e tem continuado por inúmeros nascimentos passados. Dessa forma ela tem ficado mais forte. Ela tem de ir antes que a natureza essencial, a felicidade, se afirme.

P: A Meditação é praticada com os olhos abertos ou fechados?
B: Pode ser feita de ambos os jeitos. O ponto é que a mente deve estar introvertida e ser mantida ativa na sua busca. Às vezes acontece que quando os olhos estão fechados, os pensamentos latentes se apressam com grande vigor. Pode ser difícil também introverter a mente com os olhos abertos. Requer força da mente para fazer isso. A mente fica contaminada quando ela absorve objetos. Quando não, ela é pura. O principal fator na meditação é manter a mente ativa na sua busca sem absorver impressões externas ou pensar em outros assuntos.

P: Sempre que medito sinto um grande calor na cabeça e, se persisto, meu corpo todo queima. Qual é a solução?
B: Se a concentração é feita com o cérebro, surgem sensações de aquecimento ou mesmo dor de cabeça. A concentração tem que ser feita no Coração, o qual é fresco e refrescante. Relaxe e a sua meditação será fácil. Mantenha sua mente estável gentilmente repelindo todos os pensamentos intrusos mas sem esforço excessivo. Em breve você conseguirá.


P: Como evito cair no sono enquanto medito?
B: Se você tentar evitar o sono isso significará pensar na meditação, o que deve ser evitado. Mas se você adormecer enquanto estiver meditando, a meditação irá continuar mesmo durante e depois do sono. Ainda assim, sendo o sono um pensamento, devemos nos livrar dele, pois o estado natural final tem de ser obtido conscientemente no estado desperto (jagrat) sem o pensamento perturbado. O sono e o estado desperto são meras imagens na tela do estado nativo livre de pensamentos. Deixe-os passarem desapercebidos.

P: Sobre o que devemos meditar?
B: No que você preferir.
P: Shiva, Vishnu e Gayatri são ditos como sendo igualmente eficazes.
B: Qualquer um que você gostar mais. São todos iguais em seu efeito. Mas você deveria se firmar a um.
P: E como eu medito?
B: Concentre-se naquele que você gosta mais. Se um único pensamento prevalece, todos os outros pensamentos são colocados para fora e finalmente são erradicados. Enquanto a diversidade prevalece há maus pensamentos. Quando apenas o objeto de amor prevalece, os bons pensamentos mantém-se no campo. Portanto, segure-se a um pensamento apenas. Dhyana é a prática principal.
Dhyana significa luta. Assim que você começa a meditação, outros pensamentos se aglomeram. Junte força e tente aprofundar o único pensamento com o qual você tenta se manter. O pensamento bom gradualmente deve ganhar força através de repetida prática. Depois de ter ficado forte os outros pensamentos vão ser mandados para longe. Essa é a batalha real que sempre acontece na meditação.
A pessoa quer livrar-se da miséria. Isso requer paz da mente, que significa ausência de perturbação devida a todos os tipos de pensamentos. A paz da mente é trazida pela meditação apenas.
O resultado final da prática de qualquer tipo de meditação é que o objeto no qual o buscador fixa sua mente deixa de existir enquanto separado e distinto do sujeito. Eles, o sujeito e o objeto, tornam-se o Ser uno, e esse é o Coração.
P: Por que Sri Bhagavan não nos diz para praticarmos concentração em algum centro particular ou chakra?
B: O Yoga Sastra diz que o sahasrara (o chakra localizado no cérebro) é o lugar do Ser. O Purusha Suka declara que o coração é o lugar dele. Para permitir que o buscador se livre de qualquer dúvida possível, eu lhes digo para trilhar o caminho ou a pista do 'sentido de eu' (I'ness) ou o 'sentido de eu sou' (I'am-ness) e segui-lo até a sua fonte. Porque, primeiramente, é impossível para alguém levantar qualquer dúvida a respeito dessa noção de 'eu'. Em segundo lugar, qualquer que seja o meio adotado, o objetivo final é a realização da fonte do 'sentido de eu sou' o qual é o dado primário da sua experiência.
Se você praticar portanto a investigação de si, você alcançará o Coração que é o Ser.

P: Qual é a diferença entre meditação (dhyana) e investigação (vichara)?
B: Ambos dão no mesmo. Aqueles que não se adequam à investigação devem praticar meditação. Na meditação o aspirante, esquecendo a si mesmo, medita 'eu sou Brahman' ou 'eu sou Shiva' e através desse método se mantém em Brahman ou Shiva. Isso irá terminar finalmente com a consciência residual de Brahman ou Shiva na forma do Ser (da própria existência). Ele irá então perceber que isso é o puro Ser, ou seja, o Si mesmo real.
Aquele que se engaja na investigação começa mantendo-se em si mesmo, e perguntando a si mesmo 'Quem sou eu?' o Ser (o Si mesmo real) torna-se claro para ele.
A pessoa imaginar mentalmente que ela é a realidade suprema, que brilha como existência-consciência-contentamento, é meditação. Fixar a mente no Ser para que a semente irreal da ilusão morra, é investigação.
Quem quer que medite sobre o Ser em qualquer imagem mental (bhava) atinge-o apenas naquela imagem. Aquelas pessoas pacíficas que permanecem quietas sem nenhuma imagem mental desse tipo atingem o nobre e inqualificável estado de Kaivalya, o estado sem forma do Ser.
P: A meditação é mais direta do que a investigação pois mantém-se na verdade enquanto que a investigação filtra a verdade da irrealidade?
B: Para um iniciante a meditação em uma forma é mais fácil e agradável. A prática dela leva à investigação de si que consiste em peneirar a verdade da irrealidade.
Qual é a utilidade de segurar-se na verdade quando você está cheio de fatores antagônicos?
A investigação de si conduz diretamente à Realização ao remover os obstáculos que fazem você pensar que o Ser ainda não está realizado.
A meditação difere de acordo com o grau de desenvolvimento do buscador. Se a pessoa estiver apta, ela deve se manter no pensador, e o pensador irá automaticamente afundar-se na sua fonte, a pura consciência.
Se a pessoa não pode segurar-se diretamente no pensador ela deve meditar em Deus e no devido tempo esse mesmo indivíduo terá se tornado suficientemente puro para se manter no pensador e afundar-se no Ser absoluto.
A meditação é possível apenas se o Ego for mantido. Existe o ego e o objeto sobre o qual se está meditando. O método é portanto indireto pois o Ser é apenas um. Buscando o ego, ou seja, a fonte dele, o ego desaparece. O que sobra é o Ser. Esse é o método direto.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Philokalia - São Simeão o novo Teólogo - O Terceiro e mais eficaz método de atenção e oração

Uma característica distinta do terceiro método de oração, é que a mente deveria ficar no coração. Ela deveria guardar o coração enquanto reza, revolver, permanecendo sempre dentro, e dessa forma, das profundezas do coração, oferecer orações a Deus. (Tudo reside nessa ação; trabalhe dessa maneira até que lhe seja dado um gosto do Senhor). Quando a mente lá, dentro do coração, finalmente saboreia e vê que o Senhor é bom e se deleita ali (o trabalho é nosso, mas essa experiência é a ação da graça em um coração humilde) então ela não irá querer mais abandonar esse lugar no coração (ela dirá então as palavras do Apóstolo Pedro: 'É bom estarmos aqui' [Mat. Xvii. 4]), e olhará sempre internamente para as profundezas do coração e permanecerá revolvendo ali, repelindo todos os pensamentos semeados pelo demônio. (Este é o terceiro método de atenção e oração, praticado da maneira como deve ser praticado).
Para aqueles que não não têm conhecimento desse trabalho e nenhuma experiência nele, na maioria das vezes ele parece difícil e opressivo. Mas aqueles que saborearam sua doçura e apreciaram-no nas profundezas de seus corações, clamam com o divino Paulo: 'Quem pode nos separar do amor de Cristo?' (Rom. Vii 35).
Portanto nossos sagrados padres escutando o Senhor que disse: 'É do coração que precedem os maus pensamentos, assassínios, adultérios, fornicações, roubos, falsos testemunhos, blasfêmias' e: 'São essas coisas que tornam o homem impuro' (Mat xv. 19, 20), escutando também que em outra parte dos Evangelhos somos instruídos a 'limpar primeiro o interior do copo e do prato, para que também o exterior deles fique limpo' (Mat. Xxiii. 26), renunciaram todos os outros trabalhos espirituais e se concentraram totalmente nessa única ação, que consiste em guardar o coração, convencidos de que através dessa prática, eles iriam facilmente atingir todas as outras virtudes, enquanto que sem isso nem uma única virtude poderia ser firmemente estabelecida. Alguns dos Padres chamaram essa obra de silêncio do coração; outros chamaram-na de atenção; outros ainda – de sobriedade e oposição (aos pensamentos), enquanto outros chamaram-na de examinar os pensamentos e guardar a mente. Todos eles praticaram-na preeminentemente, e através dela, receberam dons Divinos. O Eclesiastes quer dizer a mesma coisa quando diz: 'Regozija, Ó jovem, em tua juventude … e anda nos caminhos de teu coração' (Ecl. Xi 9) na pureza, afastando o coração dos maus pensamentos. Em outra parte ele fala o mesmo: 'Se o espírito do governante levantar-se contra ti, não abandona teu posto' (Ecl. x. 4) – por posto, significando coração. O Senhor também nos fala nos Evangelhos: 'Não sejas de mente inquieta' (Luc. Xii. 29) – não atira-te por aí como um meteorito, não te apresses aqui e ali com a tua mente. E novamente em outra parte Ele diz: 'Abençoados são os pobres no espírito' (Mat. v. 3) ou seja, abençoados são aqueles que não têm apegos com o mundo em seus corações, mas são destituídos de pensamentos mundanos. Todos os Padres Sagrados escreveram sobre isso. Aqueles que quiserem podem ler seus escritos e ver o que São Marcos o Lutador escreveu, ou São João da Escada, Hesíquio de Jerusalém, Philotheu do Sinai, Abba Isaías, Barsanuphius o Grande e muitos outros.
Em suma, aquele que não tem atenção em si mesmo e que não guarda sua mente, não pode tornar-se puro no coração e portanto não pode ver Deus. Aquele que não tem atenção em si mesmo não pode ser pobre no espirito, não pode chorar e ser contrito, nem ser gentil e meigo, nem faminto e sedento por retidão, nem ser piedoso ou ser um pacificador, nem sofrer perseguição por causa da retidão.
Falando de maneira geral, é impossível adquirir virtude de qualquer outra maneira, exceto através desse tipo de atenção. Portanto você deveria tentar adquirir isso mais do que qualquer outra coisa, a fim de aprender o que lhe falo em sua própria experiência. Se deseja também aprender como isso deveria ser feito, falarei disso.
Você deveria observar três coisas antes de tudo mais: liberdade de todas inquietações, não apenas inquietações sobre o que é mau e vão mas mesmo a respeito das coisas boas, ou em outras palavras, você deve tornar-se morto para todas as coisas; sua consciência deveria estar limpa em todas as coisas, de modo que ela não o denuncie em nada; e você deveria ter uma completa ausência de apego às paixões, de maneira que seu pensamento não se incline para nada que seja mundano. Mantenha sua atenção dentro de si mesmo (não na sua cabeça, mas no coração). Mantenha a mente lá (no coração), tentando de todos os modos possíveis descobrir o lugar onde está o coração, para que tendo-o encontrado sua mente possa constantemente permanecer lá. Lutando dessa maneira, a mente encontrará o lugar do coração.
Isso acontece quando a graça produz doçura e calor na oração. Daquele momento em diante, de qualquer lado que um pensamento possa aparecer, a mente imediatamente manda-o embora, antes que ele tenha tempo de entrar e tornar-se um pensamento ou uma imagem, destruindo-o com o nome Jesus, isto é, 'Senhor Jesus Cristo, tende piedade de mim!' Ademais, a partir daquele momento, o homem desenvolve aversão pelos demônios e raiva contra eles, constantemente luta com eles e os reprime. No que diz respeito aos outros resultados que geralmente procedem desse trabalho, com a ajuda de Deus, você irá descobri-los com a sua própria experiência, ao manter sua mente atenta e mantendo Jesus em seu coração, ou seja, mantendo a Sua oração – 'Senhor Jesus Cristo, tende piedade de mim!' Um dos padres sagrados diz: 'Sente em seu quarto e essa oração lhe ensinará tudo'.

