domingo, 2 de setembro de 2012

G. I. Gurdjieff - Fontainebleau, 24 de maio de 1923

Existem dois tipos de amor. Um é o amor de um escravo, o outro é o que precisa ser adquirido através do trabalho. O primeiro não tem valor de maneira alguma, apenas o segundo tem valor, isto é, o amor adquirido através do trabalho. Esse é amor do qual a religião fala a respeito. Se você ama quando “isso”* ama, isso não depende de você e não tem mérito algum. É o que chamamos de amor escravo. Você ama mesmo onde você não deveria amar. As circunstâncias fazem-no amar mecanicamente.
O amor real é Cristão, o amor religioso – ninguém nasce com esse amor, a pessoa deve ser treinada especialmente nele. Alguns são treinados desde a infância, outros mais velhos. Se alguém possui esse amor, significa que ele o adquiriu durante sua vida. Mas é muito difícil aprender esse amor. E é impossível começar a aprendê-lo de maneira direta, nas pessoas. Cada homem toca o outro no ponto fraco, o atrapalha, da pouca chance a ele de exercitar.
O amor pode ser de tipos diferentes. Para entender que tipo de amor estamos falando a respeito e necessário definí-lo. Agora falamos do amor da “vida”. Em toda parte há vida, começando com as plantas (pois elas também têm vida) e os animais – em suma, onde quer que exista vida há amor. Toda a vida é uma representação de Deus. Aquele que vê a representação verá Aquele que é representado. Toda vida tem amor e é sensível ao amor. Até mesmo as coisas inanimadas tais como as flores, que não tem consciência, entendem se você as ama ou não. Até mesmo a vida inconsciente reage de uma maneira correspondente a cada homem e reage a ele de acordo com suas reações.
De acordo com como você planta, você irá colher e não apenas no sentido de que se você planta trigo você colherá trigo. A questão é COMO você planta. Mesmo de maneira literal isso é um fato, por exemplo, com a relva. Suponha que pessoas diferentes plantem as mesmas sementes no mesmo solo – os resultados serão diferentes. Mas essas são apenas sementes o homem, inconscientemente, é muito mais sensível ao que é plantado em si. Os animais também são muito sensíveis, embora menos do que o homem. Por exemplo, a pessoa X é designada para cuidar de alguns animais. Muitos ficam doentes e morrem, as galinhas botam menos ovos, etc. Até mesmo uma vaca irá dar mais leite se você amá-la. A diferença é realmente surpreendente.
O homem é mais sensível do que uma vaca, porém inconscientemente. E é assim se você sente simpatia ou antipatia, ou se você odeia outra pessoa, é apenas porque essa outra pessoa igualmente planta algo ruim contra você. Aquele que deseja aprender a amar o próximo deve começar praticando o amor em relação às plantas e aos animais. Começa logo de primeira tentando amar um homem é impossível, porque o outro homem é igual a você e ele vai repulsar o seu esforço. Mas um animal irá pacata e silenciosamente se resignar, portanto é mais fácil começar a praticar nos animais. Aquele que não ama a vida não ama a Deus.
É muito importante para um homem que trabalha sobre si mesmo entender que nenhuma mudança pode ser esperada nele até que ele mude sua atitude para com o mundo externo. Em geral, você não sabe o que deve ser amado o que não deve ser amado. Embora existam coisas objetivas que devemos amar ou que devemos não amar. Portanto, é mais produtivo e prático esquecer a respeito de bom e ruim e começar a agir apenas quando você tiver aprendido a escolher por você mesmo.
Se você quer trabalhar sobre si mesmo, você deve adquirir mais e mais atitudes variadas. Exceto em coisas grandes e que claramente são inegavelmente ruins, você deve treinar-se, por exemplo, se você gosta de rosas, tente não gostar delas, se você não gosta tente gostar. É melhor começar com o mundo das plantas. Tente a partir de amanhã com as plantas, tente olhar para elas de uma maneira que você não tenha feito ainda. Cada pessoa é atraída por certas plantas e repelida por outras. Vocês não tinham notado isso até então. Primeiramente, você deve tentar olhar bem para a planta, depois tentar analisar e entender o porquê dessa atração ou aversão está ali. Tenho certeza que ninguém percebe ou sente isso. A mente não vê um processo que é genuinamente subconsciente. Se você começar a olhar conscientemente, você verá muitas coisas e descobrirá muitas Américas. As plantas têm as mesmas relações mútuas que existem entre os homens e certas relações existem também entre as plantas e os homens, que mudam de tempos em tempos. Toda a vida está conectada. Por vida quero dizer tudo que vive, todas as coisas dependem umas das outras.
As plantas afetam os humores de um homem e o os humores de um homem afetam o humor das plantas. Enquanto vivermos devemos fazer experimentos. Até mesmo flores vivas num vaso irão morrer por causa de um humor artificial.         

 
*Referência à maquina (termo utilizado por Gurdjieff para se referir ao organismo físico)

2 comentários:

Véia da Teia disse...

Não me canso de ler, gosto muito de todos os temas, poemas...

Obrigada.

Douglas Aguiar disse...

textos de Gurdjieff são sempre importantes!