sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Ramesh S. Balsekar - A Consciência, o Único 'Capital'

Nisargadatta Maharaj muitas vezes vem com a declaração de que a consciência é o único 'capital' com o qual um ser senciente nasce. Isso, diz ele, é a posição aparente. A situação real, no entanto, é que o que nasce é a consciência, que precisa de um organismo no qual manifestar-se, e esse organismo é o corpo físico. O que é que dá a senciência — a capacidade de sentir as sensações, de responder aos estímulos — a um ser senciente? O que é isso que distingue uma pessoa que está viva de uma que está morta? É, evidentemente, o sentido de ser (o sentido de existência), o conhecimento de estar presente, a consciência, o espírito vivificante que anima a construção física do corpo.

É a consciência, de fato, que se manifesta em formas individuais e dá-lhes a aparente existência. Nos seres humanos surge o conceito de um "eu" separado, através dessa manifestação. Em cada indivíduo o Absoluto é refletido como essa consciência (awareness), e assim, a pura Consciência (awareness) torna-se a autoconsciência, ou a consciência (consciousness). O universo objetivo é em fluxo contínuo, constantemente projetando e dissolvendo inúmeras formas. Sempre que uma forma é criada e é infundida com vida (Prana), a consciência (Chetana) aparece, simultanea e automaticamente, pelo reflexo da Consciência Absoluta na matéria. A Consciência, e isso deve ser claramente entendido, é um reflexo do Absoluto contra a superfície da matéria, trazendo à tona uma sensação de dualidade. Diferentemente, a pura Consciência (awareness), o estado Absoluto, é sem início e sem fim, não tendo a necessidade de qualquer suporte além de Si mesmo. A Consciência (awareness) se torna a consciência (consciousness) apenas quando tem um objeto contra o qual se refletir. Entre pura Consciência (awareness) e Consciência refletida como consciência (consciousness), diz Maharaj, existe uma lacuna que a mente não pode cruzar. O reflexo do sol em uma gota de orvalho não é o sol! A consciência manifesta é limitada ao tempo, uma vez que desaparece assim que a construção física na qual ela habita chega ao fim. No entanto, de acordo com Maharaj, ela é o único capital com o qual um ser senciente nasce. E sendo a consciência manifesta a sua única ligação com o Absoluto, ela se torna o único instrumento pelo qual o ser senciente pode esperar obter uma libertação ilusória do 'indivíduo' que ele acredita ser. Ao ser um com sua consciência e ao tratá-la como sua Atma, seu Deus, ele pode esperar alcançar aquilo que ele pensa ser o Inatingível. Qual é a substância concreta dessa consciência animadora? Obviamente, ela deve ser um material físico, pois na falta de uma forma física ela não pode sobreviver. A consciência manifesta pode existir somente enquanto sua morada, o corpo, for mantida em uma condição sadia e habitável. Embora a consciência seja um reflexo do Absoluto, ela é limitada ao tempo e pode ser sustentada somente pelo material dos alimentos, composto por cinco elementos, que é o que o corpo físico é. A consciência reside em um corpo saudável e abandona-o quando ele está decadente e moribundo. O reflexo do sol pode ser visto apenas em uma gota de orvalho clara, não em uma enlameada. Maharaj diz frequentemente que podemos observar a natureza e a função da consciência em nossa rotina diária dos estados de sono, sonhos e vigília. No sono profundo a consciência retira-se em um estado de repouso, por assim dizer.
Quando a consciência está ausente, não há para a pessoa nenhum sentido de sua existência ou presença, muito menos a existência do mundo e seus habitantes, ou de qualquer ideia sobre aprisionamento e libertação. Isso é assim porque o próprio conceito de 'eu' está ausente. No estado de sonhos, uma partícula de consciência começa a mover-se — a pessoa ainda não está totalmente acordada — e, então, em uma fração de segundo, nessa partícula de consciência é criado todo um mundo de montanhas e vales, rios e lagos, cidades e vilas com prédios e pessoas de várias idades, incluindo aí o próprio sonhador.

E o que é mais importante: o sonhador não tem controle sobre o que as figuras sonhadas estão fazendo! Em outras palavras, um novo mundo de vida é criado em uma fração de segundo, fabricado a partir de memória e imaginação apenas por um único movimento naquela partícula de consciência. Imagine, portanto, diz Maharaj, o extraordinário poder dessa consciência, da qual uma mera partícula pode conter e projetar um universo inteiro. Quando o sonhador desperta, o mundo de sonhos e as figuras sonhadas desaparecem. O que acontece quando o estado de sono profundo bem como o de sonhos terminam e a consciência aparece novamente? A sensação imediata, em seguida, é de existência e presença, não a presença de 'mim', mas a presença como tal. Logo em seguida, entretanto, a mente assume o controle e cria o "eu" - conceito e consciência do corpo. Maharaj nos diz repetidamente que estamos tão acostumados a pensar em nós mesmos como sendo corpos que têm consciência, que achamos muito difícil aceitar ou mesmo entender a posição real. Na verdade é a consciência que se manifesta em inúmeros organismos.
Portanto, é essencial perceber que o nascimento e morte são apenas o início e o final de uma corrente de movimentos na consciência, interpretados como eventos no espaço-tempo. Se pudermos dar-nos conta disso, poderemos também perceber que em nosso estado Prístino original somos puramente existência-consciência-graça, e quando em contato com a Consciência, somos apenas a testemunha (e totalmente à parte) dos vários movimentos na Consciência. Esse é um fato incontestável, porque, obviamente, não podemos ser o que percebemos; o percebedor tem de ser diferente daquilo que ele percebe.