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Sri Ramakrishna - Abril de 1882

Ramakrishna estava sentado num pequeno sofá em seu quarto com o seu habitual semblante radiante. M. chegou com Kalikrishna, que nem imaginava onde seu amigo o tinha levado. Ele só havia dito: 'Se quer ver uma taberna, então venha comigo. Você verá lá um enorme jarro de vinho.' M. contou isso para Sri Ramakrishna, que se divertiu com a história. O Mestre disse: "A felicidade da adoração e da comunhão com Deus é o verdadeiro vinho, o vinho do amor extático. O objetivo da vida humana é amar a Deus. Bhakti (devoção) é a única coisa essencial. Conhecer Deus através de Jnana (conhecimento) e do raciocínio é extremamente difícil.
Quem é que pode compreender o que é a Mãe Kali (a Divina Mãe do Universo)? Até os seis Darshanas (sistema filosófico Indiano) não têm o poder de revelá-la. O único objetivo da vida é cultivar o amor a Deus, aquele amor que os vaqueiros, vaqueiras e os pastores meninos de Vrindavana tinham por Krishna. Quando Krishna partiu para Mathura, os pastores ficaram desnorteados, vagando sem rumo, chorando amargamente por causa daquela separação."


Então o mestre cantou:


Não bebo vinho comum, somente o vinho da felicidade eterna.

Quando repito o nome da minha mãe Kali,

Minha mente se embriaga a tal ponto

que as pessoas me consideram ser um bêbado!


Para fazer o vinho meu guru primeiro dá o melaço;

Minhas aspirações são a levedura para transformá-lo,

O conhecimento, fazedor de vinho, logo o prepara para mim;
.
E quando está pronto, minha mente absorve-o da garrafa do mantra,

Tomando o nome da Mãe para torná-lo puro.


Bebe deste vinho, e os quatro frutos da vida* serão seus.
*Dharma, Artha, Kama y Moksha. (a religião, a bem aventurança, o amor e a liberação)




Ramakrishna: Deus e Sua glória. Este universo é a Sua glória. As pessoas vêem a Sua glória e não pensam em nada mais. Não buscam a Deus, cuja glória é este mundo. Todos procuram desfrutar de "mulher e ouro". Mas há muita miséria e dor nisso. Este mundo é como um redemoinho de Visalakshi. Uma vez que um barco cai dentro dele, não há esperança de resgatá-lo. De outro lado, o mundo é como um arbusto espinhoso. Você acaba de se livrar de um monte de espinhos e já está enredado em outro monte deles. Uma vez que você entre num labirinto é muito difícil encontrar a saída. Vivendo no mundo o homem acaba sendo surrado, por assim dizer.

Devoto: Então, qual é o caminho, senhor?

R: A oração e a companhia de homens santos. Você não pode se livrar de uma doença sem a ajuda de um médico. Mas não é o suficiente estar em companhia dos santos apenas por um dia. Você deve buscá-la constantemente, pois a doença tornou-se crônica. Além disso, você não pode entender corretamente a pulsação, a menos que viva com um médico. Ao acompanhá-lo constantemente, você aprende a distinguir o pulso tranquilo do pulso agitado.
D: O que há de bom na companhia dos santos?

R: Ela produz um anseio por Deus, e o amor a Deus. Não se alcança nada na vida espiritual sem esse anseio. Vivendo constantemente em companhia dos santos, a alma torna-se inquieta por Deus. Esse anseio é como o estado mental de um homem que tem um doente na família. Sua mente está em um perpétuo estado de agitação, pensando em como ele poderia curar o doente. A pessoa deveria também sentir um anseio por Deus assim como aquele que sente um homem que perdeu seu emprego e vaga de um escritório a outro em busca de trabalho. Se ele for rejeitado num lugar por não haver vaga, ele retorna no dia seguinte e pergunta: 'Há alguma vaga hoje?'
Existe uma outra forma: orando a Deus sinceramente. Deus é muito nosso. Deveríamos dizer a Ele, 'Ó Deus, qual é a Tua natureza? Revela-Te a mim. Tens de mostrar-Te a mim, pois, para que outra finalidade me criaste?'
Uma vez alguns devotos Sikhs me disseram: 'Deus é cheio de compaixão.' Eu lhes disse: 'Mas por que deveríamos chamá-Lo de compassivo? Ele é o nosso Criador. Por que haveríamos de nos surpreender se Ele é compassivo conosco? Os pais criam seus filhos. Você chama isso de um ato de bondade? Eles têm de agir dessa forma. Portanto, devemos fazer valer os nossos pedidos a Deus. Ele é nosso Pai e nossa mãe. Não é? Se o filho pede sua herança e pára de comer e de beber para forçar que sua ordem seja atendida, então seus pais lhe darão a sua parte, três anos antes do que estava legalmente prescrito. Ou quando a criança pede alguns centavos para a mãe e diz repetidas vezes: 'Mamãe, me dá estas moedas de um centavo, eu imploro de joelhos!', então a mãe vendo sua ansiedade e incapaz de suportar mais, dá as moedas.'
Um outro benefício alcançado pela companhia de homens santos, é que isso nos ajuda a cultivar o discernimento entre o real e o irreal. Só Deus é real, ou seja, a Substância Eterna, e o mundo é irreal, isto é, transitório. Tão logo o homem encontre sua mente vagando no irreal, ele deve aplicar o discernimento. Quando o elefante estica a sua tromba para comer uma banana do jardim vizinho, seu condutor lhe dá um golpe no focinho.
D: Por que os homens têm tendências pecaminosas?
R: Na criação de Deus existem todos os tipos de coisas. Ele criou os homens maus bem como os homens bons. É Ele quem nos dá as tendências boas e é Ele também quem nos dá as más tendências.

D: Nesse caso, nós não somos responsáveis por nossas más ações, não é?

R: O pecado gera seu próprio resultado. Essa é a Lei de Deus. Você não irá queimar a língua se comer pimenta ardida? Em sua juventude, Mathur levou uma vida muito leviana, e, consequentemente, antes de sua morte sofreu de várias doenças. A pessoa pode não dar-se conta disso na juventude. Eu vi no fogão da cozinha do Templo de Kali, como queimam as lenhas. No início a madeira úmida queima bem. Ela não parece conter muita umidade. Mas quando está suficientemente queimada, toda a umidade se reúne num extremo. Finalmente a água escorre do combustível e apaga o fogo. Portanto, a pessoa deve tomar cuidado com a ira, as paixões e a cobiça. Tome por exemplo no caso de Hanuman. Em um acesso de raiva ele queimou o Ceilão. Então, lembrou que Sita estava vivendo no jardim de Asoka. E começou a tremer de medo achando que o fogo pudesse machucá-la.

D: Por que Deus criou tanta gente perversa?

R: Essa é a vontade Dele, o Seu jogo. Em Sua Maya existe tanto Avydia quanto vydia (ignorância e sabedoria). A escuridão também é necessária. Ela revela ainda mais a glória da luz. Não há dúvida de que a ira, a luxúria e a ganância são ruins. Por que então Deus as criou? Para criar os santos. Um homem torna-se um santo conquistando os sentidos. Existe algo impossível para um homem que dominou suas paixões? Ele pode até mesmo realizar a Deus através da Sua graça. Além disso, veja como todo o Seu jogo da criação é perpetuado através da luxúria. As pessoas más também são necessárias. Uma vez que os inquilinos de um imóvel se rebelaram, o proprietário teve de enviar Golak Choudhoury que era um bandido. Era um administrador tão áspero e cruel que os inquilinos tremiam só de ouvir o seu nome. Existe a necessidade de tudo. Sita disse uma vez a seu marido: 'Rama, seria ótimo se cada casa em Ayodhya fosse uma mansão. Vejo muitas casas antigas e em ruínas.' 'Mas minha querida', disse Rama, 'se todas as casas fossem bonitas, o que fariam os pedreiros?'
Deus criou todas as classes de coisas. Criou árvores boas e também plantas e ervas venenosas. Entre os animais existem os bons, os maus e todos os tipos de criaturas - tigres, leões, serpentes, etc.'
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D: Senhor, é possível realizar a Deus mesmo vivendo uma vida com a família?
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R: Certamente. Mas como acabei de dizer, a pessoa deve viver em companhia santa e orar incessantemente. A pessoa deveria chorar por Deus. Quando dessa maneira as impurezas da mente tiverem desaparecido, ela realiza Deus. A mente é como uma agulha coberta de lama e Deus é como um imã. A agulha não pode juntar-se ao imã a menos que se livre da lama. As lágrimas lavam a lama, que é nada mais do que a luxúria, a ira, a cobiça e outras más tendências, assim como a inclinação pelos prazeres mundanos. Tão logo a lama desapareça, o ímã atrai a agulha, ou seja, o homem realiza Deus. Somente os puros de coração vêem Deus. Um doente com febre tem excesso de componentes aquosos em seu sistema. Que bem pode fazer o quinino, a menos que se remova esses elementos? Por que a pessoa não haveria de ter a realização de Deus, enquanto vive no mundo? Mas, como já disse, tem-se de viver em companhia dos santos, rezar a Deus, clamar por Sua graça e de vez em quando se retirar para ter momentos de solidão. A menos que no início as plantas de uma trilha sejam protegidas por uma cerca, elas serão destruídas pelo gado.
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D: Então, aqueles que levam uma vida familiar também terão a visão de Deus, não é?
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R: Todos, certamente, serão liberados. Mas é necessário seguir as instruções do guru, se você seguir um desvio no caminho, irá sofrer na tentativa de desfazer os passos. Demora muito tempo para conseguir a liberação. O homem pode não alcançá-la nesta vida. Talvez realize Deus somente após muitos nascimentos. Sábios como Yanaka cumpriram o seu dever para com o mundo. Cumpriram-no ao trazer Deus em suas mentes, assim como uma bailarina dança levando jarros ou bandejas em sua cabeça. Você já viu como as mulheres do noroeste da Índia caminham conversando e rindo, enquanto levam jarros cheios de água em suas cabeças?

D: Hoje você se referiu às instruções do guru. Como é que vamos encontrá-lo?

R: Nem todos podem ser um guru. Um tronco grande flutua na água e até mesmo pode transportar animais. Mas um pedaço de madeira inútil afunda se um homem se senta sobre ele, e ele se afoga. Assim, em cada época Deus mesmo se encarna como guru para ensinar a humanidade. Satchitananda* apenas é o guru. O que é o conhecimento? E qual é a natureza deste ego? Só Deus é o fazedor e nada mais, isso é conhecimento. Eu não sou o fazedor, sou um mero instrumento nas mãos Dele. Por isso eu digo: 'Ó mãe, és a maquinista, eu a máquina. És a moradora e eu sou a morada. És a condutora e eu sou a carruagem. Movo-me da maneira como me moves. Faço o que me fazes fazer. Falo o que me fazes dizer. Não eu, não eu, mas sim Tu, mas sim Tu.
* (existência-consciência-contentamento)

sábado, 12 de setembro de 2009

Farid ud-Din Attar - O morcego em busca do sol

Certa noite, ouviu-se um morcego dizer:
“Como posso ser incapaz, de mesmo que por um instante, ver o sol?
Passei a vida inteira desesperado porque nem por um momento pude perder-me nele.
Por meses e anos tenho voado para cá e para lá de olhos fechados, e aqui estou eu!”
Um contemplativo interpelou-o:
“O orgulho te persegue, e ainda tens milhares de anos para viajar.
Como pode um ser como tu descobrir o sol? Pode a formiga alcançar a lua?”
“Apesar disso”, teimou o morcego, “continuarei tentando.”
E assim, por mais alguns anos, continuou a procurar, até que lhe faltaram as forças e as asas.
Como ainda não tinha descoberto o sol, imaginou:
“Talvez eu o tenha ultrapassado”.
Ouvindo-o, um pássaro sábio interveio:
“Estás sonhando; só tens voado em círculos e não avançaste nem um passo;
e afirmas, em teu orgulho, que ultrapassaste o sol!”
Isso deixou tão abismado o morcego, que, compreendendo a própria impotência,
humilhou-se completamente, dizendo a si mesmo:
“Encontraste um pássaro com visão interior, não vás mais longe”.

Jetsun Milarepa - Canto para um jovem pastor

Um jovem pastor de nome Sanje Jhap, que tinha dezesseis anos, ficou interessado em saber o que sua mente era realmente. Milarepa testou sua habilidade, instruindo-o a refugiar-se e, em seguida, visualizar uma imagem de Buda em frente ao seu nariz. O rapaz não foi visto por sete dias e seu pai temia que ele estivesse morto. Encontraram-no em um poço de barro sentado e perguntaram-lhe por que ele não tinha retornado para casa por sete dias. O menino disse que eles deviam estar brincando porque ele tinha estado lá somente um pequeno período - contudo foram sete dias. Enquanto dava-lhe instruções, Milarepa cantou para ele a respeito de sua mente:



Ouça-me, caro pastor, o protetor das ovelhas!

Ao meramente escutar sobre o sabor do açúcar,

A doçura não pode ser experimentada.

Embora sua mente possa compreender

O que a doçura é,

Ela não pode experimentá-la diretamente.

Apenas a língua pode conhecê-la.

Da mesma forma, não se pode ver plenamente a natureza da mente,

Embora a pessoa possa ter um vislumbre dela,
Se ela foi apontada pelos que a conhecem,

Se a pessoa não se baseia apenas nesse vislumbre

Mas continua procurando pela natureza da mente,

Ela irá ao final vê-la totalmente.

Caro pastor, dessa forma você deveria observar a sua mente.




Ouça-me, jovem pastor.

O corpo está entre o estado consciente e inconsciente,

Enquanto a mente é o fator crucial e decisivo!

Aquele que é afligido por sofrimentos nos reinos inferiores,

É o prisioneiro de Samsara.

No entanto, é a mente que pode livrá-lo de Samsara.

Certamente você quer alcançar a outra margem?

Certamente você anseia pela cidade do Bem-estar e da Liberação?

Se tiver vontade de ir, meu filho,

Posso mostrar-lhe o caminho

E dar-lhe as instruções.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Hazrat Inayat Khan - Vibrações (1923)