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A Prova da Verdade

Pode haver alguma prova da Verdade? Maharaj, por vezes, coloca essa questão como que para ele mesmo. Pode a Verdade ser compreendida intelectualmente? Além de um intelecto afiado, diz Maharaj, o aspirante deve ter fé para capacitá-lo a compreender os fundamentos básicos da Verdade. E a fé deve ser do tipo que pode aceitar a palavra do Guru como a própria Verdade de Deus. A fé é o primeiro passo e nenhum progresso adicional é possível a menos que o primeiro passo seja dado. Há pessoas simplórias, que, embora não sejam dotadas de um intelecto afiado, têm fé abundante. Maharaj dá-lhes um Mantra e pede-lhes para cantá-lo e meditar até que sua psique seja purificada o suficiente para receber o conhecimento.
Com os intelectuais Maharaj tem que lidar de forma diferente. O intelectual compreende o que as várias religiões propagam, os códigos éticos e morais que prescrevem, também os conceitos metafísicos que expõem; mas ele continua não iluminado. O que le procura realmente é a Verdade, o fator constante que não está sujeito a qualquer alteração. E, além disso, ele quer provas, mas não é capaz de dizer que tipo de prova poderia satisfazê-lo. A prova como tal seria algo sujeito ao espaço e ao tempo, e o intelectual é inteligente o suficiente para saber disso. A Verdade, para ser Verdade, deve estar além do tempo e do espaço. aharaj diz que qualquer pessoa inteligente deve admitir que o "Eu sou", o sentido de presença consciente, de 'ser', é a única verdade que cada ser senciente conhece e essa é a única 'prova’ que ela pode ter. E ainda, a mera existência não pode ser equiparada com a Verdade pela simples razão de que a própria existência não está além do tempo e do espaço, como está a Realidade.
Maharaj lança em seus discursos luz abundante sobre este impasse. Um cego pode dizer: “prove para mim que existem cores, só então acreditarei em todas suas adoráveis descrições do arco-íris”. Sempre que tais questões são colocadas para Maharaj, ele responde dizendo: “prove para mim que existe algo como Mumbai, Londres ou Nova York!” Em toda parte, diz ele, é a mesma terra, ar, água, fogo e céu. Em outras palavras, não é possível buscar a Verdade como um objeto, nem pode a Verdade ser descrita. Ela só pode ser sugerida ou indicada, mas não expressa em palavras, porque a Verdade não pode ser concebida. Qualquer coisa concebida será um objeto e a Verdade não é um objeto. Como Maharaj coloca: você não pode 'ir às compras' atrás da verdade, como algo que está certificado com autoridade e marcado como 'Verdade'. Qualquer tentativa de encontrar a prova da Verdade envolveria uma divisão da mente em sujeito e objeto, e, assim, a resposta não poderia ser a Verdade, pois não há nada objetivo sobre a Verdade, que basicamente é pura subjetividade (no sentido de ter relação com o sujeito).

Todo o processo, diz Maharaj, é como um cão perseguindo sua própria cauda. Na busca de uma solução para este enigma devemos analisar o problema em si. Quem é que quer a prova da Verdade ou Realidade? Podemos entender claramente o que somos? Toda a existência é objetiva. Todos nós 'existimos' como objetos apenas, como meras aparições na consciência que conhece-nos. Existe realmente uma prova de que 'nós mesmos' (que procuramos a prova da Realidade) existimos, diferentemente de objetos de cognição na mente de outra pessoa? Quando procuramos a prova da Verdade, o que estamos tentando fazer é equivalente a uma sombra que procura a prova da substância! Maharaj, portanto, exorta-nos a ver o falso como falso, e, em seguida, não haverá mais a busca pela Verdade. Você entende o que quero dizer? Ele pergunta. Você não sente intuitivamente qual é a ponto? O que é buscado é o próprio buscador! Pode um olho ver a si próprio? Por favor, entenda, ele diz: sem tempo, sem espaço, não cognoscíveis sensorialmente é o que somos; temporais, finitos e sensorialmente cognoscíveis, é o que parecemos ser como objetos separados. Considere o que você era antes de ter adquirido a forma física. Você precisava de qualquer prova sobre qualquer coisa àquela altura? A questão de ter provas surge apenas na existência relativa e qualquer prova fornecida dentro dos parâmetros da existência relativa só pode ser uma inverdade!

3 comentários:

Google disse...

Muito bom!

Ander disse...

Mais um excelente texto para meditar, pensar.

Obrigado

Jeam Pierri Sorondo Cunha disse...

Estas pessoas nos são enviadas ao inferno que vivemos nesta irrealidade como auxiliares e esclarecedores de nossa existência miserável na escravidão do corpo da morte...

Muito grato a consciência divina pelo envio de Ramesh Balsakar...