A vida silenciosa experimenta na superfície em razão da atividade. A vida silenciosa parece como a morte em comparação com a vida de atividade da superfície. Apenas para o sábio a vida eterna parece preferível à natureza momentânea e em constante mudança da vida mortal. A vida na superfície parece ser a vida real porque é nessa vida que toda a alegria é experimentada.
Na vida silenciosa não há alegria, apenas paz. O Ser original da alma é a paz e a natureza dela é a alegria, ambos os quais trabalham um contra o outro. Essa é a causa oculta de toda a tragédia da vida. Originalmente a alma é sem nenhuma experiência; ela experimenta tudo quando abre seus olhos para o plano exterior, e mantém-nos abertos apreciando a vida na superfície até que se satisfaça. A alma então começa a fechar seus olhos para o plano exterior e constantemente busca paz, o estado original de seu Ser.
A parte interna e essencial de todo e qualquer ser é composta de vibrações finas e a parte externa é formada de vibrações grosseiras. A parte mais fina chamamos de espírito e a parte grosseira de matéria, a primeira estando menos sujeita a mudança e destruição e a segunda mais sujeita a elas. Tudo o que vive é espírito e tudo o que morre é matéria; e tudo que morre no espírito é matéria e tudo o que vive na matéria é espírito. Tudo o que é visível e perceptível parece estar vivo, embora esteja sujeito à morte e decadência e resolvendo-se a cada momento em seu elemento mais fino, porém a visão do homem está tão iludida por sua cognição do mundo aparente, que o espírito que realmente vive é coberto sob a vestimenta da matéria e seu verdadeiro ser é escondido.
É o aumento gradual da atividade que faz as vibrações se materializarem, e é sua diminuição gradual o que as transmuta novamente em espírito. Como tem sido dito, as vibrações passam por cinco fases distintas enquanto mudam do sutil para o grosseiro, e os elementos – éter, ar, fogo, água e terra- tem cada um seu sabor, cor e forma peculiares a si próprios. Portanto, os elementos formam uma roda que no devido tempo os traz todos para a superfície. A cada passo na sua atividade eles variam e tornam-se distintos uns dos outros, e é o agrupamento dessas vibrações que causa a variedade no mundo objetivo. A lei que os faz dispersarem-se, o homem chama de destruição.
As vibrações transformam-se em átomos e os átomos geram o que chamamos de vida, então acontece que seu agrupamento através da força de afinidade da natureza, forma uma entidade viva. E na medida em que a respiração manifesta-se através da forma, o corpo torna-se consciente. Em um indivíduo existem muitos seres sutis e pequenos escondidos: no sangue, nas células do cérebro, na sua pele e em todos os planos de sua existência.
Assim como no corpo físico de um indivíduo vários pequenos germes que são seres vivos, nascem e são nutridos, também no plano mental existem muitos seres, denominados muwakkals – ou elementais. Essas são entidades ainda mais sutis nascidas dos próprios pensamentos do homem, e assim como os germes vivem no corpo físico os elementais habitam na esfera mental. O homem frequentemente imagina que os pensamentos são sem vida; ele não imagina que eles são mais vivos do que os germes físicos, e que eles têm nascimento, infância, juventude, velhice e morte. Eles trabalham para o benefício do homem ou para prejudicá-lo, dependendo da natureza deles. O Sufi os cria, molda e controla. Ele os ensina e os governa durante sua vida, os pensamentos formam seu exército e cumprem seus desejos. Assim como os germes constituem o ser físico do homem e os elementais sua vida mental, também os anjos constituem sua vida espiritual. Eles denominam-se farishtas.
Como regra as vibrações têm comprimento e largura, e elas podem durar a menor fração de um momento ou uma grande parte da vida do universo. Elas produzem diferentes formas, figuras e cores conforme surgem, uma vibração criando outra; assim, miríades delas surgem de apenas uma. Dessa maneira existem círculos sob círculos e círculos sobre círculos, todos os quais formando o universo.
Toda vibração após a sua manifestação funde-se novamente na sua fonte original. O alcance das vibrações é determinado pela sutileza do plano do seu ponto de partida. Falando de maneira mais simples, a palavra falada pelos lábios pode atingir apenas o ouvido do ouvinte, mas o pensamento procedente da mente alcança longe, atravessando rapidamente de mente para mente. As vibrações da mente são muito mais fortes do que as das palavras. Os sentimentos sinceros de um coração podem penetrar o coração de outro, eles falam no silêncio, espalham-se na esfera, fazendo com que a própria atmosfera da presença de uma pessoa proclame seus pensamentos e emoções. As vibrações da alma são as mais poderosas e de longo alcance; elas correm como uma corrente elétrica de alma para alma.
Todas as coisas e seres no universo estão conectados uns com os outros – visível ou invisivelmente – e através das vibrações uma comunicação é estabelecida entre eles em todos os planos de existência. Como um exemplo ordinário: se uma pessoa tosse numa assembleia, muitas outras começam a fazer o mesmo, assim como no caso do bocejo. Isso também se aplica à risada, euforia e depressão. Isso mostra que as vibrações transmitem a condição de um ser para o outro. O visionário, portanto, sabe o passado, o presente e o futuro e percebe as condições em todos os planos de existência. As vibrações trabalham através do acorde da simpatia entre o homem e o meio que o cerca e revela as condições presentes, passadas e futuras. Isso explica o porque do uivo dos cães predizer a morte, e o relincho dos cavalos a aproximação do perigo. Não apenas os animais mostram isso, mas mesmo as plantas em tempos de tristeza começam a morrer e as flores a murchar, enquanto que em tempos de alegria elas crescem e florescem.
A razão das plantas e dos animais poderem perceber as vibrações e saberem a chegada dos eventos enquanto o homem é ignorante disso, é porque ele tem cegado a si mesmo com o egoísmo.
A influência das vibrações é deixada na cadeira onde a pessoa senta, na cama onde dorme, na casa onde vive, nas roupas que ela usa, na comida que come e mesmo na rua onde anda.
Cada emoção surge da intensidade das vibrações que, quando ativas em diferentes direções, produzem diferentes emoções; e a causa principal de toda emoção é a atividade apenas. Cada vibração enquanto ativa eleva a consciência à superfície mais externa, e a névoa causada por essa atividade acumula nuvens, as quais chamamos emoções. As nuvens das emoções obscurecem a clara visão da alma. Por isso a paixão é chamada de cega. O excesso de atividade de vibrações não apenas cega, mas enfraquece a vontade e uma vontade fraca enfraquece a mente e o corpo.
É o estado de vibrações ao qual o homem está sintonizado que conta para a nota de sua alma. Os graus diferentes dessas notas formam uma variedade de tons divididos pelos místicos em três categorias distintas. A primeira, é a categoria que produz poder e inteligência e que pode ser retratada como um mar calmo. A segunda, é a categoria de atividade moderada, que mantém todas as coisas em movimento e é um equilíbrio entre poder e fraqueza, a qual pode ser retratada como um mar em movimento. E a terceira, é a categoria de atividade intensa que destrói tudo e causa fraqueza e cegueira, ela pode ser retratada como um mar tempestuoso.
Nas atividades de todas as coisas e seres o tom é reconhecido pelo visionário, assim como um músico reconhece a clave em que determinada musica está escrita. A atmosfera do homem revela a categoria de atividade de suas vibrações.
Se a atividade vibratória é controlada de maneira apropriada o homem pode apreciar toda a alegria da vida e ao mesmo tempo não ser escravizado por ela. É muito difícil controlar a atividade uma vez que ela foi iniciada e durante o desenvolvimento dela, pois é como tentar controlar um cavalo fugitivo. Mas é nesse controle que está tudo o que é chamado de as propriedades de um mestre.
Os santos e os sábios espalham sua paz não apenas no lugar onde sentam, mas até mesmo no bairro onde habitam; a cidade ou o país onde eles moram fica em paz, de acordo com o poder de vibrações que eles emanam de suas almas. Essa é a razão porque a associação com o que é bom ou ruim e com coisas de classe superior ou inferior, tem uma grande influência sobre a vida e o caráter do homem.
A intensidade de atividades produz vibrações fortes que na terminologia Sufi denomina-se jelal, e como já mencionado, trabalham como força e poder, a suavidade de atividades causa vibrações brandas chamadas jemal, que trabalham como beleza e graça. O conflito entre essas duas forças é denominado kemal, que causa destruição.
O padrão de certo e de errado, a concepção de bem e de mal e a idéia de pecado e de virtude são entendidos de maneira diferente por pessoas de diferentes raças, nações e religiões; portanto, é difícil discernir a lei que governa esses opostos. Entretanto, torna-se claro ao entendermos a lei das vibrações. Todas as coisas e seres na superfície da existência parecem estar separados uns dos outros, mas em cada plano sob a superfície, ficam mais próximos uns dos outros, e no plano mais profundo todos se tornam um. Portanto, cada perturbação causada a um pedaço da menor parte da existência na superfície, internamente afeta o todo. Assim, qualquer pensamento, fala ou ação que perturba a paz está errado, é ruim e é um pecado. Se traz paz está correto, é bom e é uma virtude. A vida sendo um domo, tem sua natureza como um domo. Uma perturbação da menor parte da vida perturba o todo e retorna como uma maldição sobre a pessoa que a causou. Toda paz produzida na superfície conforta o todo, e por consequência, retorna como paz ao produtor. Essa é a filosofia da recompensa pelas boas ações e da punição pelas más ações, dada pelas forças superiores.

domingo, 6 de setembro de 2009

Meher Baba - O primeiro impulso (God Speaks 3)

No início, a alma não tinha impressões (sanskaras) e nem consciência. Portanto, nessa fase, ou, nesse estado, a alma não tinha forma ou um corpo grosseiro, corpo sutil ou corpo mental, pois apenas a existência de impressões grosseiras, sutis e mentais (sanskaras) pode dar existência aos corpos grosseiro, sutil e mental, e apenas a existência desses corpos pode tornar possível a existência dos mundos grosseiro, sutil e mental.
Portanto, no início, a alma não tinha consciência dos corpos grosseiro, sutil e mental e também era inconsciente de seu próprio Ser (Self), e a alma então, naturalmente, não tinha nenhuma experiência dos mundos grosseiro, sutil e mental e também não tinha nenhuma experiência da Sobre-Alma (Paramatma).
Esse estado infinito, sem impressões, inconsciente e tranquilo da alma reverberou com um impulso que nós chamamos O PRIMEIRO IMPULSO (de conhecer a si mesma).
O primeiro impulso estava latente em Paramatma.
Quando comparamos Paramatma a um oceano infinito e ilimitado e quando dizemos que Paramatma teve o primeiro impulso, também poderíamos dizer, a título de comparação, que o infinito e ilimitado oceano teve o primeiro impulso ou FANTASIA.
No infinito, tanto o finito quanto o infinito estão incluídos.
Agora, esse primeiro impulso foi infinito ou finito, e num primeiro momento foi finito e então infinito, ou vice-versa?
O primeiro impulso foi o mais finito, mas ele foi o primeiro impulso do Infinito. Esse primeiro impulso mais finito foi do oceano infinito - Paramatma e a manifestação desse primeiro impulso latente mais finito do Infinito foi restrito a um ponto mais finito no infinito Oceano ilimitado.
Mas como este ponto mais finito de manifestação do primeiro impulso latente, que era o mais finito, também foi no infinito Oceano ilimitado, esse ponto mais finito de manifestação do primeiro impulso foi também ilimitado. Através deste ponto mais finito de manifestação do primeiro impulso (também mais finito), a sombra do Infinito (sombra, que sendo da Realidade, é infinita) gradualmente apareceu e prosseguiu em expansão. Esse ponto mais finito de manifestação do primeiro impulso latente é chamado de Ponto "Om" ou Ponto da Criação e esse ponto é ilimitado.
Simultaneamente com as reverberações do primeiro impulso, a primeira impressão mais grosseira surgiu, objetivando a alma como a contraparte grosseira mais absolutamente oposta e mais finita do Infinito.
Devido a essa primeira impressão mais grosseira do primeiro impulso, a alma infinita experimentou pela primeira vez. Essa primeira experiência da alma infinita foi que ela (a Alma) experimentou uma contrariedade na sua identidade com o seu estado infinito, sem impressões e inconsciente.
Essa experiência de contrariedade gerou mutabilidade na estabilidade eterna e indivisível da alma infinita e, espontaneamente, ocorreu um tipo de erupção, perturbando o equilíbrio indivisível e a tranquilidade inconsciente da alma infinita com um rechaço ou choque tremendo que impregnou a inconsciência da Alma inconsciente com a primeira consciência de sua aparente separação do estado indivisível de Paramatma. Mas a Alma, sendo infinita, a primeira consciência que foi derivada do rechaço ou choque de uma primeira impressão mais grosseira absolutamente oposta de sua aparente separação, foi naturalmente e necessariamente uma primeira consciência finita.
Essa primeira consciência derivada pela Alma é evidentemente a mais 'maximamente-finita' em proporção à experiência de seu próprio estado original infinito, absolutamente oposto.
Isso significa então que, no início, quando a infinita Alma sem impressões foi pela primeira vez impressionada, teve como sua primeira impressão uma impressão absolutamente grosseira. E a primeira consciência que ela (a alma) derivou foi a mais 'maximamente-finita'.
Simultaneamente, nesse instante, a inconsciência da Alma infinita experimentou, de fato, a primeira consciência mais 'maximamente-finita' de todas, vinda da primeira impressão mais finita.
Essa Alma infinita e eterna teve consciência, mas essa consciência através de uma impressão não foi de seu estado eterno ou de seu Ser infinito, mas foi a consciência mais-finita, através da impressão mais-grosseira.
Então, como será explicado mais tarde, se a Alma estiver consciente de impressões (sanskaras), então a alma deverá necessariamente experimentar essas impressões, e para experimentar as impressões, a consciência da alma deve experimentá-las através de um meio adequado.
Conforme forem as impressões, serão as experiências das impressões e o meio para experimentar as impressões deverá ser de acordo. Isto é, as impressões dão origem às experiências, e para experimentar as impressões o uso de um meio (veículo) adequado é preciso.
Portanto, como a Alma infinita, eterna e sem forma agora tem a primeira consciência mais 'maximamente-finita' da primeira impressão mais 'maximamente-grosseira', obvia e necessariamente essa mais 'maximamente-finita' primeira consciência da alma deve utilizar o mais 'maximamente-finito' e o mais 'maximamente-grosseiro' primeiro meio para experimentar a mais 'maximamente-grosseira' primeira impressão.

Nesta fase, cabe aqui mencionar para a limitada compreensão humana que a mais 'maximamente-finita' primeira consciência da alma, enquanto experimentando a mais 'maximamente-groseira' primeira impressão, centrou-se em um meio adequado mais 'maximamente-finito' e mais 'maximamente-grosseiro' imperceptivelmente, criando a tendência da Alma (sem forma) associar e identificar seu próprio Ser infinito e eterno com essa forma limitada mais grosseira e mais finita como seu primeiro meio (veículo).
A primeira consciência da Alma indivisível, experimentando a primeira impressão através do primeiro meio, cria uma tendência na alma de associar e identificar seu Ser eterno e infinito com a primeira forma, a mais-finita e mais-groseira, que foi como a semente da contrariedade espontaneamente semeada pelas reverberações do primeiro impulso, imperceptivelmente germinada e manifestada na forma de dualidade pela primeira vez. Quando acontece de ela associar-se e identificar a si mesma, através de sua consciência recém-adquirida, com a forma ou meio finito e grosseiro, a consciência da alma faz realmente a Alma infinita, eterna, indivisível e sem forma ter a experiência que ela é aquela forma finita e grosseira.
Assim, a consciência adquirida pela alma inconsciente, ao invés de experimentar a realidade através da unidade e identidade com a Sobre-Alma, experimenta a ilusão através da dualidade e identidade com a forma grosseira, multiplicando diversificadas e inumeráveis impressões em uma série de experiências enquanto vai se associando com a forma grosseira e gradualmente ganhando ou evoluindo mais e mais a consciência.

Seguidamente, eras após eras e ciclos após ciclos, essa cadeia de sucessivas associações e dissociações com variadas espécies de uma forma em particular segue adiante constante e progressivamente e produz inúmeras impressões diferentes a serem experimentadas pela alma consciente. Direta e indiretamente, estas associações e dissociações da consciência da alma são absolutamente essenciais para manter girando a roda da evolução da consciência. A evolução das formas grosseiras é apenas um subproduto da fábrica universal de evolução da consciência.

Para atingir o desenvolvimento completo da consciência na forma humana, o processo evolutivo teve de dar sete grandes saltos, são eles: de pedra para metal, de metal para vegetal, de vegetal para verme, de verme para peixe, de peixe para pássaro, de pássaro para animal e, finalmente, de animal para o ser humano, cada transição com características diferentes.

Por a Consciência da alma estar totalmente desenvolvida na forma humana, a evolução da forma também está completa, e agora, quando a alma consciente identifica a si mesma com a primeira forma humana de todas, nenhuma nova forma superior é desenvolvida. Em resumo, na forma humana a consciência da alma é plena e completa. O processo de evolução da consciência é levado a uma paralisação. A forma humana é a mais elevada e mais sublime forma desenvolvida durante a evolução da consciência. Assim, no ser humano a consciência está totalmente desenvolvida e a forma moldada e projetada após eras e ciclos é a mais perfeita forma ou meio. A consciência da alma, portanto, utiliza esse meio perfeito para experimentar e esgotar completamente todas as impressões para que a alma plenamente consciente torne-se desprovida de qualquer impressão que seja, sendo assim capaz de perceber seu próprio estado real, eterno e infinito na Sobre-Alma.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Lao Tzu - Tao Te Ching - Verdadeiramente Grandioso

O grande Tao flui por toda parte.
Todas as coisas nascem dele
embora ele não as crie.
Ele se derrama em seu trabalho,
mesmo assim não faz reivindicações.
Nutre mundos infinitos
e ainda assim não se prende a eles.
Sendo que está fundido com todas as coisas
e escondido em seus corações,
pode ser chamado humilde.
Uma vez que todas as coisas se esvaem para dentro dele
e apenas ele perdura,
pode ser chamado de grandioso.
Ele não está ciente de sua grandeza;
portanto é verdadeiramente grandioso.

Ramesh S. Balsekar - A natureza da Consciência


Pergunta: Essa 'fonte' da qual você fala, é separada em cada individuo ou é algo que encobre todo mundo?
.
Ramesh: É algo que encobre a todos. Está dentro de todos, de todo objeto.
.
P: Uma parte é separada e dada para mim e outra parte para outra pessoa?
.
R: Não, não. É tudo um. Essa é a totalidade da qual os místicos têm falado a respeito por centenas de anos, e que os cientistas têm falado desde que a mecânica quântica foi desenvolvida. Tudo o que há, é essa totalidade e unidade que não pode ser separada.
A Consciência impessoal é o Shiva ou Atman, ou o Ser, como Ramana Maharshi costumava dizer. E o jiva ou o ser que é o “ser egoísta”, é a consciência identificada. O que Ramana Maharshi costumava dizer é que a Consciência é o oceano todo. A Consciência universal ou o Ser, é o oceano e o jiva ou a consciência identificada é uma bolha. Mas a bolha em si, enquanto permanece uma bolha, está aparentemente separada. Entretanto, o que é a bolha senão água? E quando a bolha estoura, para onde ela vai? Ela se torna o oceano.
Quando a compreensão acontece, não faz diferença quais palavras são usadas ou que mestre as usou. Cada mestre usou palavras diferentes apenas por uma razão: sua audiência era diferente, as circunstâncias diferentes, as pessoas diferentes e os tempos diferentes.
Nisargadatta me disse uma vez e fiquei surpreso quando ele disse: 'Muitos de meus colegas não gostam do que eu digo, pois eu não estou repetindo como um papagaio as palavras que meu guru usava. O que sai de meus lábios é o que você precisa, não o que os meus colegas e eu precisamos.” O que me surpreendeu foi quando ele adicionou: “Quando você falar, o que você dirá não será uma repetição do que eu estive dizendo”. Assim, muitas pessoas que costumavam ir ao Nisargadatta não gostam do que eu digo. Eles falam: “Isso não é o que o Maharaj disse!” É claro que não é o que ele disse!

P: De acordo com o que você diz, a Consciência é todas as coisas.

R: Sim.

P: A Consciência criou o 'eu'?

R: Sim. O 'eu' não é nada além da Consciência. A forma é uma outra questão. Mas o 'eu' ainda é a Consciência que criou a identificação dentro do corpo na forma de um 'eu'.

P: Se o sentido de 'eu' vem da Consciência, a Consciência está ali, não é?

R: Ela está ali. Ela está aqui, e estará aqui mesmo quando este organismo corpo-mente não estiver aqui. Esse é o ponto. É por isso que a questão básica do Zen é: “Qual era a sua face original? Qual era a sua natureza real antes de os seus pais nascerem?” Sua natureza verdadeira não começou com o seu nascimento e não irá perecer com a morte do corpo.

P: No livro 'Antes da Consciência', Nisargadatta Maharaj diz: “a Consciência é tudo o que há”. Ele diz isso uma porção de vezes, mas às vezes ele fala da Consciência de uma maneira negativa, que deveríamos ir antes da Consciência. Ele fala dela de duas maneiras diferentes, como o Absoluto e como algo que está nos impedindo. Ele sugere que temos de ir além da Consciência. Eu não entendo.

R: A Consciência, quando ele fala dela como um obstáculo, é a Consciência identificada. Antes da Consciência é a Consciência-em-repouso, que é a nossa natureza real. Então ele fala sobre o 'numenal' e o fenomenal. Na fenomenalidade, este sentido de presença é o estado desperto, e é quando sua mente está ativa. Então o sentido de presença que ele considera ser uma obstrução, é o sentido de presença no estado desperto, que implica a contínua conceitualização da mente. A mente não conceitualiza, não pode conceitualizar no sono profundo, porque o sentido de presença está ausente. No 'Antes da Consciência', o que ele fala a respeito, é a ausência de ambos, a presença do sentido de presença e da ausência do sentido de presença onde a questão da Consciência não surge de maneira alguma. Pois no estado de repouso, a Consciência nem mesmo está ciente de si mesma.

P: Por que ela não está ciente de si mesma?

R: Porque não existe 'outro' (algo separado) para estar ciente.

P: Então, o antes da Consciência é a Consciência-em-repouso? E não significa a ausência dela. Não é apenas a pura Consciência?

R: É a pura Consciência. Esse estado não está negando a Consciência. Ele nega essa alternância da presença e da ausência da Consciência que ocorre apenas na fenomenalidade, portanto está negando a própria fenomenalidade.

P: Quem é que faz essa negação da fenomenalidade?

R: É a mente. Portanto, a Realidade última só pode existir quando ocorre a negação do próprio negador. Quando a própria mente é negada, não há nenhuma 'pessoa' para negar. Não há nenhuma 'pessoa' para pensar sobre um conceito a respeito da realidade. Esse é um estado onde nenhum conceito é possível.

P: Essa é a pura Consciência?

R: Sim, você pode chamá-la de pura Consciência, Consciência-em-repouso.

P: Anterior à consciência identificada?

R: Contanto que você a entenda, não há necessidade de nenhuma palavra.

P: Ela também é impura?

R: A partir do momento em que você a nomeia pura Consciência, ela fica impura.

P: Você diz que isto é “tudo um mundo de sonhos, uma ilusão”, e que nós criamos toda manifestação. Ao mesmo tempo você diz que para que a mente e a Consciência possam aparecer, tem de haver um corpo. O que vem primeiro, o corpo ou a Consciência?

R: Tudo o que existe é a consciência. Naquele estado original chame-o de realidade, chame-o de absoluto, chame-o de um nada, naquele estado não havia razão de estar ciente de nada. Assim a Consciência-em-repouso não estava ciente de si mesma. Ela tornou-se ciente de si mesma apenas quando esse repentino sentimento 'Eu Sou' surgiu. O 'Eu Sou' é o sentimento impessoal de estar ciente. E foi aí que a Consciência-em-repouso tornou-se Consciência-em-movimento, quando a energia potencial tornou-se energia de fato. Elas não são duas. Nada separado sai da energia potencial.
A Consciência-em-movimento não está separada da Consciência-em-repouso. A Consciência-em-repouso torna-se a Consciência-em-movimento, e esse momento que a ciência chama de Big Bang o místico chama de o repentino surgimento da consciência (awareness).

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Jalaluddin Rumi - O Ser que compartilhamos

A sede está brava com a água. A fome, desgostosa
com o pão. A caverna não quer nada relacionado com

o sol. É dessa maneira estúpida e autoderrotadora
que temos estado. Uma mina de ouro está

nos chamando para dentro de seu templo. Em vez disso, nos
curvamos e continuamos a pegar pedras do

chão. Cada coisa tem um brilho como do ouro,
mas deveríamos nos voltar para a fonte! A

origem é o que realmente somos. Eu coloco um pouco
de vinagre no mel que ofereço. Um pouco de

repreensão torna o êxtase mais familiar. Mas
olhe, peixe, você já está no oceano:

apenas nadar aí torna-o amigo da
glória. Esses rancores são a respeito do que? Você

é Benjamim. José colocou uma taça de ouro
no seu saco de grãos e acusou-lhe de ser

um ladrão. Agora ele lhe puxa de canto e diz,
“Você é meu irmão. Sou uma oração. Você é

o amém.” Movemos-nos por regiões eternas, e ainda
preocupamo-nos a respeito de posses aqui. Esta é a

prece de cada um: És a fonte da minha
vida. Separas a essência da lama.

Honras minha alma. Trazes rios das
nascentes das montanhas. Clareias meus olhos. O

vinho que ofereces leva-me de mim mesmo para dentro
do Ser que compartilhamos. Fazer isso é religião
.

Hafiz - E sem motivo algum . . .

E sem motivo algum
Comecei a pular como uma criança.

E sem motivo algum
Tornei-me uma folha
Que foi carregada tão alto que
Beijei a boca do céu
E me dissolvi.

E sem motivo algum
Mil pássaros escolheram minha cabeça
Como sua mesa de conferências,
Começaram a passar suas taças de vinho
E suas coleções de canções por toda parte.

E por todo motivo na existência
Comecei eternamente
A rir e amar!

Quando me torno uma folha
E começo a dançar,
Corro para beijar nosso lindo Amigo
E me dissolvo na Verdade
Que eu sou.

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Bhagavan Ramana Maharshi - Manter-se no 'eu sou' com esforço é Vichara (investigação de Si)


Devoto: Como podemos realizar o Ser (o Si mesmo real)?

Bhagavan: Que Ser? Descubra.

D: O meu, mas, quem sou eu?

B: É você quem deve descobrir.

D: Eu não sei.

B: Basta pensar sobre a questão. Quem é esse que diz: 'eu não sei'? Quem é o 'eu' na sua declaração? O que não é conhecido?

D: Alguém ou algo em mim.

B: Quem é esse alguém? Em quem?

D: Talvez algum poder.

B: Descubra.

D: Por que eu nasci?

B: Quem nasceu? A resposta é a mesma para todas as suas perguntas.

D: Quem sou eu, então?

B: Você veio para me examinar? Você deve dizer quem você é.

D: Por mais que eu tente, parece que não pego o 'eu'. Ele nem sequer é claramente perceptível.

B: Quem é esse que diz que o 'eu' não é perceptível? Existem dois 'eus' em você, um não é perceptível para o outro?

D: Em vez de indagar: 'Quem sou eu?' Posso fazer a pergunta a mim mesmo: 'Quem é você?' Para que a minha mente possa ficar fixada em você, que é quem eu considero ser Deus na forma de Guru? Talvez eu chegasse mais perto do objetivo de minha busca através dessa investigação do que ficar me perguntando: "Quem sou eu?"

B: Qualquer forma que sua investigação vier a tomar, você deve finalmente chegar ao 'eu' uno, o Ser. Todas essas distinções feitas entre 'eu' e 'você', mestre e discípulo, são apenas um sinal de ignorância. Apenas o 'Eu' Supremo é. Pensar o contrário é enganar a si mesmo. Portanto, uma vez que seu objetivo é transcender aqui e agora estas superficialidades da existência física através da auto-investigação, onde está o mérito de fazer distinções entre 'você' e 'eu', que dizem respeito apenas ao corpo? Quando você volta a mente para dentro, buscando a fonte do pensamento, onde está o "você" e o 'eu'? Você deve procurar e deve ser o Ser que inclui tudo.

D: Mas, não é engraçado que o "eu" deve estar à procura do 'eu'? A inquirição, 'Quem sou eu?' não vem a torna-se no final uma fórmula vazia? Ou devo colocar a questão para mim infinitamente, repetindo-a como um mantra?

B: Auto-inquirição (vichara) certamente não é uma fórmula vazia, é mais do que a repetição de qualquer mantra. Se a investigação: 'Quem sou eu?' fosse mero questionamento mental, não seria de muito valor. O propósito em si da auto-investigação é concentrar a mente toda na fonte dela. Não é, portanto, um caso de um "eu" à procura de um outro "eu". Muito menos é a auto-inquirição uma fórmula vazia, pois involve uma intensa atividade da mente toda para mantê-la firmemente posicionada na pura consciência de si. Vichara (Auto-inquirição) é o único meio infalível, o único direto, para realizar o incondicionado Ser absoluto que você realmente é.

D: Quando leio as obras de Sri Bhagavan percebo que a investigação é dita como sendo o único método para a realização.

M: Sim, isso é vichara.

D: Como é que deve ser feita?

M: O questionador deve admitir a existência de seu ser. "Eu Sou" é a realização. Seguir a pista até a Realização é vichara. Vichara e realização são o mesmo.

D: Isso é elusivo. Sobre o que devo meditar?

M: Meditação requer um objeto para meditar, enquanto que no vichara há apenas o sujeito sem o objeto. A meditação difere do vichara dessa forma.

D: Não é dhyana (meditação) um dos processos mais eficientes para a Realização?

M: Dhyana é a concentração em um objeto. Ela cumpre a finalidade de manter afastados os pensamentos diversos e de fixar a mente em um pensamento único, o qual também deve desaparecer antes da Realização. Mas a Realização não é nada novo a ser adquirido. Ela já está aí, mas obstruída por uma tela de pensamentos. Todos os nossos esforços são dirigidos para levantar essa tela e a realização será revelada. Se buscadores verdadeiros são aconselhados a meditar, muitos podem ir embora satisfeitos com o conselho. Mas alguém dentre eles pode virar-se e perguntar: "Quem sou eu para meditar sobre um objeto?" Tal pessoa deve ser instruída a encontrar o Ser. Esse é o objetivo final. Isso é Vichara.
D: O vichara atuará sozinho, na ausência de meditação?

M: Vichara é o processo e também o objetivo. "Eu sou" é a meta e a Realidade final. Manter-se nele com esforço é vichara. Quando é espontâneo e natural é a Realização.

D: Como conhecer o poder de Deus?

M: Você diz "eu sou". É isso. O que mais pode dizer 'eu sou'? Nosso próprio Ser (nossa própria existência) é o poder Dele. O problema surge apenas quando a pessoa diz: "Eu sou isso ou aquilo, tal e tal." Não faça isso - Seja você mesmo. Isso é tudo.

sábado, 29 de agosto de 2009

G. I. Gurdjieff - 3 de agosto de 1944 - O exercício de sentir o 'eu sou' em sete partes do corpo

Gurdjieff: Certa vez eu dei um exercício, mas vejo que ninguém tem feito e que isso não os levou a nenhum resultado. Eu irei repeti-lo. Talvez haja alguém mais inteligente que irá entendê-lo e cristalizá-lo. É o exercício de ocupar o corpo. Talvez alguém se lembre? 'Eu sou'. Quando você diz 'eu' você obtém um eco. Todos entendem o que essa sensação é. Neste exercício não é uma questão disso. Temos que sentir esse eco primeiro na perna direita, depois na perna esquerda, depois no braço direito, depois no esquerdo, no abdômen, no tórax. Faça essa série três vezes. Então na cabeça uma vez. Três vezes o todo, e uma a cabeça. E repita se você tiver tempo. Duas vezes nos seis lugares. Na terceira vez nos sete lugares.
Pergunta: Devemos acompanhar com a respiração? Tendemos a fazê-lo com a respiração.

G: Não faça com a respiração. Isso lhe daria um tempo errado. Tome o tempo necessário para respirar e para sentir. Isso então será a sua medida. Você entende? Represente para si mesmo, então sinta na perna direita, então mude. Não preste atenção na respiração. O tempo se estabelecerá por si mesmo. Isso depende de muitas coisas, do cansaço, de muitas outras coisas. A respiração não tem nada a ver com isso. Não a conecte com esse exercício.
P: Deveríamos considerar cada membro na sua totalidade em uma respiração ou várias respirações para cada?
G: Sim, cada membro na sua totalidade.
P: Ao dizer 'eu' ou 'sou'?
G: Ambos. Mas o 'eu' é independente. Você deve sentir o eco dele na perna. Você diz 'eu sou', mas em vez de mandar o eco do 'eu' no corpo todo, você sente ele na perna. Faça esse exercício inteiramente independente do exercício de ocupar o corpo. Um vez que o tiverem feito, vocês farão este de 'ocupar' ainda melhor.
P: Devemos parar a sensação na perna?

G: Sim, apenas a perna.

P: Devemos dizer em voz alta?

G: Não, internamente. Sinta-o. Nesse exercício a perna é o corpo. O resto faz o papel da cabeça. A perna esquerda faz o papel do corpo, e o resto, incluindo a perna direita, é a cabeça.
P: Esquecemos o corpo?

G: Não você o sente como sua cabeça. No lugar da cabeça – tudo junto.
Vocês fizeram esse exercício? Devem ter ficado surpresos no começo. Como podemos sentir nosso 'eu' na perna? Quem dirá que isso é possível? Apenas aquele que fez o exercício pode dizer. Sem prática é absurdo. Quem fez?
P: Eu fiz. No início era muito difícil sentir o 'eu', era muito comprido e então, uma vez que conseguia sentir na perna direita, era mais fácil nas outras partes.

G: Ele tem lhe mostrado algo novo, ou sugerido alguma questão?

P: Sim, é que minhas pernas tomam pouca parte no exercício, que a sensação no plexo solar era mais forte que no resto do corpo.

G: Bem, então você não precisa de ajuda, detalhes suplementares? Então continue.

P: Eu realmente tentei, mas não tive sucesso. Não consegui relaxar. Assim que eu tentava sentir o 'eu' na cabeça, eu já não me sentia mais relaxado. Eu já não tinha a sensação de relaxamento.
G: A razão é que você não consegue relaxar-se bem. Antes de cada exercício, você deve usar dez minutos para relaxar-se.

P: Eu tentei. Eu consegui fazer com o rosto.

G: O rosto é algo pequeno. Para aquietar as suas associações, você deve relaxar toda a sua presença, não apenas uma parte.

P: Eu pensei que tínhamos de relaxar uma parte após a outra, começando do topo.

G: É exatamente o oposto. Você deve começar com os pés e ir subindo. Tente assim. Você começa com a cabeça, e ela se contrai novamente e a contração desce por toda parte. Comece de novo e relaxe a partir dos pés.

P: Eu gostaria de perguntar, se devemos fazer assim. Antes de sentir meu 'eu' nas sete partes do corpo, se preciso sentí-lo em toda a minha presença. Se não faço assim, o eco do 'eu' permanece intelectual. Eu tentei sentir o 'eu' em minha presença toda. E o eco veio melhor do que quando eu começo direto. Poderíamos fazer assim?
G: Não, deite, bem relaxado em todas as suas partes e daí você começa.
P: De uma vez?

G: Depois que estiver totalmente relaxado, você faz o exercício, sinta o 'eu' em cada parte. E em todos os lugares deve haver a mesma intensidade, a mesma quantidade, o mesmo ritmo respiratório. Fazendo com que não haja diferença em nenhum lugar. Uma vez que você puder fazer isso separadamente em cada parte, então pode mobilizar todo o: 'eu sou'.
Posso repetir isso muitas vezes. Não filosofe. É bem simples. Só se pode entendê-lo ao fazê-lo bem, quando se está completamente relaxado. Muitas pessoas têm maus caráteres e são nervosas. Esse relaxamento irá aquietá-las e irá levar embora tudo o que elas tem nelas que é fútil e idiota.
P: Esse exercício tem me mostrado que eu nunca soube como relaxar. Essa palavra não teve significado algum para mim até agora. O relaxamento depende do 'eu' todo, não é apenas físico.

G: Sim, não é apenas físico, é a presença total que é formada de diferentes partes. Quando eu digo a presença total, quero dizer o organismo todo, o sistema nervoso, o mecanismo físico, tudo isso. A pessoa deve relaxar essas partes conscientemente. É apenas possível conscientemente. Subconscientemente a pessoa começa a ter associações na Ásia, na América... A pessoa viaja, ela está aqui e ali. Tente não começar com os pensamentos, em imaginação. Tente, fique aqui. Tudo que lhe interromper mande para o diabo. Mesmo Deus, o anjo, o diabo, tudo isso para o diabo. Considere o trabalho de aquietar a si mesmo como a coisa mais importante. É apenas com essa atitude que você irá obter resultados. Você chegará à algo. E apenas chegará lá através de repetição, ao começar novamente um grande número de vezes.

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Nisargadatta Maharaj - O 'eu sou' é uma pequena semente que irá tornar-se uma grande árvore


Maharaj: Você pode se sentar no chão? Precisa de uma almofada? Tem alguma pergunta? Não que você precise perguntar, você pode também ficar quieto. Ser, apenas ser (estar presente), é importante. Você não precisa perguntar nada, nem fazer nada. Essa maneira aparentemente preguiçosa de passar o tempo é muito respeitada na Índia. Significa que, por hora, você está livre da obsessão com 'o que vem a seguir'. Quando você não está com pressa e a mente está livre de ansiedades, ela torna-se quieta e no silêncio algo pode ser ouvido, o qual ordinariamente é demasiado fino e sutil para a percepção. A mente deve estar aberta e tranquila para ver. O que estamos tentando fazer aqui é trazer nossas mentes para o estado correto para compreender o que é real.

Pergunta: Como aprendermos a cortar as preocupações?

M: Você não precisa se preocupar com suas preocupações. Apenas seja. Não tente ficar quieto; não torne o "ficar quieto" uma tarefa a ser executada. Não se inquiete por causa do seu objetivo de "alcançar a quietude", não se sinta miserável a respeito de "ser feliz". Apenas esteja ciente de que você é, e permaneça ciente - não diga: 'sim, eu sou; e o que vem depois?' Não há 'o depois' no 'eu sou'. Ele é um estado atemporal.

P: Se é um estado atemporal, ele vai afirmar-se de qualquer maneira.

M: Você é o que você é, atemporalmente; mas de que serve isso a menos que você saiba disso e aja de acordo com isso? Sua cumbuca de mendigar pode ser de ouro puro, mas enquanto você não souber disso, você é um mendigo. Você deve conhecer o seu valor interior e confiar nele e expressá-lo no sacrifício diário dos desejos e dos medos.

P: Se eu conhecer a mim mesmo, não terei desejos e medos?

M: Por algum tempo os hábitos mentais podem se prolongar, a despeito da nova visão; o hábito de ansiar pelo passado conhecido e temer o futuro desconhecido. Quando você sabe que eles são apenas da mente, você pode ir além deles. Quando você tem todos os tipos de idéias sobre si mesmo, você conhece a si mesmo através da névoa dessas idéias; para conhecer a si mesmo como você é, abandone todas as idéias. Você não pode imaginar o gosto da água pura, você só pode descobri-lo ao abandonar todos os sabores.
Enquanto você estiver interessado no seu modo atual de vida, você não vai abandoná-lo. A descoberta não pode vir enquanto você se agarrar ao familiar. É só quando você perceber plenamente a imensa tristeza de sua vida e se revoltar contra ela, que uma saída poderá ser encontrada.

P: Eu posso ver agora que o segredo da vida eterna da Índia encontra-se nessas dimensões de existência, das quais a Índia sempre foi a detentora.

M: É um segredo aberto e sempre houveram pessoas dispostas e preparadas para compartilhá-lo. Professores - existem muitos; discípulos sem medo - muito poucos.

P: Eu estou muito disposto a aprender.

M: Aprender palavras não é suficiente. Você pode saber a teoria, mas sem a experiência real de si mesmo como sendo o centro impessoal e incondicional da existência, do amor e da felicidade, o conhecimento apenas verbal é estéril.

P: Então, o que devo fazer?

M: Tente ser, apenas ser. A palavra muito importante é "tente". Dispenda bastante tempo diário para se sentar calmamente e tentar, apenas tentar ir além da personalidade, com seus vícios e obsessões. Não me pergunte como, isso não pode ser explicado. Você apenas continua tentando até conseguir. Se você perseverar, não poderá haver falha. O que importa acima de tudo é a sinceridade, a seriedade; você tem estado realmente farto de ser a pessoa que você é, agora veja a necessidade urgente de se livrar desta auto-identificação desnecessária com um conjunto de memórias e hábitos. Essa firme resistência contra o desnecessário é o segredo do sucesso. Afinal, você é o que você é a cada momento de sua vida, mas você nunca está consciente disso, com exceção, talvez, no momento que acorda do sono. Tudo o que você precisa é estar ciente de ser (de estar existindo), não como uma declaração verbal, mas como um fato sempre presente. A consciência de que você é irá abrir seus olhos para o que você é. É tudo muito simples. Primeiro de tudo, estabeleça um contato constante consigo mesmo, esteja com você mesmo o tempo todo. Dentro da autoconsciência todas as bênçãos fluem. Comece como um centro de observação, de cognição deliberada, e transforme-se num centro de amor em ação. O "Eu sou" é uma pequena semente que irá tornar-se uma grande árvore - muito naturalmente, sem nenhum traço de esforço.

P: Eu vejo tanto mal em mim mesmo. Não devo mudar isso?

M: O mal é a sombra da desatenção. Na luz da consciência de si mesmo, ele vai murchar e cair.
Toda a dependência dos outros é inútil, pois o que os outros podem dar eles podem levar embora. Somente o que é seu desde o início permanecerá seu mesmo no final. Não aceite orientação que não venha de dentro, e mesmo assim, peneire todas as memórias pois elas irão enganar você. Mesmo que você seja totalmente ignorante a respeito das maneiras e dos meios, mantenha-se quieto e olhe para dentro; a orientação certamente virá. Você nunca ficará sem saber qual deverá ser o seu próximo passo. O problema é que você pode fugir disso. O Guru está lá para dar-lhe coragem, devido à experiência e ao sucesso dele. Mas apenas o que você descobre através de sua própria consciência, do seu próprio esforço, será de uso permanente para você. Lembre-se, nada que você perceba é de si mesmo. Nada de valor pode vir de fora, é apenas o seu próprio sentimento e entendimento que são relevantes e reveladores. As palavras, ouvidas ou lidas, só irão criar imagens em sua mente, mas você não é uma imagem mental. Você é o poder de percepção e ação por trás e além da imagem.

P: O que fez você decidir se tornar um professor?

M: Eu fui tornado um professor ao começar a ser chamado assim. Quem sou eu para ensinar e para quem? O que eu sou, você é, e aquilo que você é - eu sou. O 'eu sou' é comum a todos nós, para além do "eu sou" há uma imensidão de luz e de amor. Nós não a vemos porque olhamos para outros lugares, só posso apontar para o céu, ver a estrela é trabalho seu. Alguns levam mais tempo antes de verem a estrela, alguns menos; depende da clareza de sua visão e sua seriedade e sinceridade na busca. Esses devem ser próprios de você, - eu só posso incentivar.

P: O que devo fazer quando me torno um discípulo?

M: Cada professor tem seu próprio método, geralmente moldado nos ensinamentos do Guru dele e na maneira como ele próprio atingiu a realização, e bem como na sua própria terminologia. Dentro desse quadro, são feitos ajustes para a personalidade do discípulo. Ao discípulo é dada total liberdade de pensamento e de questionamento e ele é encorajado a questionar até alcançar o contentamento de seu coração. Ele deve estar absolutamente certo da capacidade e da competência de seu Guru, caso contrário, sua fé não vai ser absoluta nem a sua ação completa. É o absoluto em você que o leva ao absoluto além de você - a verdade, o amor, o altruísmo absolutos são os fatores determinantes na autorealização. Com seriedade eles podem ser alcançados.

P: Quais são os sinais do progresso na vida espiritual?

M: A liberdade de toda ansiedade; uma sensação de tranquilidade e alegria; profunda paz interior e energia abundante exteriormente.

P: Como você conseguiu isso?

M: Encontrei isso tudo na santa presença de meu Guru (Siddharameshwar Maharaj) - Eu não fiz nada sozinho. Ele me disse para ficar quieto - e eu fiz isso - tanto quanto eu pude.

P: A sua presença é tão forte quanto a dele?

M: Como vou saber? Para mim, a dele é a única presença. Se você está comigo, está com ele.

P: Cada Guru irá referir-se a seu próprio Guru. Onde é o ponto de partida?

M: Há um poder no universo trabalhando para a iluminação e a liberação. Chamamo-lo de Sadashiva, o qual está sempre presente nos corações dos homens. É o fator unificador. A unidade liberta. A liberdade une. Em última análise, nada é meu ou seu - tudo é nosso. Basta ser um com você mesmo e você será um com tudo, estará em casa no universo todo.

P: Você quer dizer que todas essas glórias virão com a simples permanência na sensação de "eu sou"?

M: É o simples que é certo, não o complicado. De certo modo, as pessoas não confiam no simples, no fácil, no sempre disponível. Por que não testar honestamente o que eu digo? Pode parecer muito pequeno e insignificante, mas é como uma semente que cresce em uma árvore frondosa. Dê a si mesmo a chance!

P: Vejo tantas pessoas aqui em silêncio. Para quê eles vieram?

M: Para encontrarem a si mesmos. Em casa, o mundo é demais para eles. Aqui nada os perturba; eles têm a chance de se afastar de suas preocupações diárias e entrar em contato com o essencial em si mesmos.

P: Se eu tirar a minha atenção daquilo que acontece, eu vou viver através do quê?

M: Novamente, isso é como perguntar: 'O que devo fazer se eu parar de sonhar?' Pare e veja. Você não precisa ficar ansioso: "Qual é a próxima coisa?" Sempre há a próxima coisa. A vida nem começa nem termina: imóvel - ela se move, momentânea - ela dura. A luz não pode ser esgotada, mesmo se inúmeras imagens forem projetadas por ela. Assim, a vida preenche todas as formas até a borda e retorna à sua fonte quando a forma se rompe.

P: Se a vida é tão maravilhosa, como poderia acontecer a ignorância?

M: Você quer tratar a doença sem ter visto o paciente! Antes de perguntar sobre a ignorância, por que você não pergunta em primeiro lugar, quem é o ignorante? Quando você diz que você é ignorante, você não sabe que você impôs o conceito de ignorância sobre o estado atual de seus pensamentos e sentimentos. Examine-os conforme eles ocorrerem, dê a eles toda a sua atenção e você verá que não existe algo como a ignorância, apenas desatenção. Dê atenção ao que preocupa você, isso é tudo. Afinal, preocupação é dor mental e a dor é invariavelmente um chamamento por atenção. No momento que você dá atenção, o chamamento por ela cessa e a questão da ignorância, dissolve-se. Em vez de querer uma resposta para sua pergunta, descubra quem está fazendo a pergunta e o que a faz perguntá-la. Você vai logo descobrir que é a mente, instigada pelo medo da dor, que faz a pergunta. E no medo há memória e antecipação, passado e futuro. A atenção traz você de volta ao presente, ao agora, e a presença no agora é um estado sempre à mão, mas raramente observado.

P: Você está reduzindo o sadhana (a prática espiritual) à simples atenção. Como é que outros professores ensinam cursos difíceis e muito demorados?

M: Os Gurus geralmente ensinam sadhanas pelos quais eles mesmos tenham atingido seu objetivo, qualquer que seja seu objetivo. Isso é natural, pois o seu próprio sadhana eles conhecem intimamente. Fui ensinado a dar atenção ao meu sentido de "eu sou" e descobri que isso era extremamente eficaz. Portanto, posso falar sobre isso com plena confiança. Mas muitas vezes as pessoas vêm com seus corpos, cérebros e mentes tão mal administrados, pervertidos e fracos, que o estado de atenção sem forma está fora de seu alcance. Em tais casos, alguma demonstração mais simples de seriedade é adequada. A repetição de um mantra, ou focar o olhar numa foto irá preparar seus corpos e mentes para uma busca mais profunda e direta. Afinal, é a seriedade e sinceridade que são indispensáveis, o fator crucial. O Sadhana é apenas um vaso e ele deve ser preenchido até a borda com seriedade, que é na verdade - amor em ação. Pois nada pode ser feito sem amor.

P: Nós amamos apenas a nós mesmos.

M: Se fosse assim, seria ótimo! Ame a si mesmo sabiamente e você vai chegar ao cume da perfeição. Todo mundo ama o seu corpo, mas poucos amam o seu Ser real.

P: O meu Ser real precisa do meu amor?

M: Seu Ser real é o amor em si e seus muitos amores são reflexos dele de acordo com a situação no momento.

P: Nós somos egoístas, conhecemos apenas o amor-próprio.

M: É bom o bastante para um começo. De qualquer modo, deseje o bem a você mesmo. Pense a respeito, sinta profundamente o que é realmente bom para você e lute por isso com seriedade. Muito em breve você vai descobrir que o real é o seu único bem.

P: Ainda assim eu não entendo por que os vários Gurus insistem em prescrever sadhanas complicados e difíceis. Eles não conhecem nada melhor?

M: Não é o que você faz, mas o que você pára de fazer que importa. As pessoas que começam seu sadhana estão tão fervorosas e agitadas, que têm que estar muito ocupadas para se manterem no caminho. Uma rotina que absorva é boa para eles. Depois de algum tempo, eles se acalmam e desviam-se do esforço. Em paz e silêncio a casca do 'eu' se dissolve e o interior e o exterior tornam-se um. O sadhana real é sem esforço.



M: A essência da escravidão é que você não entendeu realmente que você está sonhando – é a mistura do real com o irreal. No seu atual estado apenas o sentido 'eu sou' refere-se à realidade, o "o quê eu sou” e o "como eu sou" são ilusões impostas pelo destino, ou pelo acidente.

P: Quando é que o sonho começou?

M: Parece ser sem princípio, mas na verdade é só agora. De momento em momento você está renovando-o. Uma vez que você viu que está sonhando, você deveria acordar. Mas você não vê, porque você quer que o sonho continue. Chegará o dia em que você vai desejar que o sonho termine, com todo seu coração e mente e estará disposto a pagar qualquer preço; o preço será o desapego e desprendimento, a perda de interesse no próprio sonho.
As pessoas são diferentes. Mas todos são confrontados com o fato de sua própria existência. "Eu sou" é o fato derradeiro; 'Quem sou eu?" é a questão fundamental para a qual todos têm de encontrar uma resposta.

P: A mesma resposta?

M: A mesma em essência, variada na expressão